Madalena Guasco Peixoto: Qual é o lugar do PCdoB na atualidade?
Ao chegar a seu 13º Congresso, o PCdoB se depara com a contradição dialética de firmar a concepção de permanência de princípios e da identidade comunista com a introdução de práticas inovadoras. É preciso transformar o crescimento quantitativo – eleitoral e de influência politica – em fortalecimento do seu papel como partido comunista. Como ensina a dialética, a quantidade tem de resultar numa determinada qualidade.
Por Madalena Guasco Peixoto*
Publicado 14/10/2013 16:20 | Editado 13/12/2019 03:30
A história do PCdoB, em quase um século de existência partidária, funde-se com a história da sociedade brasileira e da luta revolucionária no País e no mundo. A trajetória do Partido, liderada por três gerações de comunistas, é rica, com acertos e erros – mas sobretudo acertos. No final do século 20, por exemplo, com a crise do socialismo e a ofensiva reacionária do capitalismo – por meio do projeto neoliberal –, o Partido soube enfrentar as intempéries.
Não foi diferente nesta última década, conforme avaliam as Teses ao 13º Congresso. Mesmo diante dos problemas de âmbito político, ideológico e organizativo que a nova realidade impôs, o PCdoB cresceu durante os dez anos de governos progressistas. Foi um rico período em que os comunistas não perderam o rumo, nem seu caráter de luta pelo socialismo.
Este período foi também da emergência das ideias pós-modernas – que apregoam o rebaixamento da luta política, o individualismo exacerbado, a falência dos projetos coletivos e a impossibilidade de transformações revolucionárias da sociedade. Apregoam, ainda, o fim das nações e da luta de classes. São ideias que se concretizam como força material, produzindo uma consciência eclética, pragmática e antiteórica. Seus seguidores desvalorizam as organizações políticas, os princípios revolucionários, a luta pela transformação da sociedade e a disputa pelo poder político.
O Partido, apesar dos avanços, não está imune a este ambiente ideológico, marcado pela subjetividade dominante. As concepções pós-modernas aparecem nas propostas que, em nome de uma suposta “ousadia”, rebaixam o papel estratégico e a teoria orientadora do PCdoB. Se outros partidos também se valem da “ousadia” para justificar suas ações, cabe perguntar: o Partido Comunista do Brasil precisa de ousadia exatamente para quê?
O PCdoB tem o objetivo de trilhar um caminho próprio para o socialismo, ampliando suas fileiras e tornando-se conhecido e reconhecido como um partido de tipo diferente. Um partido que luta por reformas estruturais democratizantes, no âmbito de um projeto de desenvolvimento nacional, soberano e democrático, com valorização do trabalho, rumo à construção do socialismo no Brasil. Um partido que visa à direção das lutas sociais – sobretudo no movimento dos trabalhadores –, com liderança e protagonismo, participando de todas as trincheiras por transformações, a fim de concretizar as vitórias para o povo.
É assim que deve ser entendida a atuação do PCdoB nos movimentos sindical e sociais, nas relações internacionais, nas eleições (inclusive as majoritárias), bem como na esfera institucional, nos parlamentos e nos governos. Não há uma atuação mais importante que a outra, na medida em que nenhuma frente se esgota em si mesma – mas faz parte de um todo articulado do Partido, na luta por seus objetivos estratégicos.
Assim, ao chegar ao 13º Congresso, o PCdoB se depara com esta contradição dialética: firmar a concepção de permanência de princípios e da identidade comunista com a introdução de práticas inovadoras. É preciso transformar o crescimento quantitativo – eleitoral e de influência politica – em fortalecimento do seu papel de partido comunista. Como ensina a dialética, a quantidade tem de resultar numa determinada qualidade.
Essa contradição é central porque de seu desenvolvimento dependem as mudanças da realidade brasileira definidas no Programa Socialista do PCdoB. Para ser construída, a transição ao socialismo requer o fortalecimento do caráter comunista do partido, bem como o crescimento de sua influência politica. É com bases nos princípios – e não no principismo – que o PCdoB deve ser um partido atual, sem perder seu caráter de classe, nem o objetivo de sua existência.
As Teses ao 13º Congresso mostram que o PCdoB tem cumprido seu papel, ao mesmo tempo em que procura se firmar como um partido atuante e contemporâneo, com uma política de quadros ampla – que não seja, porém, como os demais partidos. É preciso, no entanto, fortalecer a prática militante e enfrentar problemas organizativos e ideológicos , como o pragmatismo, o dogmatismo e o liberalismo, combatendo as concorrências individuais e as disputas por projetos essencialmente pessoais.
Nesse sentido, ser uma liderança sindical, social ou popular com potencialidades eleitorais não converte um filiado ou militante, automaticamente, em quadro partidário. É essencial entender o papel estratégico do PCdoB. De que adiantará crescer eleitoralmente se os novos parlamentares e governantes do PCdoB não estiverem comprometidos com as causas partidárias?
Mesmo num partido comunista “de feições modernas”, não se pode tolerar que filiados atuem de maneira indistinta, utilizando o Partido para a disputa de projetos individuais, fazendo parte da direção para promover alianças eleitoreiras e buscando progredir a qualquer custo, com qualquer meio. Esse tipo de comportamento deve ser combatido no Partido. Quem minimiza esses problemas em nome do “crescimento do Partido” perdeu o rumo político.
Para fazer o PCdoB crescer e manter seu caráter, não é necessário impedir ninguém de ingressar nas fileiras do Partido. O que um comunista tem, sim, de impedir, baseando-se na formação e no companheirismo, é que os novos filiados passem a tratar o PCdoB como um partido qualquer do cenário politico brasileiro.
É preciso abrir o Partido. Algumas experiências têm sido muito gratificantes, com a adesão de importantes referências populares que assumiram compromisso de fato com o partido. Apesar da pouca formação, são novos camaradas que já enxergam o PCdoB não como uma legenda eleitoral – mas, sim, um partido vivo, de princípios.
O PCdoB não pode esquecer que a organização deve, necessariamente, servir à política. A forma serve ao conteúdo, numa unidade dialética, como escreveu Lênin. A política do Partido não se resume à administração do capitalismo, nem tampouco à participação em governos. Na realidade, a dinâmica da construção partidária na contemporaneidade deve levar em conta que o PCdoB é um partido em busca dos caminhos para verdadeiras transformações, nas condicionantes reais do Brasil. É preciso pôr no centro do debate do 13º Congresso o caráter revolucionário e a essência do PCdoB.
* Madalena Guasco Peixoto é membro do Comitê Central do PCdoB