O EZLN 30 anos depois: de guerrilha a movimento social
No dia 17 de novembro, o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) cumpriu 30 anos de existência como grupo guerrilheiro cuja origem são as Forças de Libertação Nacional, criadas em 1969 pelos irmãos César e Fernando Yánez Muñoz.
Por José Gil Olmos, na Adital
Publicado 25/11/2013 13:18

Desde então, até hoje, esse agrupamento armado teve momentos significativos em sua evolução: transforma-se em Exército após sua chegada a Chiapas, em 1983, com a ideia de derrocar ao governo e instaurar outro; e, em 1994, converte-se em movimento social sem pretensões de tomar o poder, após apresentar-se publicamente e declarar guerra ao Estado mexicano.
Paradoxalmente, ou melhor, de maneira surrealista, agora o zapatismo é uma "antiguerrilha”, que, como diz o sociólogo francês Yvon Le Bot, em seu último livro ‘La Gran Revuelta Indígena’, posiciona-se mais como um movimento social indígena do que como uma guerrilha clássica.
Durante esse anos, 24 como organização clandestina e 20 publicamente como EZLN, esse grupo sobreviveu às mudanças ideológicas e políticas, adaptando-se com extraordinária capacidade aos tempos atuais. Se em algum momento formou-se e estruturou-se como grupo guerrilheiro de mestiços (operários, estudantes, intelectuais, sindicalistas, professores etc.) que impulsionava a mudança através das armas, hoje é um dos movimentos sociais indígenas que mais tem influído nos grupos antissistêmicos do mundo e nas organizações e povos indígenas do México e da América Latina.
Apesar de que se conhece pouco sobre a história do EZLN e de seus principais personagens, há alguns elementos substanciais que o caracterizam ao longo de seus 44 anos de vida. Ou seja, a partir do momento em que passou a se chamar Forças de Libertação Nacional. E mesmo que pareça tautológico, trata-se de uma organização clandestina com estrutura militar que continua funcionando como tal apesar do perfil de movimento social que assumiu desde que foi declarado o cessar fogo, em 12 de janeiro de 1994. Daí é que se pode ressaltar que a frase "mandar obedecendo” seja somente uma declaração do subcomandante Marcos, pois, na realidade, as ordens continuam sendo dadas com a hierarquia de mandos e são obedecidas como em qualquer organização militar.
Outro elemento substantivo do EZLN é que, apesar de ter usado a violência, na realidade, sua aposta sempre foi pela organização e concretização política. Por isso, pode-se entender que após ter declarado guerra ao Estado mexicano, levantando-se em armas e após a declaração de cessar fogo depois de 12 dias de enfrentamento, seguem o caminho da política e fazem uma série de propostas à sociedade civil para organizar-se (a Convenção Nacional Democrática, o Movimento de Libertação nacional e os Acordos de San Andrés) que não tiveram êxito até chegar a sua própria iniciativa de autogoverno, com os Caracóis e as Juntas de Bom Governo, que, em agosto passado cumpriram uma década de existência em Chiapas.
O terceiro elemento é que não se propuseram tomar o poder e nem governar. Por isso é que uma boa parte da narrativa do zapatismo e, em especial, do subcomandante Marcos seja contra o sistema de partidos, devido ao alto grau de corrupção e pela falta de representatividade social. Desde 1994, os zapatistas impediram as campanhas e as eleições em seus territórios; ninguém pode convencê-los a participar, tal como tentaram Cuauhtémoc Cárdenas, em 1994, e Andrés Manuel López Obrador, em 2006.
Durante esses anos, o EZLN e o subcomandante Marcos mostraram sua perícia para manejar a estratégia de comunicação política e manter-se vigentes apesar de que já não têm a mesma exposição midiática que tiveram de 1994 a 2006, quando realizaram um giro por todo o país, na chamada "Outra Campanha”.
Suas propostas de inovação organizativa, os cenários que colocavam para seus eventos, o caráter global de suas convocações, bem como a narrativa literária de Marcos, puseram aos zapatistas na vanguarda social; porém, tiveram um esgotamento natural e estancaram. Estranha-se essa fratura agora, ante a ausência de lideranças e de discursos que movam a sociedade.
O EZLN mudou muito ao longo de sua história. Já não é aquele grupo guerrilheiro que se aliou com os povos indígenas para transformar o país; hoje, é o movimento social indígena que vai na mesma corrente latino-americana de povos originários que defendem seus territórios dos grupos políticos aliados às transnacionais mineradoras, eólicas, petroleiras e do crime organizado, que ameaçam despojá-los de suas terra.
Como diz Le Bot, em seu último livro ‘La gran revuelta indígena’, o zapatismo é uma antiguerrilha que se distanciou da luta armada tradicional; porém, que ficou presa entre o grupo armado e um movimento social. Porém, temos que dizer que ainda vive e persiste, apesar das pressões externas e das divisões internas. Ou seja, é um grupo social indígena em movimento e transição.