Quem são os eleitores da extrema direita alemã? 

Análise mostra qual o perfil de quem votou no Alternativa para a Alemanha, partido de extrema direita com convicções racistas e xenófobas que atingiu 12% de popularidade no domingo (24). Além disso, investiga os significados e o motivo do resultado, denunciando um esvaziamento de propostas por parte da política exercida pelos grandes partidos alemães 

líderes do Alternativa para a Alemanha

Derrotados pela sociedade moderna, céticos sobre o futuro, orientais frustrados, ocidentais receosos, xenófobos, em sua maioria do sexo masculino. Essa é a identidade do eleitor do Alternativa para a Alemanha (AfD), o partido populista de extrema-direita que chegou a 12% de popularidade nas eleições para o Bundestag. Um resultado histórico, que pela primeira vez após a Segunda Guerra Mundial levou ao poder um ideal que não nega o “nazional” socialismo e possui tom fortemente racista, fazendo-os conquistar 90 cadeiras no parlamento alemão.

A Alemanha se questiona sobre as causas de um sucesso que superou o de todos os grandes partidos. Segundo o Instituto Infratest, o AfD subtraiu mais de 1 milhão de votos da União Democrata Cristã (CDU), 500 mil do Partido Social Democrata (SPD) e mais de 500 mil do Die Linke, enquanto houve mais de 1 milhão de abstenções; isso dado o aumento de 5% no número de eleitores em relação a 2013.

Relacionar o crescimento da AfD a um simples voto de protesto seria limitar o debate. O processo que se insinuou sobre a Alemanha é muito mais amplo e destinado a mudar a política em Berlim, provocando um forte lapso em uma sociedade que pensava já ter acertado suas contas com a história.

Não é certo que esses 12% colocarão a democracia em risco, mas a pergunta é como eles foram possíveis. A AfD conseguiu o voto daqueles que estão desempregados, empregados com pequenos empregos (“mini-jobs”), ou mesmo aqueles que possuem uma forma de trabalho extremamente precária e de baixa remuneração. A pergunta, contudo, é como o partido de extrema direita conquistou também o voto daqueles que são de classe média alta, não vive no leste da Alemanha e possui instrução de ensino superior.

O perfil é bem delimitado: homem, entre 30 e 59 anos. O AfD conseguiu uma média de 11% dos votos no oeste da Alemanha, e 21% na parte oriental do país, zona da ex República Democrática Alemã, que sofreu mais com o processo da reunificação e sente que recebe menos atenção por parte do governo. Parte dessa população viu uma ameaça na crise dos refugiados de 2015, enquanto observaram uma campanha eleitoral baseada mais no consenso do que na mudança. Não por acaso a eleição do domingo (24) foi considerada por esses mesmos alemães como a mais desinteressante dos últimos anos.

O partido populista teve sucesso com a faixa populacional desiludida com as políticas de Angela Merkel e que não encontrou alternativa nos partidos tradicionais. A AfD foi o reflexo de um pedaço da Alemanha que se sente abandonada e não consegue acompanhar os desafios de um mundo em constante e rápida transformação; uma população que enxerga ameaças no Euro, na imigração e nas condições impostas pela digitalização.

O dado de 12% foi um alarme no país que é considerado o mais rico da Europa. Oferecendo soluções rasas para problemas complexos, o Alternativa para a Alemanha conseguiu captar o mal-estar dos eleitores que veem perigo na imigração e que sentem saudade de um país que não existe mais. Contudo, é errôneo pensar que o crescimento do partido se deu apenas pelo apoio na xenofobia. A AfD apresentou um programa político e econômico que defende grandes subsídios estatais e menos impostos; isto é, mirou aqueles que sentiam não ter mais sua voz ouvida e que na maioria das vezes levavam o discurso da mesa de bar para as urnas.

Um olhar mais atento mostra que a explosão do AfD denuncia o fracasso dos partidos “junta todos”, a CDU e o SPD, os dois gigantes da Alemanha e os verdadeiros derrotados da última eleição. Enquanto o primeiro levou a pior perda em termos numéricos, o segundo pagou caro pela ausência de um programa político alternativo e progressista, além de ter se juntado a coalização entre os grandes partidos. Existe a exigência de novidade por parte da população, expressa em um voto radical e ultraconservador. Está nas mãos das forças democráticas entender quais os programas que devem ser colocados em pauta para recuperar o seu eleitorado.

Angela Merkel fez um discurso preocupante em que pareceu querer limitar a imigração e reconquistar os eleitores da direita. O que causa receio é que o resultado possa atrapalhar o ritmo político alemão, não só pelo AfD, mas também pela passagem do SPD para a oposição.

A decisão do SPD assegurou sua posição como opositor do governo, impedindo que esse posto ficasse exclusivo para o AfD. Dessa forma, o governo está nas mãos de uma coalização entre a CDU, o Partido Democrático Liberal (FDP) e o Grüne.

Enquanto isso, essa influência política chega aos governos da Europa (incluindo o italiano) que buscam atingir um consenso entre os eleitores de direita, com políticas cada vez mais germânocentricas e que consideram Berlim como a capital europeia.