Ricardo Guilherme: Guilherme Neto, senhor de unânimes afetos
O ator e diretor Ricardo Guilherme escreve sobre o tio, o teatrólogo Guilherme Neto que marcou a história da radiodifusão no Nordeste.
Publicado 20/01/2015 10:05 | Editado 04/03/2020 16:26
Fortaleza está viúva. A noite é o luto. Morreu Guilherme Neto (1925-2014), legenda de pioneiras realizações que em quase sete décadas de atividades exerceu as mais diversas funções no âmbito da radiofonia, do jornalismo, da literatura, da publicidade, do magistério e do teatro.
Inicia sua carreira em 1944, como cantor da antiga PRE-9. Na década 1950, depois de ser assistente de direção da Rádio Tamandaré, de Recife, volta a Fortaleza para dirigir a Ceará Rádio Clube (de 1954 a 1960).
Surge a televisão em Fortaleza (1960) e Guilherme lidera a equipe de fundação da pioneira TV Ceará Canal 2, núcleo de produção para o qual escreveu e dirigiu Poeira Vermelha (1961), primeira telenovela cearense.
Sua estreia como dramaturgo acontece com A Barragem, peça sobre a indústria da seca, encenada em 1964 pela Comédia Cearense.
Em 1968, Guilherme implanta como professor a disciplina Introdução à Linguagem de Televisão no Curso de Arte Dramática da Universidade Federal do Ceará.
Em 1969, torna-se editor e diretor comercial, respectivamente, dos jornais Unitário e Correio do Ceará. No ano seguinte, retorna à direção da TV Ceará (até 1979) e sua gestão é marcada pela implantação do sistema de transmissão em cores e pela realização dos programas Porque Hoje é Sábado e Show do Mercantil que lançaram Belchior, Fagner e Ednardo.
Com o surgimento em 1974 da TV Educativa, Canal 5 (atual TVC), assume a direção artística da emissora. Em 1981 o reitor Paulo Elpídio o escolhe para dirigir a recém-criada Rádio Universitária.
Durante todo esse período e até 2007, Guilherme foi cronista nos mais diversos jornais de Fortaleza, inclusive em O POVO e no Diário do Nordeste.
Esse mestre de gerações não fez tão-somente. Soube fazer com que inúmeros profissionais fizessem, transformando-se em um deflagrador de vontades, um semeador de consciências, detentor de talentos e detector de talentos.
Fortaleza, essa “provincianópole” de memória tão nebulosa, precisa reverenciar Guilherme Neto, não apenas por sua atuação artística mas também por ele ser em nossa pátria-cidade senhor de unânimes afetos, santo profano, padroeiro das vielas marginais e das esquinas boêmias.
Sempre que se fizer o negrume da noite, haveremos de ouvir dentro de nós a sua voz lunar, de seresteiro, a despertar a lua. E, assim, então, outra vez enluarados pelo vigor das graves e das agudas paixões, poderemos ser, como preconiza Bilac, capazes de ver, de ouvir e de entender estrelas.
Ave, tio João Guilherme da Silva Neto. Os que viveram e os que vivem – em nome dos que ainda vão viver – te saúdam. Ave, vida!
*Ricardo Guilherme é ator, dramaturgo e diretor
Fonte: O Povo