Uribe, paramilitarismo e intevenção imperialista na América Latina

A história do ex-presidente, e agora deputado nacional, Álvaro Uribe Velez desempenhando cargos públicos é longa, assim como seus escândalos de corrupção e vínculos com o narcotráfico

Por Javier D. Rodríguez*, no Brasil de Fato 

Patricia Lara Salive: Carta a Álvaro Uribe - La Vanguardia

Há algumas semanas, ocorreu um de­bate, no Congresso Nacional da Repú­blica da Colômbia, sobre os nexos en­tre grupos paramilitares e o narcotráfi­co com o ex-presidente, e agora deputa­do nacional, Álvaro Uribe Velez.

O debate promovido pelo deputado Iván Cepeda, do Polo Democrático Al­ternativo, pretendia pedir à Justiça re­sultados quanto às pesquisas sobre os supostos feitos criminais realizados por Uribe, descritos minuciosamente por Cepeda e outros participantes durante a discussão que durou mais de 8 horas.

A história de Uribe desempenhando cargos públicos é longa, assim como seus escândalos de corrupção e de vínculos com o paramilitarismo e o narcotráfico.

Já desde seu primeiro cargo público como diretor da Aeronáutica Civil, em 1980, foram denunciadas a concessão de permissões a aviões utilizados por cartéis do narcotráfico; depois, já como deputado nacional, em 1989, o mesmo Uribe teria sido um dos principais crí­ticos da deportação de narcotraficantes; e em seu período como governador do departamento de Antioquia, foi ainda o responsável pelo nascimento e cresci­mento do paramilitarismo por meio da criação de grupos civis armados, deno­minados “Convivir”.

Do período de Uribe como presiden­te da Colômbia – de 2002 a 2006 e de 2006 a 2010 – , uma quantia enorme da bancada de deputados “uribistas” foi condenada por vínculos com o parami­litarismo, assim como também foi de­nunciado o fato de que parte do seu cír­culo mais íntimo – ministros, conse­lheiros e chefes de segurança – eram de condenados ou prófugos da Justiça por fatos similares.

Relações íntimas

Além das denúncias de sua atuação co­mo servidor público, foram denunciadas as relações íntimas de Uribe e sua famí­lia com cartéis de narcotráfico e parami­litarismo, por exemplo: o relacionamen­to conjugal do seu irmão com uma chefia do cartel do tráfico dos Cifuentes Villa; a participação de Uribe em juntas diretivas de empresas de fachada do tráfico; e a re­lação pessoal do pai de Uribe e do mes­mo Uribe com o cartel dos Ochoa, com os chefes paramilitares Don Berna, Salvato­re Mancuso e com outros chefes crimino­sos no país.

Muitas outras denúncias foram reali­zadas, ou melhor, reiteradas durante o debate, que para serem relatadas seriam precisos vários livros, como de fato já existem na Colômbia.

A defesa de Uribe esteve centrada em desacreditar os seus adversários no de­bate. Estigmatizando, ameaçando e ata­cando, mas sem contradizer os argumen­tos e provas que foram apresentadas.

O ex-presidente e agora deputado, ree­ditando práticas comuns durante seu go­verno, acusou os deputados de esquer­da de serem terroristas, assim como afir­mou que os meios de comunicação que estavam cobrindo o debate, Telesur e Ca­nal Capital, eram “meios de comunicação servis do terrorismo”.

A maioria dos presentes no debate e os meios de comunicação em geral as­sinalaram a falta de resposta das de­núncias por parte de Uribe. Pediram que as exigências de Cepeda de agilida­de nas investigações contra Uribe fos­sem tratadas como uma exigência pú­blica legitimada.

Vale lembrar que apesar de uma ex­tensa documentação, que incluiu múl­tiplos testemunhos dos próprios cri­minosos envolvidos, a Justiça não tem concluída nenhuma das investigações contra Uribe.

Sobre isto Cepeda assinalou: “Duran­te os últimos anos, Álvaro Uribe tem se apresentado como uma vítima do sis­tema judicial do nosso país. As acusa­ções e feitos que pesam contra ele são que o sistema judicial colombiano não tem sido eficiente para pesquisar e jul­gar as múltiplas e graves acusações que existem”.

Deputado assassinado

Este debate é muito relevante não só para a Colômbia, mas para toda a Amé­rica Latina. As pesquisas sobre o recen­te assassinato do deputado governinsta Robert Serra, na Venezuela, apontam de novo para a responsabilidade de estrutu­ras militares e paramilitares na Colôm­bia, e em particular para a possível par­ticipação de Uribe no caso.

De forma similar, Lorent Gómez Sa­leh e Gabriel Valles, que lideraram cam­panhas de violência terrorista contra o Estado e contra o governo venezuelano, trabalhavam a partir da Colômbia com­pletamente articulados com Uribe e com os setores militares e paramilitares que o apoiam, com o objetivo de desestabilizar e impulsionar uma estratégia paramilitar na Venezuela – razão pela qual foram de­portados dias atrás.

Fim do confronto armado

Para além do paramilitarismo colom­biano e da doutrina militar antissocialis­ta da institucionalidade colombiana, que já demostrou poder de desestabilização na região, o “uribismo” ameaça ainda o processo de diálogos para a finalização do confronto armado na Colômbia – ao impossibilitar um cenário de Assembleia Nacional Constituinte que possa mudar a institucionalidade – que, no momen­to, permite e mantém a guerra –, e abra caminhos de paz para a Colômbia, que, ao mesmo tempo, é a paz para a Améri­ca Latina.

Se algo ficou claro nas eleições presi­denciais de agosto na Colômbia é que ne­nhum dos partidos políticos no poder e nem mesmo o presidente atual Juan Ma­nuel Santos representam uma verdadei­ra possibilidade de alcançar a paz com justiça social na Colômbia.

A campanha eleitoral foi vergonho­sa, repleta de denúncias, escândalos de corrupção e conspirações contra a me­sa de diálogos da Havana. Foi esvaziada de discussões políticas de fundo para re­solver o conflito social, político e econô­mico no país. E apesar de Santos aparen­tar representar alguma estabilidade para o processo dos diálogos, ele não incorpo­ra as garantias mínimas para uma transi­ção democrática na Colômbia.

Governo Santos

Durante o governo Santos, continua a repressão massiva contra o conjunto do movimento popular colombiano, sendo que a quantidade de presos políticos, as­sassinados e desaparecidos de algumas organizações, como da Marcha Patrióti­ca, já leva a falar de um novo genocídio político na Colômbia.

Continuam as execuções extrajudi­ciais, as montagens, a estigmatização, mas, o mais grave, continuam as políti­cas que deram origem e mantêm o confli­to armado na Colômbia: a concentração de terras, a exploração mineira indiscri­minada, a privatização de todos os servi­ços públicos como saúde e educação.

Parece incrível que um governo que fale de paz reprima dessa forma. Que um governo que fale de justiça continue com leis antipopulares em educação su­perior e no sistema de saúde. Tais com­portamentos são o reflexo de um Esta­do colombiano preso aos interesses de oligarquias que não estão dispostas a incluir as demandas camponesas, estu­dantis, operárias no Estado.

Nesse sentido, a demanda das orga­nizações sociais e políticas na Colômbia é clara: só uma Assembleia Nacional Constituinte poderá começar a brin­dar as garantias políticas e sociais mí­nimas para um novo exercício político na Colômbia. Da continuidade do pro­cesso de diálogos de Havana e do for­talecimento do movimento popular na Colômbia parece depender a possibili­dade de sua realização.

*Javier D. Rodríguez é militante do Movimento Político e Social Marcha Patriótica, Capítulo Brasil.