Kerry tenta convencer lobby judeu a apoiar a paz com palestinos

O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, enviou uma mensagem gravada em vídeo à reunião privada do lobby pró-israelense, a Comitê Americano de Relações Públicas de Israel (Aipac), no início desta semana. De acordo com a revista eletrônica israelense +972 Magazine, os comentários levantaram questões sobre Kerry acreditar na disposição do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em fazer concessões nas negociações com os palestinos, ou se ele precisa do apoio do lobby judeu para isso.

Kerry e Netanyahu - Foreign Policy

“O secretário de Estado Kerry parece pensar que, caso a ocasião surja, o primeiro-ministro israelense Netanyahu pedirá do apoio de seus amigos em Washington para assinar um acordo de paz com os palestinos”, diz a jornalista independente Mairav Zonszein, em artigo publicado pela revista israelense, também independente, +972.

Segundo o artigo, a maior parte da mensagem gravada por Kerry tinha como objetivo garantir ao Aipac que os Estados Unidos estão comprometidos com o impedimento de um Irã com armas nucleares (embora o próprio país persa garanta não ter esse propósito e continue se comprometendo com os diálogos sobre o tema), mas o secretário de Estado também soltou alguns comentários sobre o “processo de paz” entre israelenses e palestinos, que os EUA vêm tentando mediar, ou eternizar, diriam alguns.

“Se o primeiro-ministro Netanyahu decidir que é do interesse do povo de Israel fazer compromissos razoáveis pela paz, ele irá precisar saber que vocês o apoiam”, disse Kery, citado pelo jornal israelense Jerusalem Post.

Para Mairav, “a necessidade de Kerry de instar o lobby a apoiar a solução de dois Estados parece sugerir que [o grupo] não a apoia – e que ele está, de alguma forma, dessincronizado com Netanyahu”.

A política oficial e a retórica do Aipac, lembra a jornalista, assim como o governo de Netanyahu, é apoiar uma solução de dois Estados para o conflito de décadas entre Israel e os palestinos. Ambos, o governo israelense e o Aipac, entretanto, definem uma solução de “um Estado judeu de Israel vivendo em paz com um Estado palestino desmilitarizado – com o fim de todas as reivindicações”.

Essas são pré-condições inaceitáveis, injustas e que ferem direitos básicos dos palestinos, como o direito de retorno dos refugiados, o direito a um Estado soberano e independente sem a presença dos militares israelenses e o direito dos não judeus (inclusive palestinos) que vivem em Israel de um dia conseguirem os mesmos direitos civis que os judeus. Para muitos, inclusive israelenses, é inconcebível um “Estado judeu” democrático, uma vez que será racista e segregacionista à partida.

“Então, por que a necessidade de encorajar os membros do Aipac a fazerem-se ouvir, em apoio à ‘escolha corajosa’ que fez Netanyahu, ao engajar-se em conversações diretas com os palestinos?”, pergunta Mairav.

Se Kerry precisa pedir ao Aipac para apoiar uma solução que o grupo já apoia oficialmente, e que já estaria sendo preparada, “então sabe-se que há algo errado”, diz a jornalista.

Para Mairav, a primeira metade das declarações de Kerry é reveladora: “Se o primeiro-ministro Netanyahu decidir que é do interesse do povo de Israel fazer compromissos razoáveis pela paz (…)”; será que Kerry “não está convencido de que Netanyahu decidiu ser do interesse de Israel fazer compromissos razoáveis pela paz?”, indaga a jornalista.

Com +972 Magazine,
Moara Crivelente, da redação do Vermelho