Mesmo que a injustiça prevaleça, a luta sempre valerá a pena

No último sábado (12), os cinco presos políticos em greve de fome do Paraguai – acusados pelo Massacre de Curuguaty – tiveram uma vitória significativa, ganharam o direito de cumprir a pena em regime domiciliar até ir a julgamento (pelo crime que não cometeram). Foram 58 dias de greve de fome e muitos militantes de diversos movimento sociais, ativistas de direitos humanos e familiares mobilizados em torno da causa.

Por Mariana Serafini, do Vermelho

Ativistas dos direitos humanos no Paraguai - Rufo Diana

O Hospital Militar onde os cinco estavam internados não teve descanso durante todo esse período, as famílias, os militantes e os ativistas se mantiveram firmes, fizeram manifestações pela capital, Assunção, e buscaram ajuda internacional para pressionar o poder público a aprovar a mudança no cumprimento da pena, que até então estabelecia cárcere fechado no presídio de Tacumbú, região metropolitana.

Movimentos sociais de vários países da América Latina se mobilizaram rapidamente e enviaram solidariedade ao povo paraguaio. O Movimento 138 (grupo que luta por Curuguaty desde Buenos Aires) enviou militantes e aumentou a intensidade das manifestações na capital argentina. No Uruguai surgiu um momento chamado “Paraguai Para, Uruguai Acompanha” que também enviou solidariedade e uma carta aberta exigindo, basicamente, liberdade, respeito à liberdade de expressão e justiça.

Autoridades políticas do Brasil, Bolívia, Venezuela e outros países latinos foram ao Paraguai acompanhar o processo de perto e tentar mediar diretamente com o poder público uma forma de o processo ser acelerado, afinal, os dias de greve de fome passavam rápido e a saúde dos presos políticos ficou consideravelmente debilitada. Até nos Estados Unidos um grupo de estudantes enviou apoio.

Apesar da gravidade de tudo que representa o Massacre de Curuguaty, até então a luta do povo paraguaio por justiça, liberdade e terra não tinha ganhado tamanha notoriedade. A coragem de Alberto e Nestor Castro, Arnaldo Quintana, Felipe Benitez e Rubén Villalba deu outra proporção à luta camponesa no Paraguai. Dispostos a morrer para libertar seu povo, eles fizeram o mundo voltar os olhos ao país durante um certo período.

A notícia de que poderiam cumprir a prisão em regime domiciliar chegou no sábado por volta das 22h. Foi incrivelmente comemorada por todos os familiares e militantes que no momento estavam mobilizados em frente ao Hospital Militar. Muitos usavam correntes simbólicas que foram imediatamente jogadas para cima. Abraços, música, sorrisos, uma alegria contagiante tomou conta de Assunção, que permaneceu o domingo inteiro comemorando o grande passo dado pela luta camponesa por um país soberano e, consequentemente, uma América Latina mais forte e unida.

Na segunda-feira (14) os cinco camponeses abandonaram o presídio de Tacumbú rumo às suas casas em Curugaty. Acompanhados dos familiares e de amigos próximos, a despedida do cárcere foi, de certa foma, também muito emocionante. Presos há 1 ano e dez meses, os detentos comuns do presídio já sabiam do que se tratava aquelas cinco pessoas e passaram a admirar a luta.

Mas o Poder Público paraguaio não se cansa de cometer injustiças. Chegando em Curuguaty, um dos líderes da resistência camponesa, Rubén Villalba recebe a notícia de que não poderá cumprir sua pena em regime domiciliar. Um grupo de policiais vai ao encontro e o leva novamente para o presídio em Assunção.

A Justiça acusa Rubén Villalba de ser o responsável por uma ocupação de terra na comunidade de Pindu, no município de Yasy Kañy, o mesmo departamento de Curuguaty, Canindeyu. Essa ocorrência se passou em 2008 e desde então não havia denúncias ou apuração do caso. No momento que Rubén conquista o direito de voltar para perto da família, de estar próximo da esposa Raquel e do pequeno Derlis – seu filho de apenas 3 anos– então ele é novamente podado e volta a ser preso.

Rubén é nitidamente vítima de uma perseguição política. De um Estado corrupto disposto a violar leis e direitos humanos para manter os privilégios de uma pequena elite detentora da terra e dos meios de produção. A injustiça prevaleceu desta vez, mas o Estado paraguaio já viu que os camponeses de Curuguaty não estão sozinhos e jamais estarão. A América Latina está unida por esta causa, a luta vale a pena e seguiremos buscando justiça, liberdade plena e terra para os camponeses que nela produzem. Ruben Villalba agora está novamente em Tacumbú. Aqui de fora seguiremos mobilizados até que justiça seja feita. “No estamos todos, falta Rubén”, grita a população paraguaia enquanto você está lendo este texto.