América Latina pós eleições

Outubro foi um mês eleitoral intenso na América Latina, com as presidenciais e legislativas da Bolívia, Brasil e Uruguai. Ninguém duvidava, à partida, que os resultados das eleições, com natural destaque para o Brasil, assumiriam uma enorme importância, não apenas no que toca o plano interno dos processos em curso nos três países sul-americanos, mas também a correlação de forças na América Latina e a situação no mundo.

Por Luís Carapinha*, para o Jornal Avante

Bandeira do Uruguai - Reprodução

A rede mediática global subordinada ao grande capital financeiro rendeu-se à inevitabilidade de mais uma vitória das forças progressistas e revolucionárias da Bolívia (e muito provavelmente da Frente Ampla no Uruguai), praticamente ignorando os dois países, e centrou a fúria manipuladora nas eleições brasileiras. A parada era alta e o imperialismo e a grande burguesia não esconderam a aposta em tirar revanche e derrotar a candidatura da presidente Dilma Rousseff, apoiada pelo PT, PCdoB e outras forças de esquerda do Brasil.

Desiderato que contou com a confluência e cruzamento de expressões de oportunismo de distintos matizes e proveniências. Com a crise estrutural do capitalismo a não dar sinais de tréguas, em Washington e São Paulo há muito que se vinha preparando a estocada para pôr termo ao difícil processo de mudança iniciado há 12 anos no colosso sul-americano. O apetecido regresso do “seu a seu dono”, da grande burguesia serventuária ao Palácio do Planalto, foi abertamente assumido como condição necessária para a correção do curso do Brasil em organizações como a Unasul, Mercosul, Celac e BRICS, fonte de constante dor de cabeça para os EUA, e o seu realinhamento com o imperialismo.

É pois importante sublinhar a importância da nova derrota da direita e da reação internacional na América Latina. Saudar a reeleição do primeiro presidente índio, Evo Morales, e a vitória do MAS e realçar o significado do processo de Revolução Democrática e Cultural em curso na Bolívia, cujo aprofundamento constituiu um desafio aos axiomas do neoliberalismo e tentativas de sua recauchutagem, e fator de inspiração para a luta dos trabalhadores e povos. Saudar o triunfo suado e precioso de Dilma Rousseff no Brasil, sem perder de vista as contingências, entraves e perigos evidenciados pela complexa correlação de forças interna. Saudar a vitória das forças da Frente Ampla no Uruguai, em que participam os comunistas uruguaios, cujos resultados abrem boas perspectivas à vitória de Tabaré Vásquez na segunda volta das eleições presidenciais, a 30 de novembro, prosseguindo o processo de mudanças uruguaio.

De Havana, Caracas e Quito, entre outras capitais latino-americanas, chegam mensagens de satisfação com os resultados obtidos. De um modo geral é ressalvado o significado destas eleições para os processos de integração latino-americana, e o seu sentido anti-imperialista. Resultados também importantes tendo em conta o próximo calendário eleitoral na região, nomeadamente, as legislativas na Venezuela, previstas para o final de 2015, sabendo-se que os EUA e os setores mais obscuros da oligarquia estão profundamente comprometidos com o objetivo de aniquilar a Revolução Bolivariana.

O regozijo sereno pelas vitórias de outubro na América Latina é inseparável das tarefas de preparação do futuro e desenvolvimento da luta de massas que se colocam às experiências sociais mais avançadas na região, num contexto de grande diversidade de processos e forças protagonistas. Fortalecendo os instrumentos e mecanismos de participação para assegurar melhores condições para governar de encontro aos anseios populares. Cuidando e reforçando a unidade fundamental do campo revolucionário, progressista e anti-imperialista, para continuar a acumulação de forças e aprofundar a senda emancipadora e o avanço popular na América Latina.

*Membro da Seção Internacional do Partido Comunista Português