Privatizar Eletrobras sacrifica mais pobres e destrói função social

“Se privatizar encarece a energia”, assegurou Fabíola Latino Antezana, diretora do Sindicato dos Urbanitários no Distrito Federal (STIU-DF). Em entrevista por telefone ao Portal Vermelho, a dirigente rebateu o discurso do governo de que a privatização da Eletrobras vai diminuir a tarifa de energia. Segundo ela, o prejuízo vai recair sobre a população mais carente. Fabíola ressaltou que o novo modelo ataca o papel de fomentador social da empresa e que apagões podem voltar.

Por Railídia Carvalho

Eletrobras

“A redução da tarifa e a dinamização do setor elétrico é um argumento falso usado pelo governo para privatizar. Temos dados que mostram que diversas distribuidoras privatizadas no Brasil e em Portugal resultaram em aumento de tarifa”, reiterou Fabíola.

Ela citou declaração divulgada nesta quinta-feira pelo presidente da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Romeu Rufino confirmando que a tarifa deve aumentar.

Estudos feitos pela Agência apontaram que a livre negociação do valor da energia provocará um “efeito perverso” na tarifa. O aumento na tarifa pode atingir o percentual de 16,7% com as mudanças de Temer. A descotização (que vai permitir a energia a preços de mercado) pretendida pelo governo é a razão para o aumento da tarifa, diz a agência em reportagem de O Globo.

“A Aneel fez simulações. Quem mais entende de tarifa é a Aneel. A Aneel é que tem responsabilidade legal de definir tarifa. Não é um palpite. Isso (o aumento) com certeza acontecerá”, afirmou Romeu Rufino.

Prejuízos

O setor elétrico é a bola da vez do governo Temer para fazer caixa. A equipe econômica calcula arrecadar R$ 20 bilhões com a venda da Eletrobras para a iniciativa privada. Para Fabíola o prejuízo social da privatização é incalculável.

A tarifa social para a energia elétrica, por exemplo, pode estar com os dias contados. “A tarifa social beneficia populações de baixa renda, que serão penalizadas duplamente: perdem o benefício e terão que arcar com o aumento que virá com a privatização”, explicou Fabíola.

De acordo com ela, os apagões comuns nos anos 90 também podem voltar. “A partir do momento e que o setor de energia estiver na mão do privado, sem planejamento é real o risco de apagão”, apontou.

Na contramão do mundo

“O Brasil gosta de copiar o pessoal de fora mas nos EUA todas as usinas hidrelétricas estão na mão do Estado”, comparou Fabíola. Ela complementou que naquele país a segurança das hidrelétricas é feita pelo exército nacional.

“Na França, Holanda e Alemanha estão estatizando e o discurso é soberania energética. Aqui você vai delegar para terceiros”. Segundo Nota técnica do Dieese deste ano, 80% dos consumidores de energia elétrica na Alemanha são atendidos por prestadores públicos regionais ou municipais. Nos EUA, 48 milhões de consumidores são atendidos por empresas públicas de energia.

Fim do papel social

Fabíola também contesta a sustentação do governo de Michel Temer de que o rombo na Eletrobras é causado pelas distribuidoras e ressalta o papel social cumprido por essas empresas em regiões que tem baixo Índice de Desenvolvimento Humano como nos estados de Alagoas, Piauí, Acre e Rondônia, por exemplo.

Decreto de novembro do ano passado coloca como prioridade a venda das distribuidoras da Eletrobras Amazonas Energia (AM), Boa Vista Energia (RR), Eletroacre (AC), Ceal (AL) e Cepisa (PI) que devem ser vendidas em leilões no segundo semestre de 2017, e a Ceron (RO), no primeiro semestre de 2018.

A dirigente citou o caso da Eletronorte na cidade de Tucuruí no Estado do Pará e as ações de reinserção regional naquele Estado para demonstrar a importância estratégica das estatais.

“A empresa (Eletronorte) fez um aporte de algo em torno de R$ 250 milhões nos últimos 14 anos financiando programas de educação, saúde, segurança, compensação ambiental, geração de emprego e renda”, lembrou.

O compromisso assinado com a comunidade daquele Estado prevê que em mais seis anos serão aplicados ainda 110 milhões totalizando R$ 360 milhões em programas de reinserção regional. “Na lógica do lucro, que empresa privada vai manter esse compromisso? E como vai ficar o que ainda está para ser feito?”, questionou Fabíola.

Segundo ela, a importância estratégica das distribuidoras também se faz sentir com a Eletronuclear no Rio de Janeiro. “A gente pensa que por estar no sudeste não tem projetos de inserção regional. Em Angra, a Eletronuclear tem recursos aportados em hospital, universidades, centros técnicos. Nenhuma empresa privada vai fazer isso”.

Ministério nas mãos do mercado

Fabíola denunciou que a velocidade com que o governo de Michel Temer avançou com a privatização – sem nem concluir o processo de descotização – é para atender ao mercado.

Segundo ela, as empresas das geradoras privadas é que estão à frente desse processo de mudanças no setor elétrico conduzido pelo governo. “O ministro (Fernando Coelho Filho) não é do setor e se rodeou de uma assessoria toda do mercado, entre eles o ex-presidente da Associação Brasileira dos Agentes Comercializadores de Energia Elétrica (Abraceel). Eles não geram um wat, só compram e vendem”.

Em defesa da Eletrobras e da soberania nacional

Quatro dias após o anúncio da privatização da Eletrobras, o movimento sindical respondeu à altura com uma agenda de atividades que inclui a audiência pública “Reforma do setor elétrico e as consequências para o Brasil”, na Câmara dos Deputados na quinta-feira (31), e o lançamento no dia 12 de setembro da rede suprapartidária de parlamentares em defesa da soberania nacional. Campanha Nacional sob o mote “Energia não é mercadoria” também está sendo concluída.

De acordo com Fabíola, a atuação da rede de parlamentares não ficará concentrada em Brasília mas vai se espalhar pelas assembleias legislativas dos Estados.

“O governo esperava apenas reação da oposição, dos trabalhadores e movimentos mas agora está vendo que a base aliada também é contrária a esse processo. Quando o presidente da Aneel diz em público que o discurso do Executivo não é a realidade está batendo de frente com o governo. É tão grande a vontade de entregar o país e fazer caixa que eles não estão conseguindo perceber os equívocos”, opinou a dirigente.