A poesia de Cristina Ohana
De uma família talentosa em várias vertentes da arte, Cristina Ohana, escolheu a poesia para expressar sua inquietude. Vencedora de diversos prêmios e com vários livros publicados, a poeta fez uma parceria com a irmã, Claudia Ohana, ao “emprestar” seu conto Um incrível dia vermelho na vida de uma dama de alma vermelha para que ela o interpretasse no cinema.
Publicado 11/09/2015 17:22 | Editado 13/12/2019 03:30

Cristina publicou seu primeiro romance Fausto com rugas em 2013 pela Editora Penalux. Em 2014 publica, pela mesma editora, Pela dos dias uma prosa poética. Alguns de seus poemas estão publicados na antologia de Masao Ono Mulheres in verso 1991.
A poeta foi vencedora do premio Moacyr Scliar de poesia com A bíblia negra de Chamberlain e tem um conto na ontologia Contos do Rio dos finalistas do concurso do Prosa & Verso do O Globo, conto este que foi para o cinema nas mãos de sua irmã Claudia Ohana.
Letras Vermelhas traz, nesta edição de Prosa, Poesia e Arte, uma série de poemas de Cristina.
Leia na íntegra:
Cena canibal
Um canibal come feijoada
dois canibais comem banana
tres canibais bebem caipirinha
Mitologia tupi
onde come um
comem dez
No caldeirão a farra
várias almas ainda vivas
dançam suas memórias
Cannibalistic atitude
I is the other
only interested in what is not mine
meaning tribal cannibal
eating the brains of Einstein
let the meat into pieces
the body is for the hungry
chew your thinking
cannibal web
verb cannibal
the memory of who I usually eat
Língua de Shakespeare
Comer a língua de Shakespeare
saborear
com a língua
Salgar e marinar
em vinha d'alhos
Nascida de um latim portuário
tenho meu direito:
comê-la
falantes nativos
canibais
comem-na
Ao som da fonética germânica
na raiz do canto
devoro-a
O maior poeta na língua
tem língua gostosa.
Manifesto Lusófono
A volta afetiva ao idioma
geografia lusófona
a flôr do Lácio
Camões no twitter
Museu da língua
São Paulo/Maputo/Lisboa
um trem luso percorrendo o idioma
Lobo Antunes e seu substantivo abstrato: Portugal
idioma materno
olhar sobre o mar
as caravelas fizeram inscrições na pele do mar
língua portuguesa nascida de um poema
juntos na memória lusa
mapa mundi da lusofonia
eu a ver caravelas
idioma esparramado.
Canto dionisíaco
Sátiros perfilados num dia
sem sol
embriagam-se de formas
um mar heróico
a afundar
certezas
sombras azuladas nos chifres
Baco a rimar o vinho
derramado sobre a cena
Enquanto caminhar de mãos dadas
bela e caótica
direi sim a vida.
Pesca seca
Silêncio na aldeia
janela de sal
Barcos inscrevem morte
na pele do mar
Velhos remos
sem norte
jogados a beira do poema
Casca seca
pesca seca
na inveja do mar.
Estirpe de Oswald
Sou uma antropófaga
da estirpe de Oswald
portanto canibal
devorando sempre
minha própria fome.