Janot: "pau que dá em Chico dá em Francisco"

Em entrevista aos jornalistas Felipe Recondo e Andreza Matais, de O Estado de S. Paulo, o novo procurador-geral da República, Rodrigo Janot usa a sabodia popular ao falar do rigor da justiça: "Pau que dá em Chico dá em Francisco", disse. Afirma que, sob seu comando, qualquer processo terá tratamento isonômico e profissional. Isso inclui o chamado "mensalão" tucano. A Ação Penal nº 470 não é o maior escândalo da história, diz; há 20 anos atrás, nem seria julgada, afirmou.

Janot

Pergunta: O processo do mensalão está acabando. O senhor vai acelerar o processo do mensalão mineiro?

Rodrigo Janot: Pau que dá em Chico dá em Francisco. O que posso dizer é que, aqui na minha mão, todos os processos, de natureza penal ou não, vão ter tratamento isonômico e profissional. Procuradores, membros do Ministério Público e juízes não têm processo da vida deles. Quem tem processo da vida é advogado. Para qualquer juiz e para o Ministério Público todo processo é importante.

P: O crime de formação de quadrilha no mensalão mineiro já prescreveu. O senhor vê novos riscos?

RJ: Uma das minhas formas de trabalho aqui é dar a prioridade a qualquer processo com risco iminente de prescrição. Isso é buscar efetividade da justiça.

P: O senhor já disse que não deve pedir prisão imediata dos réus do mensalão. Mas vai agilizar os pareceres aos embargos infringentes?

RJ: Eu tenho de esperar o acórdão. Vou me desincumbir do que tenho de fazer o mais rápido possível. Mas não posso dizer se vou usar o prazo todo ou não. Vai depender do acórdão. Eu vou inclusive usar o recesso. Não vou tirar férias.

P: O senhor considera que o julgamento do mensalão foi um marco contra a impunidade?

RJ: Não. Eu tenho muito receio de dizer que um processo é um marco contra a impunidade, que é marco disso ou daquilo. Eu espero que isso contribua, dentro de um contexto maior, para que todo o processo chegue ao final com o resultado que a lei prevê. Será que esse é o grande marco? Não sei se é o grande marco. Eu olho pra trás e vejo que este julgamento, há 20 anos, não teria ocorrido, não existiria o processo. Essa tem que ser a grande mudança.

P: Por que não haveria processo há 20 anos?

RJ: Havia uma resistência a se aplicar igualmente a lei para todo mundo. Hoje a República é mais República.

P: O senhor comunga da ideia de que foi o maior escândalo da história do País?

RJ: O que é maior? Receber um volume de dinheiro de uma vez só ou fazer uma sangria de dinheiro da saúde, por exemplo. São igualmente graves, mas eu não consigo quantificar isso. Não sei o que é pior. Não sei se este é o maior caso de corrupção, não. Toda corrupção é ruim.

P: Talvez pelo envolvimento da cúpula de um governo.

RJ: E a (corrupção) difusa? Envolve também muita gente. Dinheiro que sai na corrupção falta para o atendimento básico de saúde, educação e segurança pública. Toda corrupção é ruim.

P: O senhor já disse que não defende a prisão agora dos condenados do mensalão com novo julgamento. E os demais?

RJ: Para esses, transitando e julgando a prisão é decorrente. Para os demais (que terão um segundo julgamento), só depois da publicação do acórdão.

P: O senhor defende a extinção do foro privilegiado ou a mudança poderia gerar mais impunidade?

RJ: Quanto mais se sobe o foro, mais diminui a revisão dos julgados. Se você diminui a revisão do julgado, maior é o risco de ter erro. Essas questões têm que ser colocadas de maneira clara na mesa para discutir esse assunto.

P: O senhor disse que tem disposição ao diálogo. Isso tem a ver com pessoas que o senhor investigará?

RJ: Investigação não é diálogo. Falo de relação institucional entre poderes.

P: Esse diálogo faltou nos últimos anos?

RJ: O Ministério Público se fechou. Virou uma instituição autista. Diálogo não é composição. Se eu tiver de investigar, eu vou investigar. Eu sou mineiro ferrinho de dentista.

P: Como o senhor pretende acelerar processos que estão no Ministério Público?

RJ: Vou dar maior transparência às questões que tramitam no gabinete do procurador-geral. A sociedade brasileira tem direito de saber o que tem aqui dentro, como tramitam os processos e os prazos. Eu quero abrir o gabinete. Minha segunda meta é acabar com os processos que ficam na prateleira. O acervo é a massa do diabo. Não podemos ter medo de arquivar e de judicializar.

P: O senhor é a favor de flexibilização das regras para criação de novos partidos?

RJ: Não temos que flexibilizar. Temos que cumprir a lei. A lei fixa os requisitos para a criação dos novos partidos. Nós temos que ver se os requisitos foram cumpridos. Ponto.

P: O senhor enviará proposta ao Congresso para diminuir benefícios salariais para os membros do Ministério Público, como auxílio-moradia ou licença prêmio?

RJ: Eu discuto o estatuto (do Ministério Público) como um todo. Para que eu possa enviar uma proposta cortando o que está previsto no estatuto, tenho que negociá-lo como um todo. Duvido que qualquer colega meu não deixe de trocar privilégio pela garantia de investigação.

P: Outros procuradores-gerais da República já saíram com a pecha de engavetador e prevaricador. O sr. quer deixar qual marca?

RJ: Quero deixar uma marca: simplicidade. Só.

Fonte: O Estado de S. Paulo