Juliana Diniz: Com quantas mentiras se faz um presidente?

"As eleições de 2018 são atípicas porque provam que o sistema, apesar de sua complexidade, não está imune a trapaças, sobretudo aquelas que acontecem nos subterrâneos da mídia, em terra onde a lei mal alcança, a internet”.

Por Juliana Diniz*

Bolsonaro

Uma democracia pressupõe um acordo básico sobre os meios de acessar o poder. Para realizar esse pacto existe o sistema eleitoral: um conjunto de normas e instituições voltadas a regular o modo como as eleições devem se dar. As suas regras definem desde os critérios para apresentação de uma candidatura até os limites daquela que é a força decisiva para qualquer sucesso nas urnas: a propaganda política.

O sistema é confiável se acreditamos que ele será capaz de identificar com segurança o lado para o qual pende a opinião pública, que numa eleição se mede pelo número de votos. Para votar bem, o eleitor deve ser informado.

Sabendo que a opinião púbica pode ser manipulada por forças pouco democráticas, regulamos os mínimos detalhes da propaganda, atribuindo competências de controle a uma Justiça Eleitoral. Assim asseguramos que as instituições estarão a salvo dos trapaceiros.

As eleições de 2018 são atípicas porque provam que o sistema, apesar de sua complexidade, não está imune a trapaças, sobretudo aquelas que acontecem nos subterrâneos da mídia, em terra onde a lei mal alcança, a internet. Nesta semana, pudemos entender como, contrariando as pesquisas de intenção de voto, candidatos aparentemente fora do jogo conseguiram não só se eleger, como alcançar expressiva adesão popular de última hora.

O nosso susto inicial atribuiu os resultados a uma virada conservadora que varreu o país de Norte a Sul: seria o sopro da mudança, como disseram alguns. A explicação é menos honrosa e está relacionada a um hábito que o brasileiro cultiva há anos: a interação virtual via redes sociais. Conforme noticiado pela Folha, candidatos ligados ao PSL promoveram um expressivo investimento não identificável pelos canais de controle para disparar, dias antes das eleições, um volume descomunal de mensagens anti-PT via whatsapp. A propaganda ilegal, preparada por "curadores de conteúdo", como definiu o proprietário de uma das empresas, espalhou pelo país uma avalanche de desinformações e boatos que o eleitor pouco cuidadoso não teve o cuidado de verificar. De kit-gay à defesa do incesto, há aberração para todo gosto. A Justiça Eleitoral, como reconheceu o ministro Fux, falhou em combater os canais de propaganda falsa e a manipulação da opinião pública.

Por isso, leitor, fique atento às notificações que recebe: os trapaceiros têm aparência de gente honesta. A depender da informação que conquistará o seu voto, você está sendo enganado.


*Juliana Diniz é Doutora em Direito e professora da UFC.

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