Cordel Umbilical: Carta de Joan para José Edvan

Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Um homem apaixonado
Perde o tino da vida
Cai num beco sem saída
Vive só e desarvorado
Só toma o rumo errado
Se acaba sua alegria
É um ser sem serventia
Vive a chorar sem ter dor
Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Faz pena um homem assim
Vivendo na solidão
Lembrando sua paixão
E o seu amor sem fim
É uma tristeza ruim
O cristão fica sem guia
Fazendo estripulia
Perde todo o seu pudor
Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Se é fraco o sujeito
Desmerece a sua raça
Cai no vício da cachaça
Não faz mais nada direito
Tenta curar o seu peito
Se afundando na orgia
Caindo na anarquia
Vira até jogador
Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Se a mulher é malvada
E não lhe dá esperança
Mesmo assim ele não cansa
De louvar a sua amada
Fica até de madrugada
Fazendo música e poesia
Finda a noite na coxia
Depravado bebedor
Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Assim leva a sua vida
Afastado do seu lar
Sempre a enveredar
No caminho da bebida
Deixa sua casa esquecida
E em vez da cama macia
Dorme na delegacia
Sem rede e sem cobertor
Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Outro tipo enlouquece
E faz todo desatino
Parece até um menino
Perde a vergonha ou esquece
Se do mesmo mal padece
Ganha logo a antipatia
Do povo da freguesia
Onde ele é morador
Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Que a mulher é capaz
De mudar muito cristão
Disto eu não duvido não
Mulher é bicho sagaz
O homem que vive em paz
Lá na sua moradia
Fazendo economia
Vira logo esbanjador
Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Homem sem fé e descrente
Se transforma em beato
Para conquistar no ato
A mulher que tem em mente
Pisa sobre brasa quente
Faz promessa e simpatia
Sobe a pé em romaria
Até o Cristo Redentor
Quem anda cego de amor
Não sabe se é noite ou dia

Acaraú, 03 de setembro de 1990