Na contramão, Banco Central sinaliza nova alta de juros

O Banco Central enviou mais um sinal de que deve retomar a trajetória ascendente da já exorbitante taxa básica de juros, a Selic. Em relatório de inflação divulgado nesta quarta (23), a autoridade monetária afirma que o aumento nas projeções de inflação é um “claro e importante sinal” que demanda monitoramento. Os juros altos são apontados por vários economistas como um entrave ao crescimento, um estímulo ao rentismo e um fator que atrapalha o equilíbrio do governo, pois eleva a dívida pública.

Na contramão do que pedem trabalhadores, empresários e economistas e movimentos sociais preocupados com o crescimento do país, o BC destaca no relatório que conduzirá uma política monetária “especialmente vigilante”, o que fortalece a possibilidade de novo aumento de juros já na próxima reunião do Copom, em janeiro. O BC “adotará as medidas necessárias para garantir” que a inflação caia para 4,5% em 2017, diz o relatório.

“As expectativas referentes a 2016 têm-se elevado desde agosto, invertendo a trajetória declinante até então. Esse movimento ascendente nas expectativas – que ocorreu em conjunto com o aumento das incertezas relacionadas aos resultados fiscais – também é observado, apesar de que em menor medida, nas projeções de mercado para 2017 e 2018”, diz o BC, no relatório.

O Banco Central tem dito que as sucessivas altas na Selic são necessárias para conter os preços no país. Ocorre que, claramente, este não tem sido um remédio eficaz. O economista da Unicamp Márcio Pochmann é apenas uma das vozes que tem criticado tal política monetária. Para isso, ele destaca o que fica óbvio ao analisar os números.

“Estamos há 30 meses com a taxa de juros em trajetória crescente. A Selic saiu de 7,5% para 14,25%. Nesse período, tivemos uma inflação que saiu de 6,5% para 9,7%. Significa dizer que a elevação da taxa de juros não tem produzido resultados efetivos acerca do comportamento da inflação”, constatou o professor, em entrevista ao Vermelho, ainda em outubro.

O Comitê de Política Monetária (Copom), responsável por definir a Selic, elevou a taxa por sete vezes consecutivas. Nas reuniões do comitê em setembro, outubro e novembro, optou por manter a Selic em 14,25% ao ano, que já é o maior patamar em nove anos. No último encontro, contudo, já haviam sido dados sinais de que, em janeiro, a elevação poderia seguir, já que a decisão de manter a Selic em 14,25% não foi unânime. Dois membros defenderam elevação de 0,50 ponto percentual.

Além disso,  o Copom retirou do comunicado da última reunião a avaliação – divulgada em outubro – de que a manutenção dos juros no patamar atual por um “período suficientemente prolongado” seria necessária para a “convergência da inflação para a meta no horizonte relevante da política monetária”.

Nesta quarta, o Bacen afirma que espera que a inflação, medida pelo IPCA, este ano vai chegar a dois dígitos e passar longe do teto da meta de 6,5%. A projeção do Banco Central (BC) é que a inflação feche este ano em 10,8%. Para 2016, a estimativa para o IPCA subiu de 5,3% para 6,2%. Em 2017, a inflação deve ficar em 4,8%.

Segundo o BC, a inflação está alta devido ao realinhamento entre preços administrados e livres e entre domésticos e internacionais. Também há influência das “incertezas quanto à velocidade do processo de recuperação dos resultados fiscais e à sua composição”.

Para o BC, quanto mais rápida for retomada a trajetória favorável para a dívida pública, melhor será para a confiança de famílias e empresas. Especificamente sobre o combate à inflação, diz o BC, o “desenho de política fiscal consistente e sustentável” permite que as ações de política monetária (definições da Selic) sejam plenamente transmitidas aos preços.

A declaração pode soar contraditória. Justamente porque economistas destacam a falta de sintonia entre a política monetária e as ações do governo no sentido de equilibrar as contas públicas. Para muitos analistas, a Selic alta não tem ajudado a controlar preços, pois a inflação brasileira atual não resultaria da ampliação do consumo, o que exigiria, portanto, uma taxa de juros maior para cortar a demanda e, com isso, evitar que os preços subam. O aumento de preços no país, apontam estudiosos, seria uma inflação de custos.

E, para piorar, as altas da Selic ainda teriam agido na contramão do ajuste fiscal, porque a taxa de juros, nesse patamar, impõe um aumento de gastos financeiros para pagar os juros da dívida, que só crescem. 

Em entrevista ao Vermelho, o presidente nacional da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adílson Araújo, já havia analisado que aumentar ainda mais uma taxa de juros que já é mais alta do mundo não faz nenhum sentido. “Isso contraria a lógica, por que os sinais são de retração. A indústria está em queda, perto de índices que se aproximam dos verificados na década de 1940. A indústria já teve participação no PIB da ordem de 30%. Agora caminha para cair aos 10%”, lamentou. 

De acordo com ele, só quem se beneficia com uma Selic tão elevada são os banqueiros. Os trabalhadores pagam com desemprego e a indústria nacional sofre, perdendo competitividade. Para o sindicalista, a política monetária em curso ainda por cima contraria a expectativa de uma agenda de crescimento sustentado.