Petrobras e grevistas entrarão em negociação nesta segunda-feira
A Petrobras encaminhou à Federação Única dos Petroleiros (FUP) um documento, agendando uma proposta de negociação, que ocorrerá na próxima segunda-feira (9), durante a manhã. A federação afirma que a força da greve dos petroleiros levou a Petrobrás a reconhecer pela primeira vez a Pauta pelo Brasil.
Publicado 06/11/2015 13:46
Com uma greve que atinge de forma sensível a produção, os representantes dos petroleiros afirmam que a principal questão a ser debatida não é a corporativa, relativa à convenção coletiva, mas se refere ao futuro da Petrobras e seu modelo de gestão.
“O debate está sendo travado por uma nova direção e um Conselho de Administração muito atrelados ao mercado financeiro”, diz o diretor e ex-coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP) João Antônio de Moraes. Segundo ele, tratar do tema apenas sob o ponto de vista “financista” significa quebrar a empresa.
“Qual foi a nação que entrou em crise, seguiu o receituário neoliberal e melhorou?”, questiona o sindicalista, que participou na tarde desta quinta-feira (5) de uma entrevista coletiva no Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, na região central de São Paulo. “Se a Petrobras e o governo botarem pé fundo no que propõe o mercado, vai quebrar a Petrobras e vai quebrar o Brasil”, afirma, remetendo a questão às origens da companhia, que enfrentou resistência conservadora antes mesmo de surgir, em 1953. “Se a gente seguisse o mercado a Petrobras não teria sido criada.”
A resistência da FUP ao Plano de Negócios e Gestão da Petrobras, que prevê corte de investimentos e venda de participações e até mesmo de ativos, é criticada por analistas de mercado e por boa parte da imprensa especializada. Moraes busca evitar generalização, mas diz estranhar o comportamento quase “em bloco” da mídia em defesa de medidas “que já deram errado em outros países”.
Pauta
Segundo ele, o principal item da greve iniciada domingo (1º) nas bases dos sindicatos filiados à FUP é a chamada Pauta pelo Brasil, discutida desde a plenária nacional da categoria, em junho, em um contexto de ataques à Petrobras em várias frentes. “Nenhuma outra empresa ou instituição resistiria.” Para o dirigente, trata-se de uma tentativa de “recolocar a Petrobras no patamar em que estava em 2002, acanhada e sobretudo sendo preparada para a privatização”.
A partir de 2003, acrescenta, a política da companhia passou a ser mais voltada para “os interesses do país, ainda mais com a descoberta do pré-sal, uma das mais relevantes em todo o mundo nas últimas décadas. Isso só foi possível a partir da retomada dos investimentos”. Ele observa que uma descoberta costuma se tornar comercialmente significativa após 15 ou 20 anos, e com o pré-sal isso aconteceu em prazo muito menor, com aproximadamente seis.
“O pré-sal desperta cobiça no mundo. Você ter pré-sal sem Petrobras ou com a Petrobras pela metade é não ter pré-sal. Se você explorar o pré-sal pela lógica do mercado, não vai sobrar nada para a gente. Os empresários (brasileiros) também têm de travar esse debate.” Ele cita o Projeto de Lei do Senado (PLS) 131, de José Serra (PSDB-SP), que retira a obrigatoriedade de a estatal ser a única operadora. “Se não fosse pela atuação da FUP e dos movimentos sociais, esse projeto já teria passado. E seria uma tragédia. Tem mais projetos nessa linha.”
Moraes também lembra que não apenas a Petrobras enfrenta dificuldades. “Todas as grandes empresas (no mundo) ou tiveram prejuízo ou tiveram uma redução brutal de seus lucros”, diz Moraes, citando fatores como a queda de preço do petróleo e o câmbio. Mas o debate não pode se restringir aos aspectos econômicos e financeiros, insiste. “O Brasil não sai (da crise) sem discutir uma saída de nação para o petróleo e particularmente para a Petrobras.” Segundo a FUP, estimativas apontam uma redução de R$ 700 bilhões nos cinco próximos anos, entre desinvestimentos, redução de participações e venda de ativos.
Gargalo
O diretor da FUP defende a conclusão das obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) e da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, para garantir a sustentabilidade brasileira em derivados. O cenário próximo, diz, é de excedente de óleo cru com as atuais refinarias no gargalo. Aos defensores de maior presença privada, ele pergunta quantas refinarias as operadoras construíram no Brasil até 2002. Responde: “Nenhuma”. Da mesma forma, de 60 navios encomendados, nenhum é das dezenas de operadoras em atuação no país – 58 são da própria Petrobras.
Segundo Moraes, a agenda em implementação hoje é a dos perdedores, e o debate é para “recolocar a agenda que ganhou as eleições, inclusive no Congresso”. Por isso, ele espera outra postura da empresa e do governo, criticando a ação “truculenta” vista até aqui, que resultou inclusive em prisão de dirigentes.
Mesmo a greve, argumenta, foi uma reação a quatro meses de “portas fechadas” na Petrobras, que inclusive não mandou representante à audiência marcada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), no Rio de Janeiro, para discutir regras a serem seguidas pelas partes durante a paralisação. Isso, inclusive, causa preocupação – não no curto prazo – quanto ao abastecimento. “Temos compromisso com o abastecimento. Mas para exercitar esse compromisso é preciso dialogar com a Petrobras.”
A greve é feita em todas as bases sindicais dos petroleiros, sendo 12 ligadas à FUP e cinco à FNP. Embora com pontos em comum, as duas entidades não participam conjuntamente do movimento. A Petrobras apresentou uma proposta financeira, que corrige as tabelas salariais com índice (8,81%) abaixo da inflação e, segundo os sindicalistas, reduz direitos sociais da convenção coletiva. Já se fazem comparações com a paralisação de 1995, que também atingiu significativamente a produção e teve reação feroz do recém-instalado governo FHC. “A greve de 1995 tinha a lógica da resistência. Os tanques na refinaria tinham o objetivo de intimidar, mas não conseguiram. Foi a greve que arrancou o compromisso de não privatização da Petrobras.”
Moraes reafirma que a Operação Lava Jato deve resultar em punições a quem participou de atos de corrupção, mas isso não pode interferir nas atividades da empresa. “A todo brasileiro interessa que o que está errado seja apurado e os responsáveis sejam severamente punidos. A todos, mas sobretudo a nós, petroleiros. Quem comete crime é pessoa física, não jurídica.” Ele observa que a questão envolve uma companhia que responde por 13% do PIB brasileiro (ante 3% em 2002) e por 20% de todos os investimentos no país. “Não dá para aceitar a Petrobras sendo tratada como uma empresa qualquer.”
Quadro da greve
Nas bases da FUP todas as 11 refinarias estão em greve. Também estão paralizadas a SIX e Fafen-PR, assim como todos os terminais da Transpetro no Paraná, em Santa Catarina, no Rio Grande do Sul, na Bahia, no Espírito Santo, em Duque de Caxias, Amazonas, Ceará, Pernambuco, além de Guararema, Barueri, Guarulhos e São Caetano do Sul.
Na área de Exploração e Produção de petróleo, aderiram à greve 48 plataformas da Bacia de Campos, seis plataformas no Ceará, duas plataformas no Espírito Santo, além dos campos de produção terrestre na Bahia, Rio Grande do Norte e Espírito Santo.