Reitoria da USP usa repressão para tentar aprovar corte de gastos

A exemplo do que fez Michel Temer para aprovar a PEC 55, que determina o congelamento de gastos sociais do governo federal por vinte anos, a Reitoria da Universidade de São Paulo (USP) também recorreu à violenta repressão contra uma manifestação que contestava o corte de gastos na instituição. Na tarde desta terça-feira (7), a Polícia Militar invadiu o campus universitário e agrediu servidores, professores e estudantes.

PM na USP - Foto: DCE-Livre da USP

O ato convocado pelo Sindicato dos Trabalhadores da Universidade de São Paulo (Sintusp), com apoio dos professores e estudantes, foi duramente reprimido pela Tropa de Choque da Polícia Militar na tarde desta terça-feira (7). A manifestação se realizava em frente à Reitoria onde Conselho Universitário deveria se reunir para analisar a proposta congelamento de gastos feita pelo reitor Marco Antonio Zago. A Tropa de Choque, acionada pela Reitoria, atacou os manifestantes com bombas de gás e cassetetes e feriu algumas pessoas, tendo uma delas que sido hospitalizada com ferimentos na cabeça. 

Presente à manifestação, a estudante de Direito da USP, Bianca Borges informou ao Portal Vermelho que a tropa de choque agiu com uma truculência completamente desproporcional contra cerca de 1200 alunos e funcionários que protestavam de maneira pacífica contra o contingenciamento de recursos que ameaça o caráter público da Universidade de São Paulo. Bianca afirmou que os manifestantes aguardaram por várias horas pela não realização da reunião do Conselho Universitário quando a tropa de choque chegou lançando bombas de gás. “As cenas do dia de hoje foram horríveis. Ficou bem clara a tentativa de silenciar as reivindicações da comunidade universitária contra o sucateamento da educação no estado de São Paulo representado por esse pacote de medidas do reitor Zago”, declarou a estudante.

Corte de gastos e falta de diálogo

A proposta de redução de gastos assemelha-se ao Teto de Gastos do Governo Temer, aprovado através de PEC 55, e tem como centro limitar a folha de pagamento a 80% da receita e, caso esse percentual não seja atingido, autoriza a reitoria a não conceder reajuste salarial e realizar demissões que podem deixar cerca de cinco mil servidores desempregados. Segundo a Reitoria, a folha representa 96% da receita e a administração pretende fazer cortes anuais de 5% até 2022. Medidas como o fechamento da creche universitária e a terceirização serviços essenciais à universidade já estão sendo implementadas. A fim de justificar estas medidas o reitor Zago teria se referido às creches e aos funcionários que intermediam as relações entre os alunos e a instituição como "gastos parasitários".

Em carta enviada aos membros do Conselho Universitário, a Associação dos Docentes da USP (Adusp), o Sindicato dos Trabalhadores (Sintusp) e o DCE-Livre contestam as medidas propostas pela Reitoria e reclamam da falta de maior discussão entre a Comunidade Universitária. Para as entidades “inacreditavelmente, proposta de tamanha envergadura, como já se tornou praxe, chegou aos conselheiros sem tempo hábil para a devida discussão nas unidades de ensino e pesquisa, e segue para votação sem anuência da maioria absoluta das congregações”. O documento afirma, ao final, que “se aprovado, ele ( corte de gastos) poderá ser utilizado como elemento legitimador e acelerador de todo o desmonte em andamento na USP”.

Leia abaixo a íntegra do documento:

Carta aberta aos membros do Co

Prezada(o) Conselheira(o),

Como é de seu conhecimento, na próxima reunião do Conselho Universitário (Co) da USP, esse colegiado apreciará uma importante (e grave) proposta da Reitoria, que visa a criar "parâmetros de sustentabilidade econômico-financeira da USP", lançando mão de um teto para gastos com pessoal, congelamento de salários e contratações, além da possibilidade de demissões e exonerações de docentes e funcionários técnico-administrativos.

Inacreditavelmente, proposta de tamanha envergadura, como já se tornou praxe, chegou aos conselheiros sem tempo hábil para a devida discussão nas unidades de ensino e pesquisa, e segue para votação sem anuência da maioria absoluta das congregações.

A propalada "crise financeira" da USP justificaria tamanha falta de democracia? Seria responsável ou razoável aprovar uma proposta, com consequências tão graves, sem o devido respaldo daqueles que, cotidianamente, constroem essa Universidade? Sem que sequer os colegiados tenham se debruçado sobre o documento?

Vale lembrar que, em campanha para a Reitoria da USP, a chapa M. A. Zago-V. Agopyan afirmava que o problema da Universidade não era financeiro, mas político. Assim, em sua gestão, as soluções seriam construídas com base no diálogo e na negociação com todos os setores da Universidade. No entanto, verificamos que nada disso se cumpriu. Desde os primeiros meses de sua gestão, as declarações desrespeitosas de M. A. Zago para a imprensa desvelaram seu verdadeiro projeto para a USP, que poderia ser resumido da seguinte maneira:

– adequar os gastos da Universidade aos recursos definidos pelo governo do Estado de São Paulo, desconsiderando o crescimento real da USP nos últimos anos;

– negligenciar a necessidade de mais recursos para a Universidade, mesmo diante do fato incontestável de que o governo do Estado realiza manobras que reduzem o percentual determinado pela legislação;

– atacar, sistematicamente, as entidades representativas das três categorias que compõem a comunidade acadêmica.

Com essas diretrizes em mente, a gestão M. A. Zago-V. Agopyan sucateou os hospitais universitários, a Escola de Aplicação e as creches, implantou planos de demissão voluntária para funcionários técnico-administrativos, suspendeu a recomposição do corpo docente, aprovou a nova Câmara Permanente de Avaliação (CPA) e o Estatuto do Docente e agora desfere um novo golpe deletério: os parâmetros de sustentabilidade econômico-financeira da USP, em pauta, já na primeira reunião do ano do Co (7/3)

As primeiras análises críticas desse documento, realizadas pela Adusp, Sintusp e DCE receberam pronta resposta da Reitoria, na qual fica explicitado que aqueles que analisam a conjuntura interna da Universidade de modo diverso, propondo ampla discussão de temas dessa magnitude com a comunidade são aqueles que, segundo a Reitoria, espalham boatos infundados.

A exemplo do que ocorreu ao longo dos debates sobre a Nova CPA/Estatuto do Docente, os representantes da Reitoria insistiam em alegações que estavam em franca contradição com o texto proposto. Situação que se repete neste momento:

A réplica da Reitoria sobre os "parâmetros de sustentabilidade econômico-financeira da USP", em formato de perguntas e respostas, indica a extensão dos questionamentos que a proposta suscitou. E, novamente, sem submeter o documento à análise e discussão da comunidade acadêmica, a administração central da USP divulga um conjunto de esclarecimentos que não guarda relação nem com o que está escrito na proposta, nem com a legislação que a sustenta. Atitude indigna para um grupo que dirige uma das maiores universidades da América Latina.

Sobre as perguntas e respostas propriamente ditas, podemos destacar:

1. a proposta atende, de fato, a uma exigência estatutária que prevê que esses parâmetros sejam formulados. No entanto, o estatuto não determina o "conteúdo" de tais parâmetros que, assim, poderiam ter sido resultado de ampla discussão com a comunidade acadêmica, que definiria as prioridades orçamentárias da USP e os modos para equacionar sua crise de orçamento;

2. as medidas teriam como meta o reequilíbrio financeiro, o que é razoável. Contudo, tais medidas, sustentadas pelo congelamento de salários e pela exoneração de docentes e funcionários técnico-administrativos, não podem ser aprovadas sem uma análise rigorosa de seu impacto sobre o funcionamento da Universidade. Sem qualquer estudo nesse sentido, a proposta da Reitoria ignora a necessidade de reposição dos quadros de docentes e de funcionários técnico-administrativos, a despeito da sobrecarga de trabalho em função da expansão da USP, ocorrida na última década. Assim, a proposta da Reitoria aponta para a expansão do quadro docente por meio da contratação de pessoal em caráter temporário, precarizando o ensino, sobretudo da graduação;

3. a demissão dos servidores estáveis ficaria descartada, segundo a Reitoria, pela simples razão de que o § 4º do artigo 169 da Constituição Federal, que a isso faz referência, não será mais mencionado na proposta. A administração central quer nos induzir a um grave erro, visto que o fato de não mencionar esse dispositivo não faz com que seu teor deixe de existir, nem tampouco que não possa ser aplicado pela Reitoria (na gestão atual ou vindouras). Se não haverá demissão de servidores estáveis para ajustes no comprometimento com a folha de pagamento, então que isso seja redigido explicitamente na proposta. Não podemos aceitar as enormes incoerências entre suas propostas e as explicações da Reitoria em "documentos" (e-mail, apresentações etc.), sem qualquer validade legal.

4. além disso, ao contrário do que se afirma no e-mail enviado pela Reitoria, a progressão horizontal não está garantida no regimento da CPA. Ali apenas se menciona que a promoção horizontal poderá ocorrer ao final de cada ciclo avaliativo. Concursos para provimento de cargo de professor titular, por exemplo, padecem de um controle forte pela Reitoria e, por isso, poderão sim ser afetados nas políticas de distribuição de cargos, como tem sido sido praxe.

É preciso registrar em alto e bom som: a gestão M. A. Zago-V. Agopyan não promove discussões sobre seus projetos e propostas. Ela os impõe e o tem feito com a conivência de parte do Co. Temos hoje à frente da Reitoria da USP, gestores de uma universidade pública, mas apenas e tão somente administradores que têm por objetivo ajustar as contas segundo as diretrizes do governo Alckmin, custe o quê e a quem custar.

Desta vez, o projeto proposto por M. A. Zago-V. Agopyan é devastador. Se aprovado, ele poderá ser utilizado como elemento legitimador e acelerador de todo o desmonte em andamento na USP.

Não se enganem. A história será registrada e contada. Você, conselheira(o), não prefere fazer parte daquelas(es) que poderão dizer que não compactuaram com tudo isso?

CONSELHEIRA/O, VOTE NÃO!

São Paulo, 6 de março de 2017

Adusp/Sintusp/DCE-Livre da USP

Veja abaixo imagens da repressão no Campus Univesitário: