PEC de Temer viola os direitos humanos, afirma relator da ONU
A Organização das Nações Unidas considera que a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 55, enviada pelo governo de Michel Temer ao Congresso Nacional que propõe congelar por 20 anos os investimentos públicos, é uma violação aos direitos humanos.
Publicado 09/12/2016 12:05
De acordo com o relator especial da ONU para extrema pobreza e direitos humanos, Philip Alson, a proposta do governo Temer é inteiramente incompatível com as obrigações de direitos humanos do Brasil.
“Se adotada, essa emenda bloqueará gastos em níveis inadequados e rapidamente decrescentes na saúde, educação e segurança social, portanto, colocando toda uma geração futura em risco de receber uma proteção social muito abaixo dos níveis atuais”, afirma Alson, reforçando que os prejudicados com a medida serão os mais pobres.
A PEC 55 está em tramitação no Senado e já foi aprovada em primeiro turno pelo plenário e deverá ser votada em segundo turno no dia 13 de dezembro, de acordo com a programação do presidente Renan Calheiros (PMDB-AL).
O relator da ONU recomendou ao governo brasileiro que garanta um debate público apropriado sobre a PEC 55, por se tratar de medida que tem impacto aos mais pobres. Segundo ele, “é completamente inapropriado congelar somente o gasto social e atar as mãos de todos os próximos governos por outras duas décadas”.
E completa: “Se essa emenda for adotada, colocará o Brasil em uma categoria única em matéria de retrocesso social”.
Reforçando que a proposta representa um retrocesso e não uma alternativa de saída para a crise econômica, o relator da ONU disse que, nas ultimas décadas, o Brasil estabeleceu um impressionante sistema de proteção social voltado para erradicar a pobreza e o reconhecimento dos direitos à educação, saúde, trabalho e segurança social.
“Essas políticas contribuíram substancialmente para reduzir os níveis de pobreza e desigualdade no país. Seria um erro histórico atrasar o relógio nesse momento,” disse ele.
Depois de chegar ao poder por meio de um golpe parlamentar, afastando uma presidenta legitimamente eleita, Michel Temer tenta impor uma mudança na Constituição que vai engessar o orçamento público por 20 anos, ou seja, para os próximos quatro presidentes.
A justificativa do governo é que tal medida irá aumentar a confiança de investidores, reduzindo a dívida pública e a taxa de juros, e que isso, consequentemente, ajudará a tirar o país da recessão. Para o relator especial da ONU, essa medida terá um impacto severo sobre os mais pobres.
“Essa é uma medida radical, desprovida de toda nuance e compaixão”, disse ele. “Vai atingir com mais força os brasileiros mais pobres e mais vulneráveis, aumentando os níveis de desigualdade em uma sociedade já extremamente desigual e, definitivamente, assinala que para o Brasil os direitos sociais terão muito baixa prioridade nos próximos 20 anos.”
Ele acrescentou: “Isso evidentemente viola as obrigações do Brasil de acordo com o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais que o pais ratificou em 1992, que veda a adoção de ‘medidas deliberadamente regressivas’ a não ser que não exista nenhuma outra alternativa e que uma profunda consideração seja dada de modo a garantir que as medidas adotadas sejam necessárias e proporcionais”.
Educação
O Plano Nacional de Educação no Brasil clama pelo aumento de R$ 37 bilhões anualmente para prover uma educação de qualidade para todos os estudantes, enquanto a PEC reduzirá o gasto planejado em R$ 47 bilhões nos próximos oito anos. Com mais de 3,8 milhões de crianças fora da escola, o Brasil não pode ignorar o direito deles de ir à escola, nem os direitos de todas as crianças a uma educação de qualidade.
“Efeitos diretamente negativos têm que ser equilibrados com potenciais ganhos a longo prazo, assim como esforços para proteger os mais vulneráveis e os mais pobres na sociedade”, disse ele.
“Estudos econômicos internacionais, incluindo pesquisas do Fundo Monetário Internacional, mostram que a consolidação fiscal tipicamente tem efeitos de curto prazo, reduzindo a renda, aumentando o desemprego e a desigualdade de renda. E a longo prazo, não existe evidência empírica que sugira que essas medidas alcançarão os objetivos sugeridos pelo governo,” salientou.