Penélope Toledo: Minha Seleção é o meu clube
A goleada da Seleção canarinha sobre a arquirrival Argentina impactou mais os argentinos, do que os brasileiros. Isto porque os hermanos têm uma relação mais afetiva com o seu escrete. Na Copa, aliás, chamou a atenção: eles torcem pela sua seleção como se fosse um clube!
Por Penélope Toledo*
Publicado 14/11/2016 21:24
Lembro-me que quando era criança e fiquei acordada até tarde para ver o jogo do Brasil, mas só vi até o Neto ser substituído. Depois, fui dormir. Sem o jogador do meu time, a partida não me interessava. Eu nem sabia, mas estava me somando à legião dos torcedores que torcem pelo seu clube, não pela Seleção.
Clube: o primeiro amor
É compreensível, pois a relação com o clube é cotidiana, enquanto a Seleção a gente vê em intervalos espaçados de tempo. Do clube a gente sabe de cor a escalação, usa a camisa do mesmo jogador a temporada inteira, vibra e sofre duas vezes por semana, tem notícias diárias na mídia. Ou seja, o clube é parte da nossa vida.
Assim, torcer para mais alguém soa como uma traição. “Só visto a camisa do meu time”, dizem alguns torcedores. É um pacto de fidelidade.
Sem falar na indignação de ter jogador convocado às vésperas de partidas importantes e/ou de momentos decisivos do campeonato. Nas 9ª e 10ª rodadas das Eliminatórias, quatro clubes que disputavam o título ou vaga na Libertadores foram desfalcados. Agora, na 11ª, Tite tomou cuidado.
Identificação com a Seleção
Dicotomicamente, ter poucos jogadores que atuam no país torna mais difícil a identificação com a Seleção. Do time que bateu os argentinos, eram 18 “estrangeiros”. Na Copa, foram 19 e só 4 “brasileiros”, sendo um, o Fred, que fez carreira fora do país.
Em 2014, Pelé sugeriu que o Corinthians servisse como base da Seleção Brasileira, devido ao entrosamento. Gerou polêmica. Mas isto já aconteceu. A Sele-Inter, com 11 titulares do Internacional convocados, trouxe a prata nas Olimpíadas de Los Angeles, em 1984. Botafogo e São Paulo também já formaram a base.
Também já houve momentos em que clubes representaram o país. O primeiro foi o Palmeiras, que vestiu a “Amarelinha” e goleou o Uruguai na inauguração do Mineirão, em 1965. Corinthians (1965) e Atlético-MG (1968) são outros que já foram o Brasil.
Seleção x Brasil
Paixão ao clube e excesso de estrangeiros os argentinos também têm, portanto, não é só isto. Falta a associação entre as simbologias e o país. Durante a execução do hino nacional nos campeonatos estaduais, os torcedores entoam o hino de seu clube em um claro recado de que é ali que se sentem de fato brasileiros.
Ninguém pode acusar o nosso povo de não ser patriota. Após o golpe, está claro que muitos brasileiros estão dispostos a lutar pelo Brasil com a mesma paixão com que defendem seus clubes. Mas também está claro que não é pelo Brasil da CBF, impopular, sobretudo quando a camisa verde-e-amarela se torna símbolo de quem está contra o povo.
Não é que a gente torça contra a Seleção brasileira. É só que ela não desperta a nossa brasilidade, que por sinal, é forte e genuína.