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Leon Nunes: A afirmação da questão urbana

No ano de 2012, a questão urbana entrou em definitivo nas pautas de discussão sobre temas urgentes para o Brasil. No entanto, a premissa mais urgente ainda se reduz à mobilidade, que é apenas um dos aspectos da questão urbana. Muito deve ser colocado em debate, como o uso que se faz do solo urbano, o combate à especulação, uma recomposição imobiliária, a adequação sanitária, entre outras possibilidades.
Por Leon K. Nunes*

Sendo o espaço urbano o lócus privilegiado da reprodução do capital, ele está igualmente sujeito a vicissitudes próprias da necessidade capitalista, como a refuncionalização dos lugares. O geógrafo Milton Santos resgata esse problema, lembrando que o tradicional raciocínio que trata da obsolescência das máquinas “é aplicável ao espaço urbano”[1]. Na análise das grandes cidades brasileiras, é possível identificar vários ciclos de renovação, com as cidades se adaptando às novas necessidades produtivas. Entender essa questão é fundamental para que entendamos o papel da cidade em cada ciclo histórico, e para que procuremos reformatações quando as mudanças na divisão do trabalho exigir também mudança na funcionalização das atividades e dos lugares.

Certos processos são inevitáveis. O exemplo mais pungente é a divisão entre cidade e campo empreendida pelo capital. David Harvey sentencia que fatalmente “a atividade capitalista produz o desenvolvimento geográfico desigual, mesmo na ausência de diferenciação geográfica em termos de dotação de recursos e possibilidades[2]. A concorrência leva fatalmente a essa condição. Em tempos de globalização, por assim dizer, não somente as megalópoles, mas praticamente todos os conjuntos das cidades terão sua funcionalização determinada não somente por interesses locais, mas também – e sobretudo – por força de uma competitividade de caráter planetário.

A onda de privatizações vivida pelo Brasil nos anos 1990 não isentou o espaço urbano, sendo ele também privatizado. Hoje, proliferam-se espaços de sociabilidade privados, desde shoppings a grandes condomínios residenciais, que oferecem muito mais do que um mero serviço domiciliar. Além disso, o Estado frequentemente se vê no encargo de favorecer os interesses do capital para a sua reprodução. É a ação estatal que oferece as condições indispensáveis para a produção e regulação da economia globalizada, por meio de isenções e viabilizando infraestrutura para promover seus empreendimentos. Ao circuito inferior, chamado setor informal, no entanto, o Estado somente impõe normas, exigências, alterações de horários, entre outras medidas que ferem o caráter amador e tradicional, sobretudo das feiras.

Contudo, pode partir dele uma resposta. Afirma Michael Beaud que “se o capitalismo tem dimensões internacional, multinacional, mundial, ele não perdeu a sua dimensão nacional” [3]. A internacionalização da economia tem como base “um espaço que é nacional e cuja regulação continua sendo nacional, ainda que guiada em função dos interesses de empresas globais” [4]. Isso permite, tendo o controle do poder estatal, agir no sentido de impor limites aos interesses do capital, aplicar “dispositivos constitucionais e legais como a função social da propriedade“[5] e pensar a produção de uma cidade que resguarde o direito de seus cidadãos e ofereça diretrizes para lugares espacialmente democráticos. Essa é uma possibilidade que o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento sinaliza como possível, e sobre que o conjunto do Partido deve se debruçar para levarmos as discussões aos locais de disputa. O nosso estudo criterioso e a defesa firme de nosso projeto soberano serão determinantes para alcançar vitórias nessa luta.

Notas:

[1] SANTOS, Milton. Por uma economia política da cidade. Edusp, 2009.

[2] HARVEY, David. O Novo Imperialismo. Edições Loyola, 2004.

[3] BEAUD, Michael. História do capitalismo, de 1500 aos nossos dias. Brasiliense, 1987.

[4] SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: Território e Sociedade no Séc. XXI. Record, 2001.

[5] PCdoB. Programa Socialista para o Brasil. Anita Garibaldi, 2009.

* Leon K. Nunes Membro do Comitê Municipal de Natal-RN