Mulheres presas sofrem com abandono e precariedade nos presídios

Em 2015 foram publicados os primeiros dados sobre as condições das mulheres nos presídios brasileiros. Das cerca de 579 mil pessoas presas, 37.380 eram mulheres à época do levantamento, porém o aumento de mulheres nas prisões era superior aos dos homens a cada ano. Em entrevista ao portal Uol, a desembargadora da 34ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, Kenarik Boujikian afirmou que a mulher encarcerada é penalizada duplamente: Por estar presa e por ser mulher.

Mulheres presas - Wilson Dias/Agência Brasil

Envolvida com o tema desde os anos 80 quando foi estagiária na antiga casa de detenção do Carandirú, a desembargadora faz parte de uma rede de advogadas e magistradas que jogaram luz sobre a condição das mulheres encarceradas, inicialmente em São Paulo e depois com repercussão no país.

O Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) de 2015 mostrou que o aumento médio de mulheres encarceradas de 2000 a 2014 era mais que o dobro do constatado entre os homens: 567,4%, contra 220,20% dos presos homens. Essa estatística colocou o Brasil no quinto lugar entre os países com mais mulheres encarceradas, atrás apenas dos Estados Unidos (205.400), China (103.766), Rússia (53.304) e Tailândia (44.751). 

Kenarik explica que a cadeia além de tirar da mulher a identidade de gênero impõe um ambiente de cobrança pela condição de mulher da presa. “A pressão é outra: não se espera de uma mulher que ela cometa crimes, que dê mau exemplo aos filhos… a cobrança é muito maior", afirma a desembargadora.

De acordo com o Infopen, o perfil das presidiárias é composto por mulheres jovens, baixa escolaridade, em ocupações informais, com filhos e que sustentam a família. Os dados apontam que quase 70% das presas cumprem pena de tráfico, "não relacionado às maiores redes de organizações criminosas". Após o abandono do cônjuge, as presas só contam com a ajuda da mãe ou irmã.
Relatório da Pastoral Carcerária em visita a presídios da capital paulista registra a dificuldade das presas em acompanhar o estágio da pena e também contém reclamações sobre superlotação das cadeias, falta de médicos e remédios e condições de cuidados pessoais, como acesso a um banho quente, por exemplo.

"Ninguém pede por um banho de uma hora cada uma, caviar ou cama king size. Mas o direito dessas mulheres não está diminuído porque estão presas –privar a pessoa de um banho morno ou oferecer a ela comida azeda, como já vimos, é punir duas vezes a mesma pessoa. Quando falta o direito básico é ruim para todo mundo, porque isso é dever do Estado, que é quem tutela esse preso", argumentou a advogada Mariana Antonio Santos, que é agente da Pastoral Carcerária. "Ninguém tem que passar dificuldades maiores que as do cárcere", completou.

Mariana afirmou que a ressocialização se torna “uma completa utopia” diante da condição de tortura psicológica vivida pelas presas. Tristeza é o sentimento de Kenarik que não vê melhora na condição do sistema presidiário brasileiro se comparado aos anos 80. "Os três poderes precisam enfrentar a questão de que não basta construir presídio, simplesmente", defendeu. Para ela, ações que revisem as penas de acordo com a lei são alternativas ao boom de encarceramentos, que explodiram em 1990 com a lei de crimes hediondos.