UNE: luta contra a redução da maioridade penal continua

Após uma grande vitória do movimento estudantil na madrugada da última quarta-feira (2), quando a proposta de redução da maioridade penal para crimes graves foi derrotada no plenário da Câmara dos Deputados, assistimos na madrugada desta quinta-feira (3) o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), dar um golpe na democracia brasileira.

Carina Vitral - Yuri Salvador

Em mais uma de suas manobras, Cunha articulou com os deputados Rogério Rosso (PSD-DF), Andre Moura (PSC-SE) e Marcelo Aro (PHS-MG) uma emenda que fazia alterações mínimas na proposta — retirando os crimes de tráfico de drogas, terrorismo, tortura e roubo qualificado do texto — e colocando-o novamente em votação.

Todos os deputados que corajosamente votaram “não” ao projeto na primeira vez foram coagidos e pressionados. A diferença de apenas cinco votos foi facilmente revertida por Cunha e aliados, que abrandaram o texto para atrair os indecisos.

Em menos de 24 horas, 21 parlamentares mudaram o seu voto e a PEC 171, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes hediondos, foi aprovada em primeiro turno por 323 votos a favor e 155 contra. Além disso, houve quatro obstruções e duas abstenções.

Por se tratar de uma alteração na Constituição, a matéria precisa ter 308 votos para passar. O texto precisa ser votado em um segundo turno pela Casa e ser analisado pelo Senado.

A presidenta da UNE, Carina Vitral, lamentou o ocorrido e prometeu continuar firme na luta contra a redução.

“Dentro do plenário o que nós vimos hoje foi inacreditável, deputados acuados diante de ameaça e chantagem. O debate parecia um replay de uma matéria já apreciada ontem, uma manobra no regimento, um faz-de-conta até que Cunha alcançasse a maioria”, declarou Carina.

“Mesmo assim foi por pouco! Isso significa que nossa luta não foi em vão. A unidade construída nas ruas em todos esses dias foi fundamental. Agora precisamos nos preparar pra votação do segundo turno na Câmara e depois pro Senado. Não vamos baixar a guarda, a luta não acabou!”, conclui a presidenta da UNE.

Galerias vazias

O acesso à Câmara dos Deputados foi novamente restrito e os estudantes foram deixados do lado de fora apesar de uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) ter garantido o acesso ao plenário. As galerias ficaram vazias durante toda a sessão.

Os estudantes foram obrigados a acompanhar a votação dos corredores da Câmara, pressionando os deputados que passavam para votar contra a redução.

A UNE e a UBES já estão encaminhando medidas judiciais a este respeito.

Golpe na democracia

A manobra de Cunha e da bancadada bala para votar novamente a redução da idade penal foi um golpe na democracia, uma ‘pedalada regimental’ que desrespeitou o regimento da Casa do Povo, como disse a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

Ela afirmou que as mudanças regimentais podem gerar precedentes que hoje servem a um lado, mas, no futuro, poderão ser utilizado por outros. “Se hoje serve a alguns, amanhã servirá a outros. Ganhar no tapetão não serve a ninguém”, declarou.

O Psol chegou a divulgar uma nota explicativa sobre o que chamou de “golpe de Eduardo Cunha”. “Essa emenda aglutinativa somente poderia ser votada após a votação do texto principal, desde que ele fosse aprovado. Para que a emenda fosse votada antes do texto principal, deveria ter sido feito, antes da votação de ontem, um destaque de preferência para sua votação. Esse destaque, no entanto, não foi feito”, diz comunicado publicado pelo partido.

Até o ex-presidente do STF, Joaquim Barbosa, que já havia se manifestado na noite anterior sobre a questão, criticou a manobra de Cunha. “Matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa”, afirmou.

A manobra de Cunha viola ainda o artigo 60, §5º da Constituição Federal, que diz: “§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.”