Dallari e Serrano: Parecer do impeachment não tem fundamento jurídico

Em entrevista ao Portal Vermelho, dois importantes juristas brasileiros, Dalmo Dallari e Pedro Serrano, avaliaram que o parecer favorável ao impeachment da presidenta Dilma Rousseff apresentado pelo deputado Jovair Arantes (PTB-GO), nesta quarta-feira (6), é “parcial” e “desprovido de fundamento jurídico” e “inconstitucional”.

Por Dayane Santos

Dallari e Serrano

“É uma acusação essencialmente e exclusivamente política. Sem nenhum embasamento jurídico. Na verdade, não acrescenta nada de novo e apenas um assunto para discurso, exibicionismo, ameaças, mas sem consistência jurídica”, afirmou o jurista e professor emérito da Universidade de São Paulo (USP), Dalmo Dallari.

Segundo ele, o parecer tem “uma argumentação vaga, esparsa que não chega a uma fundamentação jurídica”, o que é essencial para fundamento um pedido de impeachment. “Demostra que o autor do parecer de impedimento não tem consciência da sua responsabilidade perante o país”, enfatizou.

Para Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a argumentação do relator Jovair de que houve crime de reponsabilidade não é sólido e se revelou uma distorção grosseira da interpretação da lei para atender os interesses políticos partidários. Ele disse ainda que a lei tem um sentindo e não muda de acordo com quem a interpreta.

“Não houve ilegalidade e se houve ela não é grave o suficiente para poder caracterizar um crime de responsabilidade. A Constituição diz que tem de haver um atentado à Constituição e a lei, ou seja, não basta ser uma ilegalidade ou inconstitucionalidade comum porque se assim fosse qualquer ato ou decreto do Executivo que fosse considerado pelo STF como inconstitucional levaria ao impeachment do presidente. Não pode ser assim”, sublinhou.

Serrano também rebateu o argumento das chamadas “pedaladas fiscais”. O relator endossou a tese de que os atrasos foram empréstimos. Didático, o professor da PUC destacou que a acusação de que o governo contraiu um empréstimo ao atrasar o pagamento aos bancos públicos não se configura, pois existe uma diferença entre atraso de pagamento e empréstimo.

“Quando eu atraso o pagamento de uma conta de luz, a empresa fornecedora de energia não está me fazendo um empréstimo. Ela tem um direito de crédito que eu terei que pagar”, salientou.

O professor lembrou ainda que, o argumento sobre os decretos crédito suplementar são condutas recorrentes da administração pública. “Não é ilegal nem inconstitucionais. E se fossem não teriam a gravidade suficiente para caracterizar crime de responsabilidade. Nem de longe são um atentado à Constituição”, disse.

E acrescenta: "A própria lei de responsabilidade fiscal determina que se priorize o atendimento às desigualdades sociais…Se fosse ainda, o governador Alckmin, que praticou mais decretos de suplementação de crédito do que a presidenta Dilma, seria acusado por crime de responsabilidade. No entanto, ninguém pede o impeachment dele".

Serrano reforça que os atrasos não representaram um benefício pessoal para a presidenta Dilma, ou seja, nenhum benefício pessoal e nem se cogita isso nas acusações, nem de terceiro e nem um benefício indevido.

“As chamadas pedaladas fiscais foram usadas para cumprir responsabilidade públicas que, segunda a lei e a Constituição, devem ser priorizadas, pois se trata de responsabilidades sociais. Não se interpreta a Constituição pela lei, mas sim a lei pela Constituição”, ressaltou o jurista, referindo-se a tentativa da oposição de estabelecer o crime com base na lei de responsabilidade fiscal, mas violando preceitos constitucionais.

E acrescenta: “Veja que muitas vezes o governo depositou a mais e isso eles não falam. No fim do ano o que o governo recebeu de juros foi superior ao que pagou de juros. Eles falam em rombo, mas não houve. O governo mais recebeu do que pagou”, assegurou Serrano.

Dallari também reforça que tais manobras revelam uma “atuação maliciosa e essencialmente inconstitucional” que acaba gerando demando junto ao Supremo Tribunal Federal.

“Criam situações de conflito que forçam o Supremo Tribunal Federal a tomar decisões que tem cunho político-jurídico, e isso é péssimo, porque muita gente que não tem conhecimento ou influenciado por fatores políticos, acabam culpando injustamente os juízes do Supremo. Eles estão guardando a Constituição, cumprindo, portanto, o seu dever constitucional primordial”, declarou Dallari, rebatendo tese da oposição e da grande mídia de que o STF estaria cometendo ingerência entre os poderes ao determinar o cumprimento da Constituição.