Doutoranda denuncia assédio moral e sexual na Ufscar

A doutoranda Thais Santos Moya, publicou uma foto em sua conta pessoal no Facebook onde aparece com os cabelos raspados. Segundo ela, a ação é um protesto contra o abuso sexual que sofreu de um professor orientador e uma forma de dar voz a este crime que foi acobertado pela universidade onde está concluindo seu doutorado, a Ufscar.

Thais Moya - Arquivo pessoal

No relato, Thais afirma que “aguentou calada” por mais de dois anos o abuso que sofreu: um professor, que fora seu orientador, a agarrou e a beijou a força, por duas vezes, sem o seu consentimento. Depois de recusar as investidas, ela foi progressivamente retirada dos projetos do núcleo de estudos coordenados por ele.

Segundo Thaís, o professor afirmou ainda que ela é “uma franga sem doutorado, que precisa colocar o rabo entre as pernas, parar de enfrentar professor doutor e aprender a jogar o jogo da academia, caso queira mesmo continuar nela".

A aluna conta que procurou ajuda da universidade e foi intimidada, outros estudantes também se solidarizaram e foram ameaçados. Veja o depoimento completo publicado em sua página pessoal:

Raspei minha cabeça como forma de protesto.

Raspei meus cabelos porque eu fui, duas vezes, agarrada e beijada por meu professor e (ex) orientador sem o meu consentimento.

Raspei a cabeça porque, como quase toda vítima de assédio, passei dois anos amedrontada e coagida pelas relações de poder que perpassam as consequências de denunciar o ocorrido. Senti-me responsável não apenas pela minha carreira profissional, mas pela do professor em questão e pelas consequências negativas que recairiam no Programa de Pós Graduação e nos colegas do núcleo de estudos. Calei-me, acovardada.

Raspei meus cabelos porque, depois de ser agarrada pelo professor e recusar, ele progressivamente me tirou dos projetos do núcleo de estudos que ele coordena, dizendo em uma ocasião que sou "uma franga sem doutorado, que precisa colocar o rabo entre as pernas, parar de enfrentar professor doutor e aprender a jogar o jogo da academia, caso eu queira mesmo continuar nela". Além de em nada orientar minha pesquisa.

Raspei minha cabeça porque a coordenação elaborou um survey [pesquisa] para as/os estudantes avaliarem o Programa. Tal survey foi apresentado como anônimo e vi nele a única oportunidade segura de relatar os assédios que sofri e também aqueles que testemunhei. No entanto, a coordenação do programa divulgou as respostas abertas do survey para todos estudantes.

Raspei meus cabelos porque um grupo de estudantes leu os relatos de assédios e se mobilizou, escrevendo uma carta para os docentes (CPG), reivindicando uma posição deles, principalmente, porque eles haviam ignorado por completo os relatos. Boa parte dos docentes ficou muito irritada e começou coagir seus orientandos com intuito de desmobilizar o processo de reivindicação em curso.

Raspei minha cabeça porque a coordenadora do Programa postou no seu Facebook que os estudantes estavam "criminalizando a expressão sensual".

Raspei meus cabelos porque, ontem, houve uma reunião marcada pelos docentes com os estudantes. Sem qualquer escrúpulo, a professora, que falava em nome do corpo docente, pronunciou os nomes dos relatados, que até então eram anônimos, e afirmou – baseada em argumentos que apelam para tradição – que meus relatos são mentirosos, pois conhece o professor há 20 anos e, segundo ela, trata-se de um homem comprometido e galante (!!).

Raspei minha cabeça porque os docentes exigiram a retirada da carta elaborada pelos estudantes, senão processariam judicialmente os representantes discentes. Instauraram um clima de terror e chantagem, que desmobilizou todos estudantes presentes.

Raspei meus cabelos porque os docentes compararam os estudantes aos nazistas, além de insinuar que os professores relatados estavam sendo vítimas de racismo e homofobia, já que se trata de um professor negro e outro gay. Houve uma estratégia sórdida de inverter o cenário, colocando-me como agressora, assim como todos os estudantes.

Raspei minha cabeça porque cansei de ser assediada, coagida e chantageada.
Raspei meus cabelos porque eu fui publicamente humilhada, ofendida e desrespeitada por docentes que afirmaram que meus relatos de assédios são mentirosos sem nem ao menos me ouvirem pessoal e detalhadamente.

Raspei minha cabeça porque sofri um linchamento moral de um Programa de Pós Graduação que tentei até aqui preservar, tanto seus docentes, quanto discentes.

Raspei meus cabelos porque eu poderia me calar por mais 7 dias e defender meu doutorado sem mais constrangimentos e coações, mas eu me recuso fazer parte dessa lógica opressora que o corpo docente instaurou no Programa. Eu, mesmo com medo de mais retaliações, não me calo mais.

Raspei minha cabeça.

Raspei meus cabelos.

Mas permaneço em pé.



Do Portal Vermelho