Golpe é para entregar o pré-sal, confirma declaração de Padilha

O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, confirmou o que já era esperado, dada a natureza do golpe em curso: o governo Michel Temer apoiará o projeto aprovado no Senado que flexibiliza a exigência de ter a Petrobras como operadora única e obrigatória do pré-sal. Em entrevista ao Valor Econômico, ele afirma que a atividade deve ser partilhada com a iniciativa privada. 

Petrobras

"O momento exige do governo a máxima sensibilidade para trazer de volta e estimular as parcerias com o setor privado. Nesse caso [do pré-sal], a atividade pode perfeitamente ser partilhada com o setor privado, sem excluir a preferência da Petrobras", afirma.

O projeto em questão, que foi aprovado no Senado, é um substitutivo do senador e ministro do Planejamento – agora licenciado – Romero Jucá (PMDB-RR)  ao Projeto de Lei 131/2015, de autoria do senador e agora chanaceler José Serra (PSDB-SP) 

Padilha reiterou o discurso de outros integrantes do governo, que aposta suas fichas na iniciativa privada. Em resumo, a ideia é entregar o patrimônio público e serviços de responsabilidade do Estado à lógica do mercado. 

"Tudo aquilo que pudermos fazer em parceria com o setor privado, vamos fazer rapidamente. Em algumas áreas, o aperfeiçoamento institucional deverá ser bastante pequeno, porque as exigências são pequenas. Em outras, será um pouco maior e demora mais tempo. Mas o governo quer rapidez e precisamos dar uma resposta rápida. O governo pode ser indutor, mas não tem recursos para investir. Então tem que induzir o setor privado a ser parceiro para que possamos gerar emprego e renda", declara Padilha. 

Na entrevista, ele indica ainda que, apesar da queda no preço internacional do barril de petróleo, não haverá redução do preço da gasolina: "Se a Petrobras está em situação delicadíssima […], seria irresponsabilidade".

Com o início do governo marcado por declarações desencontradas e ida e vindas em várias áreas, o chefe da Casa Civil falou sobre as sinalizações de ministros a respeito de cortes nos programas sociais. "Com medo de novos pronunciamentos "imprecisos", os ministros deverão agora "tirar dúvidas" com a Secretaria de Imprensa. Ao que parece, a comunicação deverá arranjar um jeito mais palatável de anunciar as medidas impopulares do governo.

"Para ser preciso, foram quatro declarações não traduzidas conforme o sentimento dos ministros. Eles pretendiam dizer uma coisa e acabaram sendo compreendidos de outra forma. Eu recebi a delegação do presidente de entrar em contato com eles e pedir que temas passíveis de dúvidas sejam discutidos previamente com a nossa Secretaria de Imprensa", disse o ministro.

Pelo visto, o jogo de palavras começa a ser praticado pelo próprio Padilha: "Muitos programas serão suspensos, é óbvio, se temos todo esse deficit. Mas não revogados", disse, referindo-se à revisão da meta fiscal anunciada na última sexta.

Crítico dos deficit apresentados durante o mandato da presidenta eleita Dilma Rousseff, o atual governo enviará nesta segunda ao Congresso proposta que prevê um déficit (despesas maiores do que receitas) de R$ 170,5 bilhões – que, se confirmado, será o maior da história. O governo tem tentado justificar a proposta e também o anúncio de cortes e "suspensões" impopulares apelando para o discurso da "herança maldita".

"O governo vem gastando mais do que recebe há vários anos. Agora chegamos a números que são o retrato de uma construção de três anos. Temos que dar um basta nisso e fazer ajustes, o que implica cortes", afirmou na entrevista Padilha, reforçando a estratégia. 

Pré-sal: Comissão defende exclusividade

Diferente do que acha o governo ilegítimo de Michel Temer, no início do mês, participantes de audiência pública da comissão especial da Petrobras e exploração do pré-sal defenderam a manutenção da estatal como operadora única dos campos do pré-sal como forma de garantir empregos no País.

Para o diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes, não é possível garantir que, com a abertura do pré-sal, as empresas privadas ou estatais internacionais façam aportes de investimento no Brasil.

“As petrolíferas optam em pagar multa e gerar empregos em seus países a não pagar multa e gerar empregos no nosso país. O conteúdo local não funciona com essas empresas; é preciso ter a Petrobras como ator nessa indústria de ampliação do parque tecnológico”, afirmou Moraes.

Moraes destacou ainda que todas as grandes petrolíferas do mundo estão em crise e que a Petrobras tem capital humano e tecnológico capaz de superar o momento difícil que atravessa.

“Somos achincalhados a serviço de interesses externos. Porque é importante e imprescindível? A Petrobras é a empresa com maior experiência no mundo em águas profundas? Assumiu o risco a partir do desenvolvimento tecnológico e do conhecimento geológico das bacias de Santos e Campos. É a eficiência comprovada pelos altíssimos índices de sucesso exploratório e pela alta produtividade”, afirmou.

O vice-presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), Sérgio Bacci, afirmou, no mesmo evento, que, em razão da baixa capacidade de investimento da Petrobras, ela tem preferido fretar embarcações estrangeiras a construir no Brasil, porque dizem que seria mais caro e mais oneroso para a estatal. “Vamos analisar o conjunto da obra: o barco é mais caro, mas gera emprego no Brasil, gera emprego na cadeia produtiva, gera imposto das empresas que operam as embarcações”, afirmou.

Segundo Bacci, a Petrobras deveria induzir a demanda de forma a fortalecer a indústria naval. “é necessário ter barreiras para que a indústria se fortaleça mais, pois se isso não acontecer, chegaremos em breve aos mesmos 1800 empregos que tínhamos no ano 2000”. De acordo com o vice-presidente do Sinaval, em 2000, havia apenas 1800 empregos no setor, chegou a 84 mil em 2014 e a previsão é de que chegue ao final deste ano com apenas 35 mil empregos na indústria naval.

“A indústria naval do mundo [Coréia, Japão, China, Noruega, EUA] deu certo porque ou tinha uma demanda induzida por parte do governo [no caso da China] ou incentivos de ordem fiscal ou de subsídios para que a indústria possa andar [no caso dos EUA]. Tanto os EUA quanto a China usam a mesma forma de fomentar a indústria naval. O caminho da Petrobras estava correto, porque induzia a demanda, por conta da Transpetro e da Sete Brasil”, reforçou.

O deputado Davidson Magalhães (PCdoB-BA), que propôs o debate, afirmou que todos os países que estatizaram e controlaram as reservas o fizeram em razão de uma política nacional de desenvolvimento. “Todos os países que produzem petróleo utilizam a partilha ou a contratação de serviço. As petroleiras estatais são as que controlam as principais reservas e isso é estratégico. E não podemos, em função de um momento de dificuldade de caixa, abrir mão de um desenvolvimento estratégico da indústria de petróleo e gás no Brasil”, afirmou o parlamentar, naquele momento.