As Aventuras do Avião Vermelho 

Inspirado em livro infantojuvenil do autor de Olhai os Lírios do Campo, o desenho animado As Aventuras do Avião Vermelho, que estreou dia 11, tenta abrir espaço num segmento dominado pelos Estúdios Disney.

Por Maria do Rosário Caetano
 

As Aventuras do Avião Vermelho

Erico pai e Verissimo filho são as ma­trizes de “As Aventuras do Avião Verme­lho”, longa-metragem de animação, diri­gido pela dupla gaúcha Frederico Pinto e José Maia, em cartaz nos cinemas das re­giões Sul e Sudeste. Num segundo mo­mento, o filme chegará a todo território brasileiro.

Há décadas, o Brasil luta para colocar conteúdo nacional no lucrativo terreno da animação infantojuvenil. Mas a hege­monia de Hollywood, em especial a dos filmes dos Estúdios Disney, segue imba­tível.

Fora longas-metragens da Turma da Mônica, realizados pelos Estúdios Mau­rício de Souza, pouco se fez para que a animação brasileira atingisse o grande público. Agora, um time de artistas, com destaque para os gaúchos, tenta conquis­tar pelo menos uma fatia da imensa e ca­tiva plateia dos grandes estúdios estadu­nidenses.

A brigada que vem dos pampas é muito mais que um exército de Brancaleone. A começar pela fonte do novo longa-metra­gem: Erico Verissimo (1905-1975), autor do livro As Aventuras do Avião Verme­lho, escrito em 1936. A Companhia das Letrinhas mantém, nas livrarias, bela edição do clássico literário, ilustrada por Eva Funari.

A trama do filme inclui outro grande nome das letras gaúchas e brasileiras, Luis Fernando Verissimo. Foi para o fi­lho, que acabava de nascer, que Erico ur­diu a estória de Fernandinho, menino de imaginação fértil, capaz de incorporar a coragem e o espírito aventureiro do Ca­pitão Tormenta, piloto de avião, que cor­ria mundos.

“Tu” no lugar do “você”

Frederico Pinto e José Maia, que co­mandam “As Aventuras do Avião Verme­lho”, têm uma grande folha de serviços prestados ao cinema de animação. Para ajudá-los, convocaram centenas de artis­tas do Rio Grande do Sul (um dos estados que mais investem em desenhos anima­dos, vide o trabalho de Otto Guerra, dire­tor de “Rocky & Hudson – Os Cowboys Gays”, “Wood & Stock – Sexo, Orégano e Rock’n Roll” e “Até Que a Sbórnia Nos Separe”).

As Aventuras do “Avião Vermelho” mantém o falar gaúcho (com o “tu” no lugar do “você”). O personagem princi­pal do livro – Fernandinho, menino tra­vesso e de imaginação indomável – é du­blado por Pedro Yan, um jovem gaú­cho. O pai do personagem também tem a imagem e a voz de um ator riogranden­se, Sérgio Lulkin. Os demais dublado­res e, em alguns casos fontes inspirado­ras dos personagens, são cariocas, baia­nos ou paulistas. Milton Gonçalves faz a voz do avião. Lázaro Ramos empresta seus traços e ginga ao boneco afro-bra­sileiro, Chocolate. Zezeh Barbosa faz Jo­sefina, que trabalha na casa de Fernandi­nho e cuida dele. Wandi Doratiotto, ator e cantor do Premê, empresta sua voz ao Ursinho.

Asas à imaginação

A trama, que ganhou cores vivas, mui­ta ação e trilha sonora das mais dinâmi­cas (ninguém reclamará de tédio ao as­sistir aos 74 minutos do filme), tem em Fernandinho seu protagonista absoluto.

Hiperativo, oito anos, ele passa largos momentos lendo estórias aventurosas do Capitão Tormenta. O aviador percorre o mundo num avião vermelho. Ao ser pre­senteado com um brinquedo (justo um aviãozinho vermelho) o garoto criará sua própria aventura.

Graças a uma lente (de aumento e de redução!), ele conseguirá, junto com Chocolate e Ursinho, ser miniaturizado. Empreenderá, então, viagem pelos mes­mos locais visitados pelo Capitão Tor­menta: a lua, a China, a África e a Índia (quer chegar a Kamtchaka). No percurso, enfrentará muitos perigos: ventanias, re­lâmpagos e até um exército de tico-ticos.

Os desenhos foram realizados com lá­pis, papel e também com a ajuda de com­putadores (mas sem recorrer ao 3D). Os computadores e videogames estão no ambiente doméstico de Fernandinho, pois hoje toda criança urbana convive com o mundo digital. Foram realizados, para o filme, mais de 50 mil desenhos.

Momento promissor

Quatros anos foram gastos na feitura do filme (três de animação e um de fina­lização). Frederico lembra que, desde o dia em que começou a desenvolver o pro­jeto e iniciou as tentativas de viabilizá-lo se passaram 10 anos.

E mesmo que “a produção brasileira de animação venha crescendo nos últimos anos, a formação de mão de obra não se dá, ainda, no ritmo necessário”. Por isto, “boa parte da nossa equipe e da equipe de ‘Até que a Sbórnia nos Separe’ (lon­ga produzido na mesma época, em Porto Alegre) foi formada em um curso minis­trado pelo José Maia, em parceria com o Otto Guerra”.

“As Aventuras do Avião Vermelho” foi o primeiro filme de muitos jovens pro­fissionais, que nestes anos de produção conseguiram se desenvolver e aprimo­rar seus conhecimentos. Certamente um próximo filme, com esta equipe, terá um período menor de produção, graças ao aprendizado acumulado.

Os profissionais formados pelas equi­pes de “Avião Vermelho” e “Sbórnia” po­derão usufruir de um mercado bem me­lhor que o existente até três ou quatro anos atrás, quando foi implantada a Lei da TV a Cabo (que exige a exibição de três horas semanais de produção nacio­nal nas emissoras por assinatura).

“Vivemos um momento promissor, a produção está crescendo e, o que é me­lhor, estão sendo realizadas muitas ani­mações com qualidade e personalidade (estamos descobrindo uma voz própria e cada vez mais nos afastando das “fór­mulas de sucesso” estadunidenses). Há mecanismos e formas de viabilizarmos um projeto, mas precisamos investir em formação e qualificação de mão de obra especializada, principalmente roteiris­tas de animação, artistas de storyboard e animadores. Senão, não teremos como competir em mercado tão disputado.”

Fiel à essência

Frederico Pinto, que além de dirigir o filme com José Maia, é um dos autores do roteiro, conta que algumas modifica­ções foram inseridas na trama do livro. Afinal, “Erico Verissimo o concebeu há quase 80 anos”. Mas – garante – “a es­sência foi mantida e boa parte do enredo é bem próxima ao livro. Nós só fizemos algumas escolhas, focamos mais em de­terminados pontos, como a relação pai e filho, e enriquecemos a personalidade de alguns coadjuvantes, como o Ursinho e o Chocolate, companheiros de aventura do personagem principal”.

Frederico e equipe realizaram, pa­ra a família Verissimo, sessão especial do “Avião Vermelho”, em um cinema de Porto Alegre, antes da estreia comercial do filme.

“O Luis Fernando foi com boa parte da família Verissimo à pré-estreia do fil­me. Como ele consegue ser mais tímido do que eu, não teceu muitos comentá­rios. Mas estava com um sorriso estam­pado na cara e tirou fotos com a equi­pe (sempre com a netinha ao seu lado). Ao ser perguntado se seu pai se diverti­ria com o filme, respondeu com convic­ção, para nosso contentamento, que ‘se divertiria sim!’”.

Fonte: Brasil de Fato