MLT cobra desapropriação e reforma agrária urgente da Lusomar

Na tentativa de fazer com que o processo de desapropriação e reforma agrária seja mais ágil, os trabalhadores resolveram, a partir desta semana, ocupar as fazendas Lagoa Vermelha e Mato D’Água

Jandaíra, município do Estado da Bahia, distante 300 quilômetro da capital Salvador, é o local onde operou, durante mais de 15 anos, um dos maiores empreendimentos de maricultura do Brasil – a Lusomar Maricultura.

Criada em 1993, a empresa foi um dos maiores projetos da região e, durante o seu ápice de produção, entre 2005 e 2007, chegou a gerar cerca 750 empregos diretos para a população dos municípios localizados ao redor das fazendas Lagoa Vermelha e Mato D’Água, onde estavam espalhados os mais de 1.449 hectares responsáveis pelos viveiros da produção de camarão (carcinicultura).

Por causa da grandeza, a LusomarMaricultura firmou-se como a maior empregadora do setor privado da região Litoral Norte da Bahia e Sul de Sergipe, já que localiza-se na divisa entre os dois Estados. Com produção voltada principalmente para o mercado internacional, estabeleceu-se como grande exportadora para países como França, Espanha, Bélgica, Portugal e Estados Unidos, atingindo um faturamento anual de mais de R$ 34 milhões.

Apesar de todo o crescimento produtivo desde a fundação, a Lusomar Maricultura não conseguiu manter-se fiel aos encargos fiscais do Governo Federal. No ano de 2005, por exemplo, os sócios do empreendimento garantiram junto ao Banco do Nordeste do Brasil (BNB) um empréstimo no valor de R$ 34 milhões. Essa dívida nunca foi paga e, atualmente, com os juros gerados ano após ano, além de outros encargos fiscais, a empresa deve ao Governo brasileiro o assustador montante de mais de R$ 50 milhões.

Porém, o impacto negativo levado à região após o fim da Lusomar, com a falência da empresa e conseqüente demissão das centenas de trabalhadores, aponta que é imprescindível a urgente retomada do projeto. É necessário garantir a melhoria de vida para os habitantes dos municípios envolvidos, fazendo o capital girar e, sobretudo, aproveitando a oportunidade para consolidar mais um processo de reforma agrária, através da desapropriação da terra.

Isso é o que alerta o MLT (Movimento de Luta pela Terra), que tem lutado veementemente para sensibilizar o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em acelerar o processo de desapropriação da área e distribui-la entre agricultores baianos e sergipanos, que ainda não possuem terra.

Para tanto, o MLT já acionou o Ministério da Pesca e Aquicultura para estudar o caso da Lusomar Maricultura e emitir parecer sobre a situação. Em um dos relatórios, inclusive, o técnico do Ministério que vistoriou a área apontou o imenso potencial produtivo e, portanto, econômica do projeto e até recomendou o retorno das atividades. “O uso da área para aquicultura é viável e extremamente recomendado, visto que os viveiros escavados estão em boa condição de uso”, é o que apresenta um trecho do relatório emitido.

O problema, porém, é que, segundo o MLT, o processo de desapropriação e reforma agrária das terras já dura quase dois anos e até agora nenhum evolução da situação foi registrada por parte do Incra.

Segundo David Souza, um dos coordenadores nacionais do MLT, diversas reuniões já foram realizadas entre representantes do movimento e o Incra e, mesmo assim, há certa morosidade no processo. “A articulação nacional está sendo feita. Já sentamos várias vezes com a superintendência do Incra, mas até agora nada. Estamos fazendo todo o esforço para que o Instituto desaproprie a área e conceda o comando dos meios de produção aos trabalhadores”, ressaltou.

Além disso, segundo David, a reforma agrária da área não acarretaria nenhuma despesa para o Governo brasileiro, pois não seria necessário alocar recursos para a compra dos hectares, já que a dívida acumulada da Lusomar seria revertida para a desapropriação. “O Governo, na verdade, estaria devolvendo o empréstimo feito pela lusomar à sociedade brasileira, garantindo à área um fim social que beneficia toda a região”, informou.

Os problemas sociais vivenciados pela população, que antes dependia direta e indiretamente da atuação da Lusomar,são grandes. Para tanto, segundo Adinaldo Nascimento, coordenador Nacional do MLT, é indispensável cumprir, com o retorno das atividades no local, o papel social que é, inclusive, proposto pela Lei da reforma agrária. Ele aponta dois viés com a reforma agrária da área: o benefício social e econômico levado à região a partir do retorno de ocupação da área e, sobretudo, a fixação de mais de 400 famílias campesinas em suas próprias terras.

“O impacto para aquela região é fortíssimo, tanto social quanto econômico. A ocupação dessa área por famílias oriundas da reforma agrária seria o principal responsável para retirar essa região das dificuldades em que se apresenta: desemprego generalizado, comércio em baixa, entre outros. A economia deste lugar está sentindo muito, e o social… aí nem se fala. Por causa da falta de oportunidades, muitos jovens estão indo embora, procurar a sorte nas capitais dos estados de Sergipe e Baia. Ou seja, a situação não é boa. A ocupação dessa área cumpre um papel fundamental para os assentados, mas principalmente para a região como um todo”, disse Adinaldo.

Novo projeto Lusomar

O Movimento de Luta pela Terra (MLT), que representa os trabalhadores campesinos do Brasil, está à frente de toda essa discussão e tem representado os trabalhadores rurais que ficaram desempregados desde a quebra da Lusomar. A coordenação nacional do MLT tem se debruçado em um projeto que contempla todos os fatores sociais necessários para a região onde estão as fazendas Lagoa Vermelha e Mato D’Água.

Para tanto, o movimento elaborou um levantamento sobre o número de pessoas que atualmente vivem na região e necessitam de sua própria terra para produzir. O cadastro revelou que ao todo 500 famílias estão nessa situação. Destas, 300 são de ex-funcionários da Lusomar.

Para estas famílias é calculado que a renda gerada por cada área de produção destinada a ela seja de pelo menos R$ 24 mil por ano, através da policultivo de espécie – pensando-se a produção de camarão, tilápia e bijupira.

Além disso, o MLT propõe que a administração da área seja feita por meio de cooperativa e produção coletiva, que é, segundo o Estatuto social do movimento, a forma democrática mais condizente com a realidade da organização social dos trabalhadores campesinos.

Há ainda a preocupação com a capacitação desses homens e mulheres que serão responsáveis pela produção. Neste sentido, o MLT, em parceria com a Superintendência do Ministério da Pesca em Sergipe e do Instituto Federal de Sergipe (IFS), está capacitando 20 ex-funcionários da Lusomar no curso de aqüicultura, através do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). Para 2015, serão mais 60 trabalhadores formados no curso.

Além da experiência no trato diário durante os anos em que trabalharam nas fazendas, manejando com o produto, a formação garante a qualidade da produção.

Ocupação

Na tentativa de fazer com que o processo de desapropriação e reforma agrária seja mais ágil, os trabalhadores resolveram, a partir desta semana, ocupar as fazendas Lagoa Vermelha e Mato D’Água, onde estão as áreas de produção.

Libanilson Braga de Oliveira, coordenador nacional do MLT, registra a importância da ação: “Nós vamos ocupar de forma organizada e só sossegaremos quando o Incra resolver definitivamente o processo. Não podemos mais esperar. Precisamos ocupar e movimentar estas terras, entregando-as aos trabalhadores que necessitam de um lugar para sobreviver, desenvolver toda a região do Norte da Bahia e Sul de Sergipe e ajudar a gerar riqueza para o nosso país, já que está comprovado que o projeto é totalmente viável”.