"Enfrentamos o difícil desafio de evitar o pior", diz Dilma

A presidenta Dilma Rousseff pronunciou um discurso no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, nesta sexta-feira (24), onde delineou a posição do Brasil no contexto mundial de crise financeira, ao mesmo tempo em que detalhou os investimentos sociais e de infraestrutura avançados pelo governo federal. Além disso, enfatizou a prioridade da erradicação da pobreza e do investimento em educação como “patrimônios históricos” para o povo brasileiro.

Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho

Dilma Rousseff - Vídeo / Fórum Econômico Mundial

“São passados mais de cinco anos desde o início da crise financeira global, a mais profunda e mais complexa desde 1929; (…) enfrentamos o difícil desafio de evitar o pior e, ao mesmo tempo, reconstituir o caminho da prosperidade”, disse a presidenta, ressaltando a importância de um enfoque de médio e longo prazos para o crescimento global de economias tão diversas.

“As economias emergentes continuarão a desempenhar um papel estratégico [na recuperação e no crescimento]. Somos países que demandam infraestrutura diversificada, social e econômica, sociedades em processos de forte mobilização social, com novos e dinâmicos mercados domésticos, integrados por milhões, ou até bilhões de consumidores. É apressada a tese de que as economias emergentes serão menos dinâmicas depois da crise,” pontuou.

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Para Dilma, prova disso são os fluxos atuais de investimento e comércio e as elevadas taxas de emprego, que “apontam na direção das oportunidades.” Além disso, o Brasil “vem experimentando uma profunda transformação social nos últimos anos”, quando 36 milhões de homens e mulheres saíram da pobreza, e 42 milhões chegaram à classe média.

No âmbito macroeconômico, a presidenta disse que “as elevadíssimas taxas de inflação dos anos 1980 e 1990 nos ensinaram sobre o poder destrutivo do descontrole de preços sobre as rendas, salários e lucros das empresas e dos cálculos econômicos”.

Dilma deu ênfase a pontos de atenção da política econômica, que guarda heranças ainda efetivas do período neoliberal e de submissão dos governos anteriores às imposições do capital financeiro mundial. Neste sentido, a ênfase na fidelidade ao superávit primário, pontuado por Dilma, guarda questões que, ao mesmo tempo, o Brasil tem conseguido superar, como garantiu o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Isso significa que o empenho pela redução dos gastos públicos e pela chamada “responsabilidade fiscal”, que, em outros cenários, resultam em uma política de arrocho da qual a maior vítima é o povo – sobretudo com os cortes nos gastos sociais fundamentais – não segue o mesmo padrão no Brasil, embora disso decorra uma significativa preocupação de vários atores da esquerda no país.

O chamado “tripé macroeconômico” patente nas políticas neoliberais, aplicadas pelos governos anteriores, abarca o superávit primário, o câmbio flutuante e os juros altos. Como ressaltou o presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, na semana passada, quando o aumento da taxa Selic foi anunciado, estes são os componentes de um “círculo vicioso que nos acomete desde 1994”, e que favorece apenas o capital rentista, “os agentes dominantes do capital financeiro”, os credores internacionais.

Mesmo enfatizando a “responsabilidade fiscal [como] um princípio basilar na nossa visão de desenvolvimento econômico e social”, no entanto, Dilma fez questão de detalhar o investimento do seu governo e do governo Lula no setor social, através da “melhora qualitativa das contas públicas”.

Além disso, ela disse: “Em breve, meu governo definirá a meta de superávit primário para o ano, consistente com a tendência de redução do endividamento público”, ao mesmo tempo em que garantiu a centralidade do investimento nas prioridades que farão o país avançar no desenvolvimento: a educação de qualidade, a infraestrutura e a saúde, por exemplo.

“Aumentaremos a taxa de investimento em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o que é fundamental para o crescimento e o desenvolvimento de longo prazo (…), para superar décadas de sub-investimento”, disse ela.

Dilma falou dos últimos leilões, no modelo de concessões, para o avanço do investimento em infraestrutura e no transporte público urbano – com US$ 62 bilhões investidos e 600 quilômetros de trilhos para enfrentar este desafio – , além das rodovias, aeroportos, ferrovias e portos, assim como o leilão para a exploração do megacampo de Libra, em que a Petrobras também saiu à frente.

Ainda na questão urbana, a presidenta ressaltou também outros investimentos destinados à melhora de vida da população, como o saneamento básico, com a construção de sistemas de esgoto e água – US$ 36 bilhões – e na infraestrutura necessária para expandir a oferta de água às regiões afetadas pela seca, que já conta com o investimento de US$ 14 bilhões.

Mas Dilma deu ênfase especial no programa Minha Casa, Minha Vida, do qual disse ter “muito orgulho por ter sido desenvolvido no Brasil”. Foram 22,4 milhões de moradias já contratadas para a construção, desde 2011, “garantindo o acesso à moradia para as parcelas mais pobres da população”, o que envolveu um investimento de US$ 287 bilhões em fundos públicos e de financiamento.

Educação e avanço tecnológico

A presidenta falou de outra prioridade na agenda do desenvolvimento brasileiro: a extensão da rede de banda larga de alta capacidade para todo o território, “que servirá para a política educacional que desenvolvemos, de inclusão e qualidade, (…) que possibilitará moldar uma ação democrática, garantindo a perenidade da erradicação da miséria e da pobreza, para que o Brasil não volte atrás na redução da desigualdade”.

“Nosso objetivo também é criar uma geração de jovens técnicos, pesquisadores e cientistas. Ampliamos a rede pública de universidades, democratizando o acesso. Ampliamos as bolsas e os financiamentos para acessar a universidades privadas”, disse, pontuando a importância do programa Ciência sem Fronteiras, com 101 mil bolsas para que os jovens possam estudar “nas melhores universidades do mundo”. Além disso, ressaltou a implantação de um amplo programa de ensino técnico, que alcançou mais de cinco milhões de matrículas em dois anos.

Neste sentido, enfatizou a “decisão histórica” de destinar 75% dos royalties do petróleo e 50% do fundo social do pré-sal para a educação, o que “vai nos permitir fazer ainda mais. Vamos transformar a riqueza finita do petróleo em um patrimônio perene para a nossa população”.

A presidenta falou também do aumento da produtividade no setor agrícola, o que garante a redução do desmatamento no país “disseminando práticas sustentáveis de cultivo”. Ainda no quesito ambiental, explicou: “Na conferência de Copenhague assumimos a redução voluntária da emissão de gases de efeito estufa em 36%. Mostramos que é possível produzir de forma sustentável e eficiente”.

No mesmo sentido, ressaltou a predominância, no Brasil, da produção energética de matriz renovável, de fontes limpas, com o aumento do investimento externo e nacional em um setor que garantirá a segurança energética necessária para o desenvolvimento econômico e para o empreendedorismo.

No âmbito global, Dilma disse ser necessário “superar posturas defensivas na economia mundial”, pelo que mencionou a problemática Rodada de Doha na Organização Mundial do Comércio, com a esperança de que os países possam finalmente chegar a uma conclusão equilibrada. Além disso, afirmou que o Brasil está empenhado nas negociações do Mercosul com a União Europeia.

Para concluir, a presidenta ressaltou a confiança no sucesso da Copa do Mundo, ou “a Copa das Copas” no Brasil, assim como no das Olimpíadas, em 2016, para as quais garantiu que o país está preparado para “receber de braços abertos todos os visitantes”, já que “vemos o futebol como uma das formas mais importantes de afirmação da paz e da luta contra os preconceitos”.