Cordel Umbilical: Carta de Joan para Idalzira

Sei que muito bom seria
Se nós pudéssemos viver
No mais completo prazer
Na mais repleta alegria
Eu de casa não saía
Não deixava o meu sertão
Pra viver na solidão
Neste lugar tão pacato
Dê lembranças ao seu gato
E um abraço em seu cancão

A gente não abandonou
Nossa casa por vontade
Mas porque a necessidade
É mais forte e nos obrigou
Tanto que a gente chorou
Quando da separação
Doeu nosso coração
Para fazer esse ato
Dê lembranças ao seu gato
E um abraço em seu cancão

Lembre-se Mamãe querida
Que um dia também deixou
A casa do meu avô
Para viver sua vida
Mesmo chorando a partida
Soube agir com a razão
Foi triste a separação
Mas consumou-se o fato
Dê lembranças ao seu gato
E um abraço em seu cancão

Se Edivam foi embora
Foi pra vida melhorar
Portanto não vá botar
A culpa na sua nora
Eu sei bem que a senhora
Tem muita recordação
De que o nosso torrão
Foi com ele muito ingrato
Dê lembranças ao seu gato
E um abraço em seu cancão

Edvany, na verdade
Foi cumprir a sua sina
Já não era mais menina
E queria a felicidade
Aí ou em outra cidade
Se for embora ou não
Deixando o nosso rincão
Não vai perder o contato
Dê lembranças ao seu gato
E um abraço em seu cancão

Eu, Erivan e Didi
Não esquecemos da senhora
Mas é que chegou a hora
De nós sairmos daí
Erivan e Evandy
Buscam outra posição
Melhorar de situação
Eu acho isso exato
Dê lembranças ao seu gato
E um abraço em seu cancão

Sua irmã e seus conhecidos
Tiveram que se afastar
Mas por isso não vá pensar
Que eles estão esquecidos
Dos bons momentos vividos
Aí em nosso torrão
Eu sei que o seu coração
Também sofre com o mau trato
Dê lembranças ao seu gato
E um abraço em seu cancão

Lembre, o meu padecimento
É parecido com o seu
Fique sabendo que eu
Vivo no maior tormento
Pois todo dia lamento
Esta minha situação
Pra aliviar a solidão
Não tenho nem seu retrato
Nem a companhia de um gato
Muito menos de um cancão

Acaraú, 23 de agosto de 1990