Mário Augusto Jakobskind: Quando vândalos são apenas “opositores”

Os recentes acontecimentos na Ucrânia e Venezuela valem uma observação que remete à cobertura jornalística. Enquanto no Brasil a mídia de mercado denuncia a todo momento a ação de “vândalos” nas manifestações populares, demonizando um estranho grupo denominado Black Bloc, nos dois países mencionados os manifestantes, também escondidos com máscaras, são denominados de “opositores” ou apenas “manifestantes”.

Por Mario Augusto Jakobskind*, no Direto da Redação

As imagens vindas de Kiev e Caracas são claras. Os mascarados agem na maior desenvoltura, fato ignorado nos telejornais, que preferem criticar sobretudo o governo da República Bolivariana da Venezuela. O silêncio dos editores da mídia de mercado pode fazer com que se conclua que em matéria de Black Bloc, se o grupo tático apoia quem desestabiliza governos que não rezam pela cartilha do senso comum e do Deprtamento de Estado norte-americano, aí eles são considerados do “bem”.

Em relação à Ucrânia, não se pode deixar de mencionar que os Black Blocs estão agindo ombro a ombro com grupos neonazistas, que apoiam figuras nefastas que combateram ao lado de nazistas. Curioso que Israel até agora não criticou os neonazistas ucranianos, denunciados inclusive pelo governo russo como antissemitas.

Logo depois que o Parlamento depôs o presidente Viktor Ianukovitch, o rabino chefe da Ucrânia instruiu os judeus a deixar a cidade de Kiev, porque teme a ascensão do Setor Direita e o Partido Svoboda, conhecidos por furioso antissemitismo.

O fato tem explicação, Israel é aliadíssimo dos Estados Unidos, cujo governo, através da Embaixada em Kiev, tem manifestado apoio incondicional à oposição que enfrentou as forças governamentais de armas nas mãos. E os neonazistas opositores são quase ignorados pela mídia de mercado. Quando apareceram as imagens nas ruas de Kiev, os telejornais nacionais continuaram referindo-se aos insurgentes apenas como “manifestantes” ou “oposicionistas”.

Quanto a Venezuela, é notória a ação da direita que em abril de 2002 tentou derrubar o governo do Presidente Hugo Chávez, que retornou ao poder com o apoio do povo e das Forças Armadas.

Não é de hoje que a mídia de mercado de todos os quadrantes tenta apresentar a Venezuela mergulhada no caos. Nos Estados Unidos, tanto o governo de Barack Obama quanto a oposição republicana volta e meia se intrometem em assuntos internos de um país soberano.

O senador troglodita Jona McCain, notoriamente vinculado aos setores mais retrógrados do espectro político norte-americano, um representante típico do complexo industrial militar, chegou ao ponto de sugerir uma invasão norte-americana na Venezuela para manter o fluxo de petróleo.

Aliado a este troglodita, alguns colunistas de sempre repetem a sugestão para a intervenção externa. Estão sequiosos em derrubar o Presidente constitucional Nicolás Maduro.

A direita venezuelana não consegue ganhar eleição e tenta de todas as formas assumir o poder no tapetão e mesmo pela força. É conhecido o fato dos principais grupos oposicionistas venezuelanos estarem vinculados à entidades norte-americanas que financiam grupos suspeitos com o objetivo de desestabilizar o governo constitucional.

Historicamente tem sido assim na América Latina,. No Brasil em 1964, na Argentina, no Uruguai e Chile, entre outros países que foram vítimas de golpes que contaram com o apoio integral dos serviços de inteligência norte-americana.

Os tempos hoje são outros, mas os setores que ainda tentam manter seus países sob a tutela política para a manutenção de seus privilégios continuam tentando impedir as mudanças necessárias para tornar o continente latino-americano mais justo socialmente. Tais grupos econômicos não se conformam com a existência de governos progressistas que procuram de uma forma ou outra conseguir as mudanças.

Na Venezula, os antigos detentores do poder nunca aceitaram a ascensão democrática do Presidente Hugo Chávez e agora de Nicolás Maduro. A mídia de mercado exerce nesse sentido um papel fundamental com a edição de matérias manipuladas, mentirosas ou de meias verdades, com o claro objetivo de tornar ingovernáveis países que não aceitam mais serem submissos aos interesses de Washington.

Nestes anos todos de governos bolivarianos, a mídia de mercado tem apenas criticado com veemência as transformações na Venezuela. Quem acompanha o noticiário tendencioso e se baseia nele para formar opinião, vai concluir como querem os editores, ou seja, que a Venezuela é o inferno do mundo. Porque nestes espaços o outro lado não é apresentado, ou quando é aparece de forma secundária.

Por estas e muitas outras, todo cuidado é pouco, porque o que está acontecendo na Venezuela em matéria de ação de forças externas pode estar acontecendo em outras países do continente.

O governo venezuelano conseguiu identificar três funcionários da embaixada dos EUA em Caracas, que estavam em contato com manifestantes da oposição e ajudando a planejar tumultos antigoverno por todo o país. Breann Marie McCusker, Jeffrey Gordon Elsen e Kristopher Lee Clark foram expulsos, o que já tinha acontecido em outros momentos com funcionários da embaixada estadunidense em Caracas.

*É correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes – Fantástico/IBOPE