CPI das Universidades Privadas é aprovada com ressalvas

A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou nesta terça-feira o relatório final da CPI das Universidades Privadas. Mesmo com a forte pressão dos estudantes e das entidades estudantis (UEE-RJ e UNE), o relatório não foi aprovado na íntegra, três destaques serão votados na próxima semana.

Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro

Centenas de estudantes se reuniram na escadaria da Alerj em um ato para cobrar do legislativo estadual a aprovação do relatório que investigou os absurdos praticados por mantenedoras de instituições de ensino superior privado. A empolgação e disposição dos manifestantes era muito evidente. Parte do grupo pôde entrar na Casa Legislativa, e a manifestação em clamor à aprovação do relatório continuou no interior da Assembleia.

O presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, o Deputado Paulo Ramos (PDT), lembrou da longa luta dos profissionais e estudantes contra os acintes praticados pelos grupos gestores das faculdades particulares; salietando a importância da aprovação do relatório na íntegra, excluindo o risco de se poupar envolvidos nos inúmeros problemas apontados pela CPI:

"Temos aqui alunos e professores que já estão lutando há muito tempo. Essa CPI se relaciona com o trabalho de muitos e de muitos anos. É fundamental a aprovação desse relatório, e que se caso haja algum destaque, que seja para agravar a situação dos envolvidos e não atenuar", afirmou o deputado.

Antes do início da votação, o relator da CPI, Deputado Robson Leite (PT), também falou no plenário e reforçou o quão importante é a aprovação na íntegra do relatório; salientando ainda a importância dessa decisão do legislativo fluminense, inclusive, como exemplo para o resto país:

"Precisamos aprovar esse relatório na íntegra, a Câmara Federal lá em Brasília precisa ser pressionada por essa luta dos estudantes da Gama Filho, para que possamos consquistar a aprovação em nível nacional de um marco regulatório para esse setor. A luta não acaba hoje, ela começa". "O objetivo desse documento é provocar em Brasília um debate sobre a mercantilização do ensino superior, além da criação de uma CPI nacional, de forma a reforçar o nosso trabalho e atingir as instituições privadas do País", pontuou o parlamentar do Partido dos Trabalhadores.

O presidente da Alerj colocou o relatório em votação, e a aprovação foi confirmada. Entretanto, três destaques foram apresentados, um de inclusão e dois de exclusão; fazendo com que a votação final dessas possíveis emendas só seja realizada na próxima semana.

Apesar da possibilidade da apresentação de destaques que fragilizem a força do relatório e atenuem a culpa de certos envolvidos, a aprovação do texto em um tempo relativamente curto foi encarada como positiva. Mas os representantes dos estudantes e os parlamentares que lideraram essa CPI fazem a ressalva de que é fundamental que a luta e a mobilização continuem até a aprovação concreta e sem atenuantes desse relatório final.

Robson Leite se mostrou preocupado com a possível tentativa de retirada do pedido de indiciamento de algumas pessoas envolvidas:

"Estou preocupado. Tenho uma desconfiança de que sejam tentativas de inocentar alguém. Vamos recusar qualquer tentativa de inocentar os bandidos. Eles têm que ser indiciados pelo MPF. Não aceito destaque de retirada. Vamos batalhar para a manutenção do texto original. O pedido de inclusão vamos vai avaliar".

A presidenta a União Estadual dos Estudantes do Rio de Janeiro (UEE-RJ), Tayná Paolino, comemorou essa vitória inicial dos estudantes, mas também salientou a necessidade de garantir um relatório que não alivie a responsabilidade dos acusados:

"A aprovação desse relatório hoje, já é um passo muito importante, uma grande vitória. Não me lembro de quando um relatório teve um aprovação tão rápida, fruto dessa grande luta. Conquistamos essa vitória importantíssima para os estudantesdo Rio de Janeiro e de todo Brasil. Na próxima semana, na votação dos destaques vamos mobilizar muito mais estudantes, pois o que garantiu essa aprovação rápida foi a grande força dos estudantes mobilizados e organizados. Vamos fazer ainda mais pressão para que nenhuma emenda que tire responsabilidade dos envolvidos seja aprovada", enfatizou a líder estudantil.

Edivaldo Júnior, do Centro Acadêmico de Medicina da Gama Filho e representante dos estudantes da faculdade; lembrou da luta de tanto tempo, e frisou que o movimento ainda não acabou, mas segue no caminho certo:

"Estamos travando uma luta fantástica, estou muito emocionado, pois já alcançamos uma vitória enorme. Foi uma luta longa, em que fizemos muita pressão para que essa CPI saísse do papel. E hoje, fruto dessa pressão que nós fizemos, nós conquistamos essa aprovação, que ainda não é completa, mas foi uma batalha vencida em uma guerra que ainda deve durar algum tempo. Estamos há dois anos nessa luta e estamos no rumo da vitória. Nós vamos derrubar esse tubarão", afirmou Edivaldo.

A presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Virgínia Barros, também esteve presente fortalecendo essa grande luta, e afirmando que a vitória foi importante, mas que ainda há muito caminho a percorrer:

"Essa vitória de hoje já foi muito importante, essa é uma vitória que nos impulsionará ainda mais a dar continuidade a essa luta por todo Brasil. Vamos seguir na luta até conquistarmos uma Reforma Universitária, que garanta educação de qualidade e que atenda de forma concreta os interesses dos nossos estudantes", frisou Virgínia

O relatório aprovado solicita o indiciamento de seis pessoas ligadas ao setor privado de educação superior. Dentre elas, o ex-controlador do Grupo Galileo, Márcio André Mendes Costa, responsável por adquirir a Gama Filho e a UniverCidade. Márcio André é acusado de apropriação indébita de recursos de professores, além de formação de quadrilha, enriquecimento ilícito, estelionato, desvio de dinheiro público e lavagem de dinheiro.

Para os membros da CPI, as aquisições do grupo financeiro foram “nebulosas” e sem aprovação do MEC, que no fim teria apenas chancelado a operação.

Outra instituição que ganhou destaque no relatório da CPI foi a Universidade Cândido Mendes (UCAM). De acordo com o relatório, a faculdade terceirizava sua marca ao permitir que outras instituições utilizassem seu espaço, no Centro do Rio, como 'polo' para oferecer cursos de ensino à distância. Apesar de nem o currículo nem o próprio corpo docente pertencerem à Cândido Mendes, os diplomas saíam com o selo da instituição. Estas modalidades ainda seriam aplicadas em convênios sem licitação com municípios do Norte Fluminense.

O relatório fez cerca de 75 recomendações a órgãos como o Ministério Público, Tribunal de Contas da União (TCU) e o MEC. O texto pede que seja aprovado o projeto de lei que cria o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (Insaes), autarquia vinculada ao Ministério da Educação que daria ao MEC o poder de intervir nos grupos financeiros que controlam faculdades e universidades privadas. Atualmente, o governo federal só pode atuar quando há crise acadêmica, mas não financeira.

Os possíveis indiciados junto ao MPF que constam do texto aprovado pela CPI são: Candido Mendes e Alexandre Kazé, da Universidade Candido Mendes (Ucam); Márcio André Mendes Costa, que atuou como controlador do Grupo Galileo – que administra as universidades Gama Filho e UniverCidade – entre 2010 e 2012; Rui Muniz, da Universidade Santa Úrsula; e Igor Xavier e Rodrigo Calvo Galindo, do Grupo Kroton, que administrava a Sociedade Unificada de Ensino Superior e Cultura (Suesc). Dentre os encaminhamentos do documento, estão a intervenção imediata do Governo federal na UniverCidade e na Universidade Gama Filho, a não participação de instituições com problemas trabalhistas nos programas de bolsa públicos, a implementação de um tributo específico para a criação de um fundo de pesquisa para o ensino à distância e a proibição de sociedades anônimas serem mantenedoras de universidades.

Principais denúncias contidas no relatório:
– Atrasos e falta de pagamentos aos funcionários, assim como imposto sindical, INSS e FGTS;
– Ensino à distância – suspeita de fraude e venda de diplomas e ausência de regulamentação por parte da Câmara Federal;
– Grupos estrangeiros e sociedades anônimas comandando as universidades privadas no estado do Rio;
– Irregularidades em relatórios financeiros;
– Sistemas de bolsas, como o Financiamento Estudantil (Fies) e o Programa Universidade para Todos (Prouni), conferidos a instituições com conceitos baixos pela avaliação do Ministério da Educação;
– Aumento abusivo da mensalidade em 64 instituições;
– Convênios com prefeituras sem licitações públicas.