Gardel permanece símbolo do tango e da Argentina 

Há 80 anos, Carlos Gardel, o mais argentino dos uruguaios – ou seria dos franceses? – , morria na Colômbia, vítima de um acidente aéreo. O desfecho trágico ajudou a elevar o célebre cantor de tango à categoria de mito popular. Não fosse por uma crítica ranzinza do escritor Jorge Luís Borges, Gardel seria provavelmente uma unanimidade entre os portenhos. Ajudou a retirar o tango das margens e a lançá-lo no mundo, tornando-o representante maior da identidade nacional do país.

Carlos Gardel

Gardel nasceu em 11 de dezembro de 1890. Sua origem, contudo, é tema envolto em brumas. Alguns atestam que ele veio de Toulouse, na França; outros, que era natural de Tacuarembó, no Uruguai. 

Como uma forma de preservar a sua aura de personagem argentino, acariciando o imaginário popular, o cantor costumava dizer que sua pátria era o tango. Ou, às vezes, soltava: “Nasci em Buenos Aires, aos dois anos e meio”, idade com que chegou com a mãe à capital argentina.

Começou sua carreira cedo, cantando em cafés e cabarés de bairros pobres do subúrbio portenho. Aos 17 anos, fez sua estreia formal no Teatro Nacional, na Avenida Corrientes. O tango era então uma música quase que puramente instrumental e dançante, sem letra. Em 1917 surgiria a canção Mi noche triste, de autoria de Samuel Castriota e Pascual Contursi. Gardel a interpretou e foi convertendo-se, assim, no cantor maior de tango. Com uma trajetória ascendente, gravou mais 900 canções.

Quando morreu, estava no auge. Já era um dos artistas latino-americanos mais difundidos em todo o mundo. Celebrava uma Buenos Aires romântica, melancólica, boêmia. O músico chegava a afirmar que o tango argentino era um hino do subúrbio – representação oficial do país, oriunda das camadas populares.

Gardel foi não só intérprete, mas também compositor e ator de incontáveis canções e musicais, comédias e dramas. Aliás, deve ao cinema parte de sua fama. Elegante, com um certo ar de galã, foi contratado pela Paramount. Estrelou o primeiro filme falado da América do Sul – Encuadre de Canciones – e mais uma dezena de outras produções.
Passados 80 anos de sua morte, Gardel continua sinônimo de tango – e de Argentina. Em tempos de tango eletrônico, sua influência se estende não só ao ritmo que ajudou a popularizar (“el pensamiento triste que se baila”) e que foi se transformando com o tempo, mas a outros gêneros populares, como o rock rio-platense. 

Sobre o tango

Embora sua origem não seja muito certa, o tango descenderia da habanera e das polcas. Era interpretado nos prostíbulos de Buenos Aires e Montevidéu, nas duas últimas décadas do século XIX. Nessa época, era dançado por dois homens. Só nos anos 1910 teria sido aceito pela aristocracia platina.

O bandoneón, que atualmente caracteriza o tango, chegou à região do Rio da Prata por volta do ano 1900, nas maletas de imigrantes alemães. Não existem muitas partituras da época, pois os músicos de tango não sabiam escrever a música e, provavelmente, a interpretavam sobre a base de melodias já existentes, tanto de habaneras como de polcas.

Cambalache

Um tango clássico, Cambalache foi composto em 1934 por Enrique Santos Discépolo para o filme A alma do bandoneon, durante a chamada Década Infame. Com sua crítica ácida da corrupção e dos hábitos políticos dominantes, foi proibida em 1943 pelo governo militar, sob a acusação de imoralidade e negativismo. A proibição foi levantada em 1949, durante o primeiro governo de Juan Domingos Perón. Confira algumas versões:

RAUL SEIXAS

CAETANO