Publicado 17/04/2018 10:38
Estudantes da Universidade de Brasília (UnB), que desde a última quinta-feira (12) ocupam o prédio da reitoria, tiveram uma primeira reunião com representantes do Ministério da Educação (MEC) e da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Em pauta, o movimento e a divulgação dos dados de custeio da universidade. Participaram do encontro outras entidades estudantis, inclusive da mesma universidade. Ficou acertada a realização de uma mesa pública para debater o assunto entre todos os setores na próxima quinta-feira (19), na universidade, a partir das 14h.
Os alunos reclamam da falta de estrutura para aulas e de propostas de desestruturação de serviços terceirizados, redução de bolsas e aumento do custo do restaurante universitário.
Apesar das tentativas de se buscar uma conciliação, na reunião, que se encerrou na noite desta segunda-feira (16) – e foi mediada pelas deputadas Erika Kokay (PT-DF) e Margarida Salomão (PT-MG) –, o secretário-executivo adjunto do MEC, Felipe Sigollo, não garantiu a presença do ministério na mesa de debates.
Por conta disso, a comissão vai encaminhar convite oficial para o ministério, uma vez que o principal pedido dos estudantes é a transparência nos dados do orçamento da universidade.
O movimento de ocupação da reitoria da UnB foi iniciado por aproximadamente 500 estudantes, que eles se revezam na ocupação do principal prédio administrativo.
Os estudantes criticam, principalmente, sugestões de medidas pontuais apresentadas pela reitoria, como alternativa para superar o déficit orçamentário. Dentre estas, redução de contratos de empresas prestadoras de serviço, encerramento de contratos de estágio custeados pela administração central e mudanças na política de subsídios concedidos no restaurante.
A avaliação destes alunos é de que existem várias contradições entre os dados apresentados pela universidade e as informações do ministério. Eles se instalaram na reitoria depois de terem realizado uma manifestação em frente ao MEC, que chegou a ser marcada por confrontos com policiais militares.
De acordo com o chefe de gabinete da reitoria, Paulo César Marques, a distinção de valores decorre das diferenças observadas entre o orçamento geral do MEC e o que a universidade de fato opera, como o valor das aposentadorias dos servidores – que embora conste do orçamento da UnB não vai para a conta real da universidade.
Marques não citou valores do déficit, mas conforme cálculos estimados por alguns professores o montante é da ordem de R$ 92,3 milhões até o final do ano. “Temos todo interesse em prestar os esclarecimentos solicitados, mas isso não vai mudar a realidade. Vamos continuar com orçamento limitado e precisando reduzir custos”, afirmou ele.
No final de semana, os ocupantes divulgaram uma nota na qual, além de reiterarem o pedido para que o orçamento da universidade seja transparente, afirmaram que não aceitam a demissão de terceirizados nem o que classificam como “sucateamento” da universidade para uma “posterior privatização”.
Também criticaram a emenda constitucional que instituiu o teto de gastos públicos por 20 anos e destacam que “nem todas as arrecadações da UnB retornam para o órgão”.
Indígenas e quilombolas
Eles demonstraram preocupação especial com a liberação, por parte do MEC, de dos editais de ingresso de indígenas e quilombolas. “A manutenção das bolsas de permanência estudantil é imprescindível, porque afetam principalmente estudantes de baixa renda, negras e negros, indígenas e quilombolas”, diz a nota.
Neste domingo (15), a reitora da universidade, Márcia Abrahão Moura – que estava fora do Distrito Federal quando foi iniciada a ocupação –, foi até o local para conversar com o grupo. Márcia aceitou pedido feito pelos estudantes e assinou um documento em que se compromete em não penalizar administrativamente “nenhum estudante ou trabalhador” que esteja participando do movimento.
A reitora, entretanto, deixou claro que se forem observados danos ao patrimônio, terão de ser apurados.
Os alunos que ocupam a reitoria, antes do comprometimento da reitora, estavam evitando se identificar com nome e sobrenome e, em muitos casos, usaram camisetas para cobrir o rosto sempre que avistavam repórteres. Muitos deles contaram, em entrevista à RBA, que são, em sua maior parte, estudantes de primeiro a segundo ano universitário e fizeram parte do movimento de ocupação das escolas públicas contra a reforma do ensino médio, em 2016.
“Não queremos violência, como muitos colegas que estão contrários a nós estão pensando, mas não podemos ver o ensino público acabar dessa forma. Nos esforçamos para chegar até aqui e achamos justo lutar pela transparência das decisões e dos recursos destinados para a UnB. Queremos concluir nossos cursos”, ressaltou um deles, chamado de Gordo, pelos colegas.
O coordenador do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UnB, Helio Barreto, disse que discorda estrategicamente do movimento. Segundo Barreto, a decisão sobre apoio ou não ao grupo pelos demais alunos teria de ser analisada. Mas assembleia do DCE, realizada pouco tempo depois das suas declarações, decidiu pelo apoio aos estudantes da ocupação
Violência policial
Um dos pontos polêmicos tratado na reunião com os deputados e representantes do MEC foi a forma como os estudantes foram abordados pela polícia. Eles denunciaram à CDHM que policiais militares chegaram a entrar na ocupação, na madrugada do domingo, soltando rojões, como forma de intimidá-los.
A deputada Erika Kokay ficou de cobrar da Secretaria de Segurança Pública e Paz Social do Distrito Federal que se manifeste e tome providências necessárias sobre o caso. “Tratam-se de fatos graves que precisam ser apurados”, afirmou a parlamentar.
Em março, durante um encontro realizado por professores e estudantes para discutir a situação da UnB, partiu da decana de Planejamento e Orçamento, Denise Imbroisi, a informação de que a universidade registra um rombo de R$ 92,3 milhões em seu orçamento para este ano.
Segundo ela, em 2016, quando os acertos com as empresas já estavam fechados, o repasse do Tesouro para a UnB foi de R$ 217 milhões. Em 2018, este montante caiu para R$ 137 milhões, ou 45% a menos. Mas de acordo de Denise, apesar desse orçamento de R$ 137 milhões, além de R$ 40 milhões de arrecadação, o custo anual da UnB este ano será de R$ 214,5 milhões.
Na ocasião, a reitora Márcia Abrahão ressaltou que o MEC tem recebido os representantes da universidade para tratar da crise, mas “infelizmente, mesmo com todos os apelos, não obtivemos resposta positiva”. Segundo ela, há, inclusive, a perspectiva de publicação de um novo decreto de contingenciamento.
Os estudantes devem manter a ocupação até a realização do debate, na quinta-feira.