Opinião: "OAB não possui legitimidade para impeachment"

 Por *Cynara Monteiro Mariano e **Felipe Braga Albuquerque

Chico Lopes: Ação da OAB não reflete opinião de todos os advogados - Agência Câmara

O pedido de impedimento da presidente Dilma Rousseff, realizado pelo Conselho Federal da OAB, no dia 18 de março, é ilegítimo porque infringe a Lei Federal nº 8.906/94 e a própria Lei do Impeachment (Lei nº 1.079/50). A OAB não tem como função institucional propor a abertura desse processo, pois lhe falece a necessária legitimidade, que somente é conferida ao cidadão.

Representantes da Ordem não podem, nessa condição, subscrever o pedido de impeachment. Podem fazê-lo livremente, na qualidade de cidadãos e de advogados, representando apenas a si mesmos.

A reação dos advogados fez-se, por consequência, fato público e notório, também na discordância acerca da existência de crime de responsabilidade, como diante do atropelo no processo de consulta às Seccionais. Uma decisão importante, que se acosta a uma eventual ruptura institucional, deveria ter sido submetida à uma ampla consulta à categoria, e não ser tomada no afã de conferir resposta às vozes críticas da atual gestão do governo federal.

Parece ter sido esse o móvel da decisão da OAB. O presidente Claudio Lamachia conclamou a deliberação nas Seccionais em 24 horas, desprezando a voz uníssona dos juristas brasileiros que afasta a tese da existência de crime de responsabilidade. Desprezou também a conclusão anterior de Comissão Especial da própria entidade, que em 2015 já havia afastado a existência de elementos de responsabilização da presidente da República.

Concorde-se ou não com a condução da gestão do atual governo federal, o certo é que uma instituição de conhecida e acreditada reputação na sociedade brasileira (e por isso mesmo capaz de influenciar sua opinião), não pode desprezar o devido processo legal (inclusive o interno), muito menos tomar decisões ao sabor das paixões político-partidárias. Afinal, trata-se de uma entidade de classe de natureza política, mas eminentemente técnica, comprometida com processos tradicionais de racionalidade e maturidade nas reflexões jurídicas.

A OAB deve guardar fidelidade a essa serena reflexão também em respeito aos seus membros, pois tanto por disposição estatutária quanto por mandamento constitucional, reserva-se ao advogado o papel singular de defensor primário e histórico do Estado Democrático de Direito.

Lamentamos, assim, a decisão antidemocrática e imatura da atual gestão do Conselho Federal e dos Conselhos Seccionais. É bom lembrar que o papel na defesa da ordem democrática que a entidade possui é consequência lógica da dignidade constitucional e legal do advogado como elemento indispensável à administração da justiça. E não o contrário.

OAB não possui legitimidade para o impeachment

*Cynara Monteiro Mariano é Professora adjunta da UFC, vice-presidente do Instituto Latino Americano de Estudos sobre Direito, Política e Democracia (ILAEDPD) e coordenadora do Coletivo Juristas pela Legalidade e pela Democracia

**Felipe Braga Albuquerque é Professor adjunto da UFC e secretário-geral do ILAEDPD


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