Reflexo da ditadura é debatido no Fórum de Pensamento Crítico

Os reflexos da ditadura militar no cenário baiano atual deram a tônica da discussão na tarde desta terça-feira (25/03), durante o segundo dia do III Fórum de Pensamento Crítico, que acontece no Teatro Castro Alves, em Salvador. Com o tema “Como a ditadura civil/militar redesenhou a Bahia e quais suas repercussões no futuro do estado”, o debate foi mediado pelo jornalista Ernesto Marques e contou com as explanações de Haroldo Lima, Sérgio Gabrielli, Ana Maria Fernandes e Joviniano Neto.

O ex-diretor da Agência Nacional de Petróleo e integrante do Comitê Central e da direção nacional do PCdoB, Haroldo Lima, relembrou fatos do dia 31 de março de 1964, data em que o golpe militar teve início no país. “Durante a noite do dia 31, nós, da Ação Popular, tínhamos três reuniões acontecendo no centro de Salvador. Duarte, vice-presidente da União dos Estudantes, foi quem nos informou do que estava acontecendo”.

Sobre matérias veiculadas no jornal Folha de São Paulo que diziam não ter acontecido a ditadura militar no país e sim uma “ditabranda”, termo inventado pelo veículo de comunicação, Haroldo foi enfático. “Aqui existiu ditadura militar aberta. Essa história de ditadura civil/militar não existiu. Quem mandava eram os generais, os civis eram subalternos e só serviram para fantasiar a situação e dedurar os resistentes.”

De acordo com o dirigente nacional do PCdoB, o primeiro grande reflexo da ditadura na Bahia foi o fim da atividade política de pessoas com pensamentos próprios. “Política passou a ser coisa de quem era submisso, que não tinha raciocínio e nem vontade própria. Isso foi bastante dramático. Depois de passar 10 anos na clandestinidade e três anos preso, quando retornei à Bahia não reconhecia mais ninguém.”

O militante político relembra que no período da ditadura, a política anti-comunista e corrupta cresceu assustadoramente no Estado, articulada com um certo pragmatismo e a ideia de “um homem que manipulava a educação e os meios de comunicação. A maioria das escolas têm o nome de Luís Eduardo Magalhães. Ele, de repente, virou o patrono da educação baiana, graças a imposição de seu pai [Antônio Carlos Magalhães].”

Haroldo Lima garante que a juventude experimentou diversas situações, a exemplo da luta armada no campo e na cidade, mas foi responsável pela derrocada do regime. “De tanto sofrer e somar derrotas, nós aprendemos bastante. Nos unimos e derrotamos o regime dentro do quartel general eleitoral deles, com a eleição de Tancredo Neves”, finaliza.

Exposições

O secretário Estadual de Planejamento da Bahia, Sérgio Gabrielli, falou sobre o impacto do golpe militar na economia baiana e declarou que as elites do Estado rapidamente se uniram aos generais. Segundo ele, em 1966, aconteceu uma grande reforma administrativa, a primeira iniciativa de planejamento após o golpe.

“Foi a intervenção do Estado de forma conveniente e sem democracia. Eles pegaram as ideias do Plano de Desenvolvimento da Bahia, retiraram qualquer possibilidade de participação do povo e fortaleceram apenas a área industrial”, declara. O secretário declara ainda que, do ponto de vista econômico, o golpe não mudou a situação da Bahia, apenas consolidou o modelo carlista que já estava sendo implantado, no qual o autoritarismo era a marca principal.

De acordo com o presidente do Grupo Tortura Nunca Mais na Bahia, Joviniano Neto, “o golpe militar criou condições para o crescimento de Antônio Carlos Magalhães e seu método autoritário, centralizador e dominador, que durou até 2006.”

O professor João Carlos Sales tratou das consequências da ditadura na Universidade Federal da Bahia (Ufba), “que foi privada da convivência com importantes professores e alunos valorosos, como o estudante da Escola Politécnica, Carlos Marighella”. Já a professora Ana Fernandes declarou que o fim da ditadura não implica no fim do autoritarismo no Brasil, ao declarar que a prática está presente na política e enfrenta cotidianamente a democracia. “As formas de autoritarismo e arrogância mudaram, mas permanecem na sociedade”.

Iniciado na segunda-feira (24), o III Forúm de Pensamento Crítico segue até o próximo dia 28. A iniciativa é promovida pela Secretaria de Cultura (Secult), com apoio da Secretaria de Educação da Bahia, Fundação Perseu Abramo, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Jornal A Tarde, Coordenadoria Ecumênica de Serviços (Cese) e Ministério da Justiça. A programação completa está disponível no site http://www.fpc.ba.gov.br/.

De Salvador,
Ana Emília Ribeiro

Foto: Manoel Porto