Por um país de mulheres sem medo, por Abgail Pereira

 No final de 1977, Domitila de Chungara, refugiada em uma mina boliviana, perguntou a suas companheiras quais eram seus principais […]

 No final de 1977, Domitila de Chungara, refugiada em uma mina boliviana, perguntou a suas companheiras quais eram seus principais inimigos. Não era a ditadura militar, nem a burguesia boliviana, sequer o Imperialismo. Domitila disse às mulheres que seu maior inimigo era o medo. Em seguida, Domitila foi para La Paz com outras quatro companheiras e deu início a uma greve de fome. Em poucos dias, foram seguidas por milhares de bolivianos. Ninguém acreditava que elas pudessem derrubar a ditadura, mas conseguiram.

A história, verídica, faz parte da história sulamericana e foi narrada por Eduardo Galeano em “Mulheres” (1998). Tomo este trecho como reflexão acerca da história da luta das mulheres. Enfrentando o medo e toda sorte de adversidade, as mulheres estão transformando o mundo. “Temos medo por dentro”, disse Domitila às mulheres mineiras. O combate ao nosso medo interior deve ser cotidiano, pois ele nos turva a visão de que muito ainda há para ser feito.

A ideia de que são os homens que têm medo do poder das mulheres é recorrente na literatura sobre o tema. Porém, a autora de “Mulheres que correm com o lobos”, Clarissa Pinkola Estes (1999), protesta. “São tantas as mulheres que têm, elas mesmas, medo do poder das mulheres”. É inegável que essa imensa força cause espanto, já que somos condicionadas a nos sentirmos inferiores. Nosso medo é construído e reforçado cotidianamente pelas condições de desigualdade que permeiam todos os aspectos da vida das mulheres.

O Brasil não vive sem a força das mulheres. Temos mais de 55% de participação no mercado de trabalho. Entretanto, persistem amarras que castram nossas potencialidades. São os salários mais baixos, o padrão de beleza que não nos representa, a violência doméstica, a exploração sexual e tantas outras formas de nos impor, pelo medo, uma vida sem liberdade e sentido.

Acredito que o maior medo da sociedade é a mulher sem medo. Ainda há um longo caminho a percorrer para pôr fim à desigualdade, mas, com certeza, as mulheres continuarão fazendo história, seja no mundo do trabalho, nos movimentos sociais ou na vida política. Devemos seguir rompendo barreiras e derrubando tabus com sensibilidade, graça e ousadia, em especial neste ano em que receberemos a Copa do Mundo e teremos eleições aqui no Brasil. Viva o 8 de Março!

Abgail Pereira – Secretária de Estado do Turismo do Rio Grande do Sul