Peça teatral dá voz aos esquecidos e desaparecidos no Araguaia
A peça teatral “Guerrilheiras ou para a terra não há desaparecidos, em cartaz no Espaço Sesc, no Rio de Janeiro, traz sons e rostos dos camponeses que ainda vivem na região do Araguaia, no sul do Pará. A partir da história de 12 mulheres que lutaram e morreram na Guerrilha do Araguaia – um dos mais importantes e violentos conflitos armados da ditadura militar brasileira – a atriz Gabriela Carneiro da Cunha idealizou o espetáculo.
Publicado 06/09/2015 13:20
“O tema está completamente alinhado com o momento atual do país. No ano passado foram os 50 anos do Golpe Militar, tem o trabalho da Comissão da Verdade e vimos as manifestações de junho detonaram um fluxo de pensamento e questionamentos sobre os rumos do Brasil, tudo isso em um cenário político árido em termos de invenção e identidade. Não é por acaso que os artistas estão trazendo essas questões em suas obras tão fortemente, mas dentro de uma linguagem poética”, acredita a atriz.
Foram 36 horas de viagem de ônibus saindo do Rio de Janeiro até chegarem às margens do Araguaia, onde ouviram os relatos de quem presenciou esta história, num lugar marcado pela tradição do massacre. Em uma terra de esquecidos e desaparecidos, onde existe uma guerra velada, há um povo que dá voz àqueles que foram mortos.
“Guerrilheiras ou para a terra não há desaparecidos”, selecionado no programa Rumos Itaú Cultural 2013/2014, tem direção de Georgette Fadel e dramaturgia de Grace Passô e estreou na última quinta-feira (3). A temporada será até 27 de setembro, de quinta a domingo. Em outubro, será apresentada na Mostra Rumos, no Itaú Cultural, em São Paulo.
Poema cênico
A Guerrilha do Araguaia, que aconteceu entre os estados do Pará e Tocantins na floresta amazônica, reuniu cerca de 70 pessoas – sendo 17 mulheres que saíram de diversas cidades do país para participar de um movimento guerrilheiro que pretendia derrubar a ditadura e tomar o poder cercando a cidade pelo campo. De abril de 1972 a janeiro de 1975, o regime militar mobilizou de três a dez mil homens que tinham ordem de não fazer prisioneiros.
Por meio de um diálogo entre a ficção e o documentário, “Guerrilheiras ou para a terra não há desaparecidos” é um poema cênico criado a partir da história dessas mulheres, de sua luta e das memórias do que elas viveram e deixaram naquela região.
A peça também busca iluminar esse importante episódio da história do país ainda tão nebuloso. “Certas coisas devem ser feitas: manter a chama acesa, relembrar e iluminar a história das lutas e dos lutadores, com todas as contradições que cada luta carrega”, destaca a diretora Georgette Fadel.
Após uma profunda e detalhada pesquisa sobre o tema, Gabriela – que atua no espetáculo – organizou uma viagem até o sul do Pará com a diretora, a autora e as atrizes Carolina Virguez, Daniela Carmona, Fernanda Haucke e Mafalda Pequenino. Sara Antunes, que também integra o elenco, não participou da viagem pois estava grávida de nove meses na ocasião. Assim como as guerrilheiras eram de diferentes cidades, a equipe é formada por artistas do Rio, São Paulo, Rio Grande do Sul e da Colômbia.
O cineasta Eryk Rocha documentou todo o percurso da equipe durante os 15 dias de viagem. Os registros audiovisuais, entre rostos e paisagens, serão projetados no palco do teatro, criando um diálogo com as atrizes. Os sons captados do rio acompanham algumas cenas.
Para criar os figurinos, Desirée Bastos garimpou cerca de 50 peças, entre calças, camisas, vestidos, chapéus, roupas íntimas em brechós no Rio e bazares no sul do Pará. As roupas foram enterradas às margens do rio Araguaia pelas próprias atrizes. Os trajes foram recentemente desenterrados e lavados. O resultado dessas peças deterioradas faz alusão aos corpos que nunca foram encontrados.
Serviço:
“Guerrilheiras ou para a terra não há desaparecidos”
Espaço Sesc (Rua Domingos Ferreira, 160, Copacabana)
De 3 a 27 de setembro
Horários: Quinta a sábado às 20h30; Domingo, às 19h
Sessões extras: 12 e 26 de setembro às 16h
Valor: R$ 5 (associados Sesc), R$ 10 (meia-entrada) e R$ 20 (inteira)