Uribe, paramilitarismo e intevenção imperialista na América Latina
A história do ex-presidente, e agora deputado nacional, Álvaro Uribe Velez desempenhando cargos públicos é longa, assim como seus escândalos de corrupção e vínculos com o narcotráfico
Por Javier D. Rodríguez*, no Brasil de Fato
Publicado 21/10/2014 13:56

Há algumas semanas, ocorreu um debate, no Congresso Nacional da República da Colômbia, sobre os nexos entre grupos paramilitares e o narcotráfico com o ex-presidente, e agora deputado nacional, Álvaro Uribe Velez.
O debate promovido pelo deputado Iván Cepeda, do Polo Democrático Alternativo, pretendia pedir à Justiça resultados quanto às pesquisas sobre os supostos feitos criminais realizados por Uribe, descritos minuciosamente por Cepeda e outros participantes durante a discussão que durou mais de 8 horas.
A história de Uribe desempenhando cargos públicos é longa, assim como seus escândalos de corrupção e de vínculos com o paramilitarismo e o narcotráfico.
Já desde seu primeiro cargo público como diretor da Aeronáutica Civil, em 1980, foram denunciadas a concessão de permissões a aviões utilizados por cartéis do narcotráfico; depois, já como deputado nacional, em 1989, o mesmo Uribe teria sido um dos principais críticos da deportação de narcotraficantes; e em seu período como governador do departamento de Antioquia, foi ainda o responsável pelo nascimento e crescimento do paramilitarismo por meio da criação de grupos civis armados, denominados “Convivir”.
Do período de Uribe como presidente da Colômbia – de 2002 a 2006 e de 2006 a 2010 – , uma quantia enorme da bancada de deputados “uribistas” foi condenada por vínculos com o paramilitarismo, assim como também foi denunciado o fato de que parte do seu círculo mais íntimo – ministros, conselheiros e chefes de segurança – eram de condenados ou prófugos da Justiça por fatos similares.
Relações íntimas
Além das denúncias de sua atuação como servidor público, foram denunciadas as relações íntimas de Uribe e sua família com cartéis de narcotráfico e paramilitarismo, por exemplo: o relacionamento conjugal do seu irmão com uma chefia do cartel do tráfico dos Cifuentes Villa; a participação de Uribe em juntas diretivas de empresas de fachada do tráfico; e a relação pessoal do pai de Uribe e do mesmo Uribe com o cartel dos Ochoa, com os chefes paramilitares Don Berna, Salvatore Mancuso e com outros chefes criminosos no país.
Muitas outras denúncias foram realizadas, ou melhor, reiteradas durante o debate, que para serem relatadas seriam precisos vários livros, como de fato já existem na Colômbia.
A defesa de Uribe esteve centrada em desacreditar os seus adversários no debate. Estigmatizando, ameaçando e atacando, mas sem contradizer os argumentos e provas que foram apresentadas.
O ex-presidente e agora deputado, reeditando práticas comuns durante seu governo, acusou os deputados de esquerda de serem terroristas, assim como afirmou que os meios de comunicação que estavam cobrindo o debate, Telesur e Canal Capital, eram “meios de comunicação servis do terrorismo”.
A maioria dos presentes no debate e os meios de comunicação em geral assinalaram a falta de resposta das denúncias por parte de Uribe. Pediram que as exigências de Cepeda de agilidade nas investigações contra Uribe fossem tratadas como uma exigência pública legitimada.
Vale lembrar que apesar de uma extensa documentação, que incluiu múltiplos testemunhos dos próprios criminosos envolvidos, a Justiça não tem concluída nenhuma das investigações contra Uribe.
Sobre isto Cepeda assinalou: “Durante os últimos anos, Álvaro Uribe tem se apresentado como uma vítima do sistema judicial do nosso país. As acusações e feitos que pesam contra ele são que o sistema judicial colombiano não tem sido eficiente para pesquisar e julgar as múltiplas e graves acusações que existem”.
Deputado assassinado
Este debate é muito relevante não só para a Colômbia, mas para toda a América Latina. As pesquisas sobre o recente assassinato do deputado governinsta Robert Serra, na Venezuela, apontam de novo para a responsabilidade de estruturas militares e paramilitares na Colômbia, e em particular para a possível participação de Uribe no caso.
De forma similar, Lorent Gómez Saleh e Gabriel Valles, que lideraram campanhas de violência terrorista contra o Estado e contra o governo venezuelano, trabalhavam a partir da Colômbia completamente articulados com Uribe e com os setores militares e paramilitares que o apoiam, com o objetivo de desestabilizar e impulsionar uma estratégia paramilitar na Venezuela – razão pela qual foram deportados dias atrás.
Fim do confronto armado
Para além do paramilitarismo colombiano e da doutrina militar antissocialista da institucionalidade colombiana, que já demostrou poder de desestabilização na região, o “uribismo” ameaça ainda o processo de diálogos para a finalização do confronto armado na Colômbia – ao impossibilitar um cenário de Assembleia Nacional Constituinte que possa mudar a institucionalidade – que, no momento, permite e mantém a guerra –, e abra caminhos de paz para a Colômbia, que, ao mesmo tempo, é a paz para a América Latina.
Se algo ficou claro nas eleições presidenciais de agosto na Colômbia é que nenhum dos partidos políticos no poder e nem mesmo o presidente atual Juan Manuel Santos representam uma verdadeira possibilidade de alcançar a paz com justiça social na Colômbia.
A campanha eleitoral foi vergonhosa, repleta de denúncias, escândalos de corrupção e conspirações contra a mesa de diálogos da Havana. Foi esvaziada de discussões políticas de fundo para resolver o conflito social, político e econômico no país. E apesar de Santos aparentar representar alguma estabilidade para o processo dos diálogos, ele não incorpora as garantias mínimas para uma transição democrática na Colômbia.
Governo Santos
Durante o governo Santos, continua a repressão massiva contra o conjunto do movimento popular colombiano, sendo que a quantidade de presos políticos, assassinados e desaparecidos de algumas organizações, como da Marcha Patriótica, já leva a falar de um novo genocídio político na Colômbia.
Continuam as execuções extrajudiciais, as montagens, a estigmatização, mas, o mais grave, continuam as políticas que deram origem e mantêm o conflito armado na Colômbia: a concentração de terras, a exploração mineira indiscriminada, a privatização de todos os serviços públicos como saúde e educação.
Parece incrível que um governo que fale de paz reprima dessa forma. Que um governo que fale de justiça continue com leis antipopulares em educação superior e no sistema de saúde. Tais comportamentos são o reflexo de um Estado colombiano preso aos interesses de oligarquias que não estão dispostas a incluir as demandas camponesas, estudantis, operárias no Estado.
Nesse sentido, a demanda das organizações sociais e políticas na Colômbia é clara: só uma Assembleia Nacional Constituinte poderá começar a brindar as garantias políticas e sociais mínimas para um novo exercício político na Colômbia. Da continuidade do processo de diálogos de Havana e do fortalecimento do movimento popular na Colômbia parece depender a possibilidade de sua realização.
*Javier D. Rodríguez é militante do Movimento Político e Social Marcha Patriótica, Capítulo Brasil.