Jandira Feghali: Nossas vidas no trânsito 

Domingo, madrugada. Dirigia pela Rua do Catete, na Zona Sul do Rio, quando uma enorme bola de gás luminosa surgiu por trás de um semáforo anunciando a blitz da Operação Lei Seca. Uma fila de carros já se formava naquele ponto, enquanto as equipes profissionais selecionavam os motoristas que deveriam prestar esclarecimentos. Entre eles, eu.

Por Jandira Feghali*

Desci do carro, fui bem atendida pelos agentes e convidada a assoprar o bafômetro. Uma atitude normal, simples, protocolar, que revelaria em instantes o nível zerado de álcool em meu sangue. Há uma simbologia muito forte em torno daquela movimentação sobre o etilômetro, muito maior que apenas testar a responsabilidade no trânsito. Diferente de mim, haviam motoristas alcoolizados por ali. Grave.

Para alcançar a meta determinada pela Organização das Nações Unidas (50% de redução de acidentes no trânsito até 2020), o Brasil tem avançado. Desde a vigência da lei seca, em 2008, o país dá passos positivos no combate à maléfica combinação de bebida alcoólica e o volante, causa maior de todas as perdas de vidas em nossas estradas.

No Rio, por exemplo, de acordo com dados da ONG Rio Como Vamos, a lei conseguiu reduzir de 846 acidentes desta natureza para 741, se comparados os primeiros semestres de 2012 e o mesmo período de 2013, com queda de 142% (de 324 para 187) no total de mortes no trânsito fluminense daquele período.

Ainda assim, famílias inteiras vêm sendo desfeitas por conta da condução sob os efeitos do álcool. O Instituto Avante Brasil mostrou que as mortes no trânsito no Brasil aumentaram quase 65% em 10 anos. Só no ano passado 60.752 pessoas faleceram no trânsito, sendo pedestres e motociclistas as principais vítimas.

É preciso que os governos atentem para políticas públicas que reafirmem a lei em vigor, salvando cada vez mais vidas. Uma máxima que precisa ir além da fiscalização, com campanhas educativas chegando em escolas, casas noturnas e clubes, locais onde a nova geração seja esculpida com um olhar mais cauteloso sobre o trânsito.

Naquele dia, ter conseguido chegar em casa de forma tranquila não foi fruto apenas de minha responsabilidade como motorista, mas também daqueles que trafegaram comigo pelas ruas. É uma consciência social que precisa ser ampla e irrestrita. Respeitar a lei me deu a possibilidade de vivenciar novos domingos e outras madrugadas. Ainda bem.

*É médica, deputada federal pelo PCdoB do Rio de Janeiro e presidente da Comissão de Cultura da Câmara