Emmanuel Furtado: Grandes fortunas x terceirização

Por *Emmanuel Furtado

Estabelece a Constituição Federal, apoiada no princípio da capacidade contributiva (cada um deve pagar os tributos de acordo com sua capacidade econômica – art. 145, §1º), que à União compete instituir impostos, dentre outros, sobre grandes fortunas, nos termos de lei complementar (inciso VII do art. 153). Ora, sabe-se que o Brasil detém o patamar lamentável de uma das piores distribuições de renda do mundo. Maioria esmagadora das fortunas está nas mãos de percentual mínimo de pessoas.

Com o objetivo de minorar tal discrepância, estabeleceu o constituinte que os detentores de grandes fortunas hão de ser mais pesadamente tributados, de acordo com o que o legislador complementar (infraconstitucional) estabelecer. Ocorre que, apesar de a Constituição datar de 5/10/1988, de lá para cá não houve ânimo por parte do Congresso para a edição da referida norma, o que torna sem efeito o texto constitucional que prevê a taxação de grandes fortunas. De outra banda, assistimos estupefactos ao frenesi com que está sendo votado o projeto de lei da terceirização.

Há, pois, notório descompasso no apetite congressual de solapar a classe trabalhadora e a inapetência para tributar os grandes detentores da riqueza. A Constituição Italiana traz em seu primeiro artigo a valorização e preservação ampla do trabalho humano. Nossa Constituição, igualmente, deu extrema importância à labuta do homem, daí intuir-se que toda e qualquer norma que vá de encontro aos primados do trabalho fere a lei maior do país.

Salários diminuídos, entrave para ascensão funcional, dentre outras nefastas situações são decorrências diretas do chamado trabalho terceirizado. Argumentar que a lei está apenas regulamentando o que já existe na prática é falácia, pois o leque ora ofertado é bem maior do que já ocorre. O quadro que se vê é de um parlamento preservando as grandes fortunas e golpeando a classe trabalhadora. Será o justo?

*Emmanuel Furtado é desembargador do TRT e professor da UFC

Fonte: O Povo

Opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as opiniões do site.