Relações democráticas na escola e a participação na vida sindical

“Os homens são essencialmente livres; essa liberdade se funda na igualdade natural, ou melhor, essencial dos homens, e se eles são livres, então podem dispor de sua liberdade, e na relação com os outros homens, mediante contrato fazer ou não concessões.” (Saviane, D; Escola e Democracia. 1983)

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É com base nessa fundamentação jurídica, que a democracia burguesa condiciona as condições das relações do trabalho na sociedade capitalista. Somos livres para dispor de nossa liberdade através de um contrato. O trabalhador é livre para vender a sua força de trabalho. As desigualdades existentes nestas condições demonstram as fragilidades das relações democráticas entre trabalho e capital. No Brasil, as raízes da escravidão que predominaram em nossa sociedade por pouco mais de 300 anos, transferem para o cenário atual, os vínculos de um sistema atrelado a uma mentalidade onde o trabalhador está sempre em desvantagem em relação ao seu empregador.

O conceito de democracia nas relações de trabalho está longe de alcançar um patamar mínimo de entendimento. As relações existentes nos submetem a condições de aceitabilidade das imposições das ordens impostas por nossos empregadores, nos desvinculando de uma participação na construção e na elaboração do produto do trabalho em nossa sociedade. Ao transferirmos essas condições básicas para o ambiente de escola, nos deparamos com uma outra realidade. A escola como a conhecemos não é libertadora, e o produto por ela desenvolvido propicia a reprodução do sistema para formamos cidadão que estejam preparados para o mercado e deem continuidade às relações de controle das classes dominantes.

Traduzindo para o cotidiano dos professores das instituições privada de ensino, nos deparamos com a dura realidade do mercado. A educação é compreendida como mercadoria e nós professores, “reprodutores” da ideologia dominante. A lógica do mercado e do sistema, nos impõem uma educação não libertária, condicionads ao trabalho alienado. Alguns professores, como indivíduos, procuram romper com essa lógica, nutrindo seus alunos com valores e conhecimentos que possibilitam uma análise dialética da realidade; mas se deparam com os limites de sua intervenção devido a um arcabouço de uma rede de informação e deformação (mídias e cultura de massa) que seduzem ao consumo, induzem ao individualismo.

É nesse cenário que procuramos aprimorar as relações democráticas dentro da escola. Ao associarmos democracia e trabalho, democracia e escola, encontramos um novo desafio. Como transformar o nosso ambiente de trabalho, a escola em que trabalhamos, em um espaço democrático? Em todos os níveis, a escola privada, distorce o princípio do direito à educação pela lógica do mercado onde educação é mercadoria. O aluno é um cliente e o professor um prestador de serviços. Por essa regra o cliente tem sempre a razão.

São raras as práticas onde a comunidade tem uma efetiva participação na elaboração dos parâmetros que norteiam os rumos da vida escolar. Na maioria dos casos, nos deparamos com uma comunidade apática, desvinculada das ações cotidianas, atribuindo indiscriminadamente ao corpo docente, a elaboração das práticas pedagógicas. Por outro lado os escassos espaços democráticos existentes dentro da escola são meros homologadores das decisões já deliberadas.

O aprimoramento das relações democráticas dentro da escola passa necessariamente pelo aprimoramento das instituições democráticas. O Estado, o parlamento, os conselhos de governo, os sindicatos devem ser ocupados. O Estado para propiciar as condições, o parlamento para dar os rumos, os conselhos para envolver a sociedade e os sindicatos para fortalecer o trabalho.

Esses e outros instrumentos devem ser aprimorados pela sociedade para construção e fortalecimento dos canais da democracia. Enquanto o Estado e os governos estiverem a serviço da ideologia dominante, enquanto não houver efetiva condição para que a sociedade seja ouvida e os sindicatos não se fortalecerem como instrumento de classe, estaremos na difícil tarefa de acúmulo de forças para alcançarmos uma efetiva mudança. Para cada um desse instrumentos são existentes os mecanismos de participação. Cabe a nós discutirmos como o sindicato deve atuar para o aprimoramento das relações democráticas no trabalho, em específico na escola.

O momento em que vivemos é favorável. Recentemente jovens foram às ruas clamar por mudanças. Queremos uma sociedade mais participativa, onde sejamos ouvidos e respeitados em nossos direitos. Queremos condições dignas de trabalho e mudanças por um país melhor. Temos que aprofundar as críticas e instigar a participação daquele que se viram motivados em pedir mudanças.

Não podemos deixar de apontar a contradição, que apesar de vivermos momentos de questionamento das estruturas dominantes, ainda estamos à mercê do capital, que é muito forte e nos condiciona a uma situação de dominação. Romper com essas amarras é nosso desafio e das gerações que se formam. Temos uma íntima ligação com as novas gerações. Devemos estar atentos às novas tecnologias de comunicações, e alinharmos a educação libertária com esses novos tempos. O papel dos professores neste momento deve ser de ruptura com a lógica do mercado. O desenvolvimento de uma consciência coletiva de uma sociedade melhor passa também pelas nossas mãos.

É momento de avançarmos. O Brasil está em um novo ciclo de crescimento que deve ser aprofundado. Com o crescimento econômico criamos um novo perfil social. Os trabalhadores devem procurar se fortalecer através da valorização do trabalho com maior distribuição de renda. Dessa forma encontraremos condições para o aprofundamento das instâncias democráticas alcançando os patamares de interesse da classe trabalhadora. Só assim teremos condições de termos uma escola democrática com o verdadeiro sentido de uma educação revolucionária.

Paulo José Nobre é professor, diretor do Sindicato dos Professores de Campinas e dirigente da CTB/SP