Líbia procura o caminho perdido

O grupo de Estados fronteiriços com a Líbia afirma que deter a violência nesse país norte-africano, requer desarmar a milícias que se enfrentam pelo controle de diversas áreas, mas o difícil é como o conseguir.

Líbia - Prensa Latina

Os participantes na IV Reunião Ministerial de Países Vizinhos da Líbia, que se realizou no Cairo, a capital egípcia, adotaram uma iniciativa proposta pelo país anfitrião, que constitui um importante passo na busca de um palco de estabilidade e segurança de alcance sub-regional. Egito, Tunísia, Argélia, Sudão e Chade, bem como chefes da Liga Árabe e a União Africana estiveram no evento, o qual expõe claramente a existência de consenso com respeito à importância do assunto que não só se limita ao país em questão, mas que o problema desborda suas fronteiras, pelo qual há que o atalhar com urgência.

O sucesso do entendimento político entre os participantes do encontro especificou-se ao dar luz verde à proposta que pede o desarmamento dos milicianos, o apoio ao Parlamento recém-eleito e a reconstrução das instituições estatais para recompor a Líbia.

"As principais disposições da iniciativa incluem combater o terrorismo, trabalhar para conseguir a reconciliação nacional na Líbia, escrever uma nova Constituição, e apoiar o exército e forças de segurança", segundo o comunicado da conferência ministerial.

Depois da reunião, o chanceler líbio, Mohammed Abdel Aziz, demandou para seu país a intervenção externa e a assistência internacional para evitar que a crise interna se estenda aos Estados do meio, sumamente preocupados pelos acontecimentos bélicos nas cidades de Trípoli e Bengazhi.

"Esta declaração reflete o forte compromisso entre os países vizinhos da Líbia para colocar no centro de sua atenção e concentrar na segurança e no combate ao terrorismo no país", comentou Abdel Aziz em conferência de imprensa.

Poder ou não poder

O destino da Líbia é incerto, nenhum observador pronuncia-se para onde marcha esse país, tão organizado e estável antes da conspiração que derrocou e assassinou há três anos o ex-líder Muamar Kadafi.

A maior parte do debate líbio concentra-se na falta de equidade na distribuição das quotas de poder depois de ser desmontada a autoridade anterior.
No palco nacional, o anterior ilustram-no os combates por controlar o aeroporto de Trípoli, ocorridos desde 13 de julho, quando milícias da localidade de Misrata lançaram a operação Fayer para arrebatar às brigadas da zona de Zintán, que controlam essa instalação há três anos.

Os confrontos pela posse do aeroporto causaram cerca de uma centena de mortos e mais de 400 feridos.

Também foram sangrentos os choques armados na segunda cidade do país, Bengazhi, situada no oriente líbio, entre milicianos e paramilitares leais ao general retirado Jalifa Hafter e vários grupos islamistas, que determinaram unir em uma frente batizada como Conselho dos Revolucionários.

Muitos cidadãos foram vítimas da ambição em um Estado que não escapa do círculo vicioso da violência, uma sequela do desmonte de uma estrutura que com defeitos e virtudes avançava e a cujo estalido colaborou Ocidente com marcados interesses geopolíticos.

Sem dúvidas, a destruição do Estado líbio da era Kadafi hoje cobra seu saldo e enquanto uns morrem pela cobiça da riqueza do país, outros escapam desse inferno.

Ante o mundo acha-se um país que se despedaça em zonas de influência, onde proliferam senhores da guerra e jihadistas, enquanto nas áreas institucionais escasseia a legitimidade, pois sobressalta a existência na prática de dois Parlamentos.

A preocupação amplifica-se, a União Europeia (UE) condenou "a escalada dos combates nos arredores de Trípoli, Benghazi e em toda Líbia, incluídos os ataques contra zonas residenciais que envolvem ataques aéreos por aviões de combate não identificados", assinalou o Serviço Europeu de Ação Exterior (SEAE).

"Não há dúvidas de que todo distúrbio que ocorra na Líbia, em alguma medida, ameaça a segurança do que o Velho Continente considera sua fronteira sul, à qual se deve salvaguardar para evitar surpresas desagradáveis”.

Em uma análise da imprensa espanhola sobre a transformação prevista pelo Ocidente para estabilizar o país afirma-se que "as milícias repartidas por cidades e regiões da Líbia e a tradição tribal imperante estão na raiz do problema de governabilidade, o maior desafio da transição à democracia do país do norte de África".

Isto é, que esse componente da atualidade nacional tem um desenvolvimento histórico concreto, que deve ser compatibilizado com os planos e estratégias de pacificação do território, para evitar fórmulas impositivas, desajustadas, que originem consequências opostas a seus objetivos.

Institucionalidade raquítica

O parlamento líbio, saído das eleições de 25 de junho, realizou em 2 de agosto sua primeira reunião em Tobruk, ainda que a sessão inaugural oficial seria dias depois na oriental cidade de Bengazhi. Apesar disso, se entendeu que a construção do Legislativo era uma tentativa de moldar com traços de autenticidade uma estrutura recém-chegada.

Enquanto a situação nacional continua deteriorando-se pelos altos níveis de insegurança causados por persistentes combates na capital, Trípoli, e também em Bengazhi, é peregrina a ideia de apresentar a um Estado totalmente configurado no meio das ruínas das antigas instituições, desarticuladas em 2011.

No entanto à destruição de um modelo político não seguiu a rápida instalação de outro que, em teoria, superasse as ineficiências do anterior com o emprego de mecanismos capazes de assegurar sua reprodução como estrutura do poder, como são: proteger a soberania e a segurança humana, entre outros temas da sobrevivência em geral.

A Líbia não consegue remontar e edificar "um Estado de direito", já que persistem desavenças para construir um modelo unificador: o antigo Parlamento, cujo mandato expirou em junho passado, permanece com as funções e elegeu o professor Omar al Hassi como novo premiê de um governo de salvação nacional.

Essa Assembleia com uma importante presença islamista, recusou dissolver-se depois das eleições de junho e não reconhece a legitimidade das eleições realizadas nesse mês, dos quais emergiu o outro Parlamento.

O novo Legislativo, surgido dessas eleições com uma mudança de forças políticas. O premiê interino eleito por este órgão é Abdaláh al Thani; assim, de fato, existem dois Parlamentos e dois gabinetes mas a Líbia ainda não achou o seu caminho.

Fonte: Prensa Latina