Ocidente incita histeria belicista contra Moscou

Nunca pensei que tal coisa acontecesse: a imprensa ocidental, quase unânime, exigindo guerra contra a Rússia. Como podem seres humanos, em troca de empregos, pedir guerra? Não sabem o que é guerra?

Por Nilson Lage*

John Kerry e Serguei Lavrov

O argumento é exótico.

Os serviços secretos americanos alegam, e não comprovam, que os russos (a) rackearam informações de e sobre Hillary Clinton “para beneficiar Donald Trump” e (b) promoveram uma campanha de propagada, usando, principalmente, a rede de televisão e agência de notícias Russia Today (RT).

Os serviços secretos americanos têm passado comprovado de mentiras de consequências trágicas, das quais a mais notória é a das inexistentes “armas de destruição em massa” de Saddam Hussein: levou à invasão do Iraque, que arrasou o país e causou centenas de milhares de mortes.

O Presidente Obama coonestou a denúncia, mas é obviamente parte interessada e, pessoalmente, tem antecedentes de aventuras militares e intervenções desastrosas no estrangeiro.

Admitamos, porém, ad absurdum, que, dessa vez, os tais serviços secretos dizem a verdade. Ainda assim, espionar o país dos outros é esporte praticado há milênios por todos os chefes de tribos e governos e os americanos se esmeram nisso, como todos sabem.

Resta o “interferir nas eleições”. É improvável que os russos tenham como fazê-lo e, se tiveram em porção mínima, aprenderam com os americanos, que também lhes ensinaram a fazer propaganda usando discursos objetivos, coisa que a RT faz direitinho e os chineses da Xinhua tentam aprender.

A técnica consiste em apoiar afirmações sempre em fatos verdadeiros e comprováveis, admitindo, como “outro lado”, fatos verdadeiros e comprováveis em contrário; limitar a interpretação ao objeto da reportagem, artigo, feature ou documentário, em linguagem corrente e, tanto quanto possível, aparentemente neutra – isto é, sem conotações perceptíveis que exaltem ou depreciem.

Foi coisa que os americanos inventaram no começo do Século 20 e os ingleses adaptaram brilhantemente, lustrando a aparência de isenção. Ajudou-os muito na briga retórica com a União Soviética, que jamais abandonou o estilo palavroso e o discurso universalizante dos clérigos e dos ideólogos.

Os americanos desaprenderam. Por isso terminam propondo, explícita e deslavadamente, a guerra que, pela primeira vez na História, pode desabar com armas atômicas sobre suas cabeças.

Tudo para agradar ensandecidos banqueiros!

*Jornalista e professor universitário (UFRJ e UFSC). Doutor em Linguística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.