Jeferson Miola: A divulgação seletiva de escândalos
Nos últimos tempos, a sociedade brasileira se defronta com grandes escândalos de corrupção. Para citar alguns: os casos de propinas na Petrobrás [Lava Jato], no Carf [Conselho Administrativo de Recursos Fiscais] do Ministério da Fazenda [Zelotes] e no metrô de SP; os depósitos secretos em contas do Banco HSBC na Suíça etc.
Por Jeferson Miola*, na Carta Maior
Publicado 25/05/2015 09:27
Pelo noticiário, todavia, fica-se com a impressão de que existe somente a Operação Lava Jato. Não bastasse esta seletividade, a notícia é ainda recortada para vincular Dilma, Lula e o PT à gênese da corrupção no Brasil.
É uma cobertura evidentemente anômala, por muitas razões. A começar pelo fato óbvio de que é sabido que o escândalo da Petrobrás é apenas um, dentre outros conhecidos, e que se assemelham no modus operandi: alguns políticos de vários partidos, empresários e funcionários públicos inescrupulosos formam quadrilhas para a prática criminosa.
Sabe-se também que a roubalheira da Petrobrás, que surrupiou cerca de 6 bilhões de reais da empresa, é pelo menos três vezes menor que a sonegação fiscal praticada por empresas num esquema de corrupção que atua sobre o Carf. O prejuízo do erário, segundo se estima provisoriamente na Operação Zelotes, é de 19 bilhões de reais – quase um terço dos cortes orçamentários anunciados pelo governo.
É compreensível o silêncio no noticiário. Afinal, se diz que entre os envolvidos estão o império daquele mega-empresário siderúrgico que ironicamente “ensina” a governos a magia da “eficiência e da produtividade privada” [sic]; estão também empresas de comunicação, bancos, banqueiros, conglomerados econômicos, grandes anunciantes, etc.
Seria difícil ao noticiário deixar de sonegar que alguns donos de jornais, algumas celebridades e um punhado de empresários e banqueiros sejam titulares das 7 mil contas no HSBC da Suíça que receberam depósitos milionários – em muitos casos, sem comprovação da origem legal da dinheirama.
No caso do metrô de SP, embora seja um esquema montado a mais de década e que atinge a casa de bilhões em prejuízos, um noticiário acanhado dá conta de uma apuração apartidária, despolitizada e que não criminaliza agentes políticos, porque joga a culpa em funcionários públicos que "agiam por conta própria”. Fosse o PT o partido no governo em SP durante duas décadas, estaria assegurado o carnaval midiático massacrante.
Embora os implicados na Petrobrás sejam majoritariamente identificados com os demais partidos [só o PP tem mais de 30 envolvidos], o noticiário trata como "petrolão do PT" [sic]. No circo da investigação da Operação Lava Jato, bandidos viram celebridades e ganham fé pública no noticiário das 8 da noite. Nos casos da Zelotes, das contas-fantasmas no HSBC, do metrô de SP, entretanto, não existe circo; porque existe silêncio, quando não a ocultação.
Uma prova prática disso: quem pesquisar no Google notícias sobre estes escândalos perceberá a abundância de registros diários sobre a Petrobrás, porém registros esparsos e em quantidades infinitamente menores dos demais escândalos.
Ante tal anomalia do noticiário, é fundamental que haja pressão pública para que a mídia repercuta com isonomia, imparcialidade e isenção a realidade brasileira – sem recortes e seletividade. A mídia tem exercido este papel danoso à democracia porque lamentavelmente encontra em setores da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário atores políticos que instrumentalizam as investigações para, dependendo do caso, criminalizar adversários ou proteger amigos.
Esta "midiatização justiceira" que perigosamente toma conta da arena pública infundindo ódio, se não for revertida a tempo poderá legitimar uma trajetória de regressão jurídica e democrática do país.