Pela bala do latifúndio: Há 30 anos tombava o sindicalista João Canuto
Na luta pela reforma agrária, pela defesa e promoção dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, muitos trabalhadores/as e suas lideranças tombaram pela bala do latifúndio Brasil afora. A morte sistemática de dirigentes sindicais rurais, religiosos, advogados e militantes de partidos de esquerda colocam em evidência a impunidade no campo e requer resposta política das autoridades competentes.
Por Cleber Rezende*
Publicado 18/12/2015 11:23 | Editado 04/03/2020 16:53

Na atual quadra política brasileira avança a ofensiva conservadora para barrar as conquistas democráticas e sociais obtidas nos últimos anos, buscando romper com mandato da presidenta Dilma Rousseff, legitimamente eleita, utilizando de artifícios para subverter a vontade popular expressa no resultado das eleições/2014.
Colocando na ordem do dia a defesa da Constituição, do Estado democrático de direito, dos direitos da justiça social, tendo como base a dignidade da pessoa humana que se encontra ameaçada pela ofensiva conservadora contra as conquistas sociais e intentos de golpe de Estado.
É nesta singularidade política que a família Canuto, os movimentos sociais, sindicais, populares, religiosos, o Partido Comunista do Brasil e os munícipes romariense, neste 18 de dezembro de 2015, refletem os 30 anos sem a presença física do sindicalista João Canuto de Oliveira.
O município de Rio Maria no sul do estado do Pará, palco de muitas lutas camponesas, desmembrado de Conceição do Araguaia em 1982, ambiente em que os trabalhadores rurais deste município travaram uma luta pela emancipação sindical da categoria e pela fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) no município recém emancipado. Na época o STR de Conceição do Araguaia era presidido pelo médio proprietário rural conhecido como Bertoldo Lira nomeado pelo INCRA a serviço do regime militar e aliado do latifúndio. Segundo os trabalhadores rurais Bertoldo podia ser classificado como “pelego”, posto que, não defendia os interesses dos trabalhadores.
Em 1983 foi criada a delegacia sindical dos Trabalhadores Rurais de Rio Maria sendo eleito, provisoriamente, como presidente o trabalhador rural João Canuto de Oliveira. Após a conquista da independência do sindicato de Conceição do Araguaia, João Canuto foi eleito por seus pares como presidente do agora recém criado Sindicato. Canuto se torna uma das principais lideranças em defesa da reforma agrária, apoiando os camponeses em suas lutas pelo direito a posse da terra na região Sul do Pará.
O latifúndio, principalmente, aqueles que tinham grilado terras do estado ou ocupado indevidamente, eram ligados a União Ruralista Democrática (UDR) e incomodados com os avanços das ocupações de terras por parte dos trabalhadores rurais, definem e implementa o plano de eliminação física de João Canuto.
Em 18 de dezembro de 1985 tomba o sindicalista João Canuto de Oliveira presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Rio Maria-Pará com 12 tiros certeiros de pistoleiros a mando do latifúndio. De acordo com inquérito policial entre os acusados de serem mandantes estavam o prefeito de Rio Maria, a época (1985), o fazendeiro Adilson Carvalho Laranjeira e o fazendeiro Vantuir Gonçalves de Paula. Vale ressaltar que estes foram os dois conduzidos ao Tribunal do Júri, no entanto o assassinato foi planejado por um numero de aproximadamente 20 pessoas, incluindo políticos, fazendeiros e empresários.
João Canuto além de sindicalista era militante ativo do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) defensor da reforma agrária, da justiça social no campo e na cidade e do socialismo, tendo concorrido à prefeitura municipal de Rio Maria em 1982 pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) na corrente progressista onde se aglutinava os militantes de esquerda, perdendo a eleição para Laranjeira por meio da “fraude incontestável” no referido processo eleitoral em favor do representante das elites latifundiárias.
O assassinato de João Canuto representou mais do que a eliminação de um líder sindical, perde-se uma grande liderança política e ativista comunista da classe trabalhadora rural da região sul do Pará e do Brasil. Morreu João Canuto, mas não suas idéias e a luta pela reforma agrária e pela apuração e condenação dos pistoleiros e mandantes de seu assassinato, sendo uma luta que mobilizou diversas entidades de direitos humanos nacionais e internacionais inclusive a OEA. No entanto, a morosidade da justiça paraense, principalmente, no que diz respeito às investigações do caso leva-nos a duvidar da imparcialidade destes agentes. Além do mais, assassinatos de sindicalistas tornou-se corriqueiro no município de Rio Maria.
Expedito Ribeiro de Souza, sucessor de João Canuto na presidência do Sindicato, dá continuidade à luta camponesa pela reforma agrária. No entanto, a impunidade impera e os assassinatos contra as lideranças sindicais dos trabalhadores rurais continuam. Em 02 de fevereiro de 1991, Expedito Ribeiro é assassinado a mando do fazendeiro Jerônimo Alves de Amorim. Amorim vai a julgamento após anos de lutas do STR de Rio Maria, do Comitê Rio Maria e da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Portando cabe exigir dos governos estadual e federal a implementação de um Novo Projeto de Desenvolvimento Nacional e uma atuação contundente no combate aos assassinatos no campo, a grilagem de terras, ao trabalho escravo, pelo fim da impunidade e pela implementação efetiva das reformas estruturantes do país, como a reforma agrária para a promoção da justiça social no campo e por um país soberano, democrático, desenvolvido e socialmente mais justo.
João Canuto, presente!
Belém-Pará, 15 de dezembro de 2015.
Citações:
¹Adilson Carvalho Laranjeira morreu de morte natural em 2007 em Goiânia-Goiás.
²AFONSO, José Batista Gonçalves, Advogado e Coordenador Nacional da CPT. Violência e Impunidade: Realidade Permanente no Pará. Disponível em