Abdel Latif: Genocído de 2014 em Gaza

Novamente, Israel ataca Gaza. O mais recente capítulo da limpeza étnica que Israel promove continuamente contra os palestinos, há quase setenta anos, tem os mesmos objetivos de sempre.

Por Abdel Latif* para o Vermelho

Faixa de Gaza Israel - Marco Longari / AFP

Em primeiro lugar, Israel quer quebrar a resistência palestina. Em 2000, ao iniciar a carnificina na Cisjordânia, que causou milhares de vítimas, o então primeiro-ministro israelense Ariel Sharon declarou: “Vamos bater neles (palestinos) até deixá-los de joelhos”.

Durante outro massacre contra Gaza em 2008-2009, que causou a morte de mil e trezentos civis, Shimon Peres anunciou que a meta de Israel era “dar um golpe tão forte contra os palestinos que eles perderiam a vontade de resistir”. Essa recente ofensiva tem a mesma intenção: matar o maior número de palestinos, causar destruição tão imensa que os palestinos se submetam às exigências israelenses.

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Há outra meta nesse recente ataque: os israelenses querem impedir a aproximação entre os palestinos, principalmente entre Hamas e Fatah. Quando foi formado o governo da união nacional palestina e anunciado o acordo entre Autoridade Palestina e Hamas, os líderes israelenses consideraram o acordo uma declaração de guerra contra Israel.

Com tom de ameaça, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu ordenou que o Presidente da Autoridade Palestina escolhesse entre Israel e Hamas. O governo de Israel e seus serviços de inteligência armaram a farsa do sequestro dos três colonos judeus na Cisjordânia e usaram esse falso pretexto para reiniciar a campanha atual de massacre contra os palestinos.

Israel responsabilizou, sem qualquer provas, o grupo de resistência palestino Hamas, que negou autoria do feito.
Nenhum grupo palestino se responsabilizou pelo alegado sequestro, observando que sequestros sempre ocorrem para troca de prisioneiros e não para assassinato. Há vozes em Israel, afirmando que os colonos morreram anteriormente em acidente de trânsito e seus corpos foram mantidos para o ardil israelense. Israel começou seu novo ataque contra Gaza.

Gaza é uma estreita faixa litorânea entre Egito e Israel. Foi ocupada em 1967 e após heroica resistência de sua população, Israel foi obrigado a se retirar de Gaza em 2006. Mas manteve o total controle sobre a vida dos palestinos naquela pequena área. Israel controla a entrada e saída de pessoas e mercadorias. Segundo observadores internacionais, Israel transformou Gaza na maior prisão a céu aberto do planeta.

Lá residem 1,8 milhão de palestinos, sendo que 70% deles são refugiados expulsos de suas casas em 1948, como resultado da limpeza étnica realizada por Israel, com a intenção de expulsar todos os nativos “goym” (não judeus) da Palestina histórica, para criar seu Estado de “pureza racial judaica”. 50% da população de Gaza tem menos de 15 anos e 75% são crianças e mulheres.

Israel tem total controle sobre Gaza. Ataca com frequência a população civil, causando morte e destruição. Mesmo com a anterior trégua concebida entre Israel e Hamas em 2012, durante o período de 11 de junho a 6 de julho último, Israel matou 13 palestinos, feriu mais de 50 e destruiu dolosamente 11 escolas e centros de saúde. Naquele período, nenhum foguete havia sido lançado contra Israel.

Nas primeiras quarenta e oito horas do recente ataque, Israel lançou oitocentas toneladas de explosivos em uma área um pouco maior que a metade da cidade de Porto Alegre-RS. A ONU lança relatórios diários sobre os acontecimentos de Gaza.

No seu relatório de 12 de julho, a organização afirma que 70% das vítimas do massacre são civis e crianças. Famílias inteiras foram exterminadas quando suas casas foram alvejadas pelas bombas e mísseis israelenses. Até 13 de julho, foram mais de 170 mortos, entre eles, 60 crianças e 1.200 feridos. Oitocentas casas foram totalmente destruídas e 1.500 foram seriamente danificadas.

Israel sempre ataca brutalmente escolas, hospitais, templos e instalações de infraestrutura. O número de vítimas e destruições aumenta a cada minuto, uma vez que o ataque continua até o momento.

Durante os primeiros cinco dias do massacre, o exército de ocupação israelense realizou 2.150 ataques por ar, mar e terra. Três ataques por minuto em uma área altamente densa e onde a população está cercada, não tendo como fugir aos ataques. Verdadeira armadilha.

As organizações de direitos humanos como Anistia Internacional, Cruz vermelha e a israelense B'Tselem acusam Israel de cometer crimes de guerra e contra a humanidade. As acusações se repetem e se acumulam desde a criação de Israel, sem punição. Israel ataca e brutaliza dolosamente civis, destruindo casas com famílias inteiras dentro, destruindo escolas, hospitais, infraestrutura, a fim de realizar a proclamada promessa israelense de devolver Gaza à idade das pedras. Milhares em Gaza estão sem eletricidade. Faltam água, comida e medicamentos.

Israel, com sua patológica mania de vitimização, alega que seus ataques visam a segurança dos judeus. Expulsar, brutalizar e cometer atrocidades contra a população civil em Gaza apenas aumenta o rancor e a raiva, em nada contribuindo para segurança.

A questão é lógica: Israel desde 1948, desapiedadamente, expulsou, desterrou e se apropriou de terras, casas, lavouras dos palestinos, convertendo-os em refugiados miseráveis, sob tendas. Continua atacando os palestinos em Gaza e Cisjordânia. Ataca, brutaliza, mantém a população sob cerco, inviabilizando a economia palestina nos menos de 22% do território que antes era a Palestina Histórica.

Os bombardeios à Gaza pioram as condições da população. Pela lei da ação e reação, a conduta de Israel não pode gerar amor, ao revés, inicia e mantém o ciclo da violência, que só pode ser quebrado com Justiça.

A retirada imediata e incondicional dos territórios palestinos ocupados e levantar o bloqueio contra Gaza é a única maneira de garantir segurança a israelenses e palestinos.

Israel é o único responsável pela onda de violência passada, atual e futura, que nascem como reação à limpeza étnica contra os palestinos que não cessa há quase setenta anos, ameaça a paz da região e do mundo. O único caminho para conseguir uma paz verdadeira e duradoura é fazer Justiça, reconhecendo os direitos do povo palestino.

Os palestinos não sairão de sua terra e jamais abandonarão o sonho de se libertar da ocupação israelense. Os mísseis, os massacres matam inocentes, destroem casas, mas não conseguirão matar a alma do povo indígena que luta pela sua liberdade. O sangue derramado em Gaza hoje vai manchar para sempre a imagem de Israel, já considerando Estado pária e sinônimo de brutalidade. Israel comete todos seus crimes em nome dos judeus do mundo.

É hora de as comunidades judaicas se rebelarem contra os crimes de Israel e levantarem sua voz, sob pena de serem coniventes e contribuírem com a profecia do filósofo judeu Moshe Menuhim, que previu que Israel é o túmulo do Judaísmo.

Resistir à ocupação por todos os meios disponíveis é direito humano essencial, garantido pelo Direito Internacional e é direito dos palestinos resistirem e lutarem pelo seu pão, chão e liberdade. Tentar manter a ocupação é a causa da violência da região. Sem intervenção urgente da comunidade internacional, os crimes de guerra de Israel continuarão e a paz será utopia.

Não é preciso ser pró-palestino para condenar as atrocidades cometidas por Israel em Gaza. Todos os que amam a paz e a Justiça, independentemente a quem se destina, devem se levantar contra os crimes de Israel e os criminosos de guerra devem ser julgados. O Estado que histórica e reiteradamente comete tais crimes, deve ser banido da família das nações civilizadas.

Gaza resistirá e o sonho palestino será realizado. Viva Gaza! Viva a Palestina livre!

*Abdel Latif é médico palestino residente no Brasil