Veja iguala Joaquim Barbosa à própria lei

Criticado por juristas como Celso Bandeira de Mello e Dalmo Dallari por ter conduzido de forma ilegal e arbitrária as primeiras prisões da Ação Penal 470, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, é resgatado mais uma vez por Veja, que o transforma em sinônimo da própria lei.

É mais um capítulo de uma marcha perigosa que tenta transformar um herói atual da publicação – que, no passado, teve registrado seu passado de agressor nas páginas da própria revista – em plenipotenciário da Justiça no Brasil, nem que, para isso, seja necessário suprimir direitos e garantias constitucionais.

Intelectuais, representantes da sociedade civil e juristas de peso, como Celso Bandeira de Mello e Dalmo Dallari, assinaram há poucos dias um manifesto contra Joaquim Barbosa, questionando seu preparo e sua boa fé.

O motivo: na visão dessas pessoas, o presidente do Supremo Tribunal Federal cometeu ilegalidades ao executar as primeiras penas dos condenados na Ação Penal 470.

"O presidente do STF fez os pedidos de prisão, mas só expediu as cartas de sentença, que deveriam orientar o juiz responsável pelo cumprimento das penas, 48 horas depois que todos estavam presos. Um flagrante desrespeito à Lei de Execuções Penais que lança dúvidas sobre o preparo ou a boa fé de Joaquim Barbosa na condução do processo. Um erro inadmissível que compromete a imagem e reputação do Supremo Tribunal Federal e já provoca reações da sociedade e meio jurídico. O STF precisa reagir para não se tornar refém de seu presidente", diz o texto do manifesto, que deu origem a uma petição na internet, que já conta com 7,2 mil assinaturas.

No Parlamento, o senador Jorge Viana (PT-AC), enviou ofício ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, solicitando a apuração de ilegalidades cometidas durante as prisões. E o próprio Cardozo, quando pressionado pelo advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, se viu forçado a falar, tendo que defender o cumprimento das penas em regime semiaberto, conforme decidido pelo pleno do Supremo Tribunal Federal.

Ou seja: para os que tratam do tema de forma honesta, fica evidente que Joaquim Barbosa errou. E não importa se o fez por falta de preparo ou de boa fé, como aponta o manifesto dos juristas, ou até por alimentar um eventual projeto político.

No entanto, neste fim de semana, Veja decidiu dar mais um passo na tentativa de converter o instável Joaquim Barbosa em plenipotenciário da Justiça brasileira. A capa o transforma em sinônimo da própria lei, quando há sérias dúvidas sobre se ele não se comporta, na prática, como um "fora-da-lei", como apontou o jornalista Breno Altman (leia aqui seu artigo).

Na reportagem, no entanto, Veja afirma Barbosa que não cometeu nenhum erro – decerto, devem estar errados Celso Bandeira de Mello e Dalmo Dallari. E aponta ainda que os presos estão tendo direito a "regalias". Ou seja: segue em marcha acelerada o movimento, conduzido por meios de comunicação, para suprimir direitos e garantias constitucionais no Brasil.

Há dez anos, uma reportagem publicada pela Veja e assinada por Policarpo Junior, apontava supostos defeitos de Joaquim Barbosa no momento em que foi indicado para o Supremo Tribunal Federal.

Após descrever a seu modo a biografia do ministro, a Veja conjectura sobre os motivos da escolha do então presidente Lula e depois baixa o sarrafo na indicação, ao apontar "informado de um episódio constrangedor da biografia de Barbosa Gomes", que era como Veja denominava seu atual heroi.

"Muitos anos atrás, quando ainda morava em Brasília, ele estava se separando de sua então mulher, Marileuza, e o casal disputava a guarda do único filho – Felipe, hoje com 18 anos. Na ocasião, Barbosa Gomes descontrolou-se e agrediu fisicamente Marileuza, que chegou a registrar queixa na delegacia mais próxima", diz na reportagem de Veja Policarpo Junior.

E, sempre exercitando suas exageradas comparações, Veja penetra na mente do "governo" e expõe o temor do executivo "de que Barbosa Gomes se transformasse num caso como o de Clarence Thomas, o juiz negro da Suprema Corte americana que, ao ser nomeado para o cargo, foi acusado de assédio sexual, gerando um desgastante escândalo".

Veja ainda passa a bola para outros ministros do STF na época, para continuar batendo no seu alvo:

"Enquanto o governo decidia o que fazer, os comentários pipocaram no próprio Supremo. A ministra Ellen Gracie, a única mulher da corte, no intervalo entre uma sessão e outra, mostrou-se preocupada. 'Vai vir para cá um espancador de mulher?', perguntou ao colega Carlos Velloso. 'Foi uma separação traumática', conciliou Velloso. 'Mas existe alguma separação que não é traumática?', interveio o ministro Gilmar Mendes. Para desanuviar o ambiente, o ministro Nelson Jobim saiu-se com uma brincadeira machista, a pretexto de justificar a agressão: 'A mulher era dele'".

Com informações do Brasil 247