Samuel Oliveira: A Teologia da Prosperidade e a crise financeira

Quando uma crise econômica afeta nosso país e gera consequentemente pobreza e falta massiva de emprego, é comum ver as pessoas procurando diversas maneiras de garantir seu sustento, inovando-se no mercado de trabalho com novas maneiras de refazerem sua renda na tentativa de sobreviver. Na situação atual de uma crise que afeta sobretudo a população mais pobre do país, não se deixa escapar outras medidas de se recompor financeiramente, como por exemplo, a “recorrência ao divino”.

samuel oliveira

É natural que dessa população que sofre com as dificuldades intensificadas pela crise atual situação do país, os crentes recorram em suas orações por dias melhores. No meio evangélico, ao qual pertenço e posso falar com mais propriedade sobre meus irmãos na fé, esse processo é contínuo e sobretudo no modelo religioso que vivemos hoje. Na tentativa de recorrer a um milagre da parte de Deus para resolver problemas dos quais muitas das vezes o Estado não foi capaz, ou que ele mesmo causou, os evangélicos se deparam, em cultos e celebrações, com os alarmistas disseminadores da Teologia da Prosperidade. Estes, iludem os fiéis e os conduz a uma lógica de vida contrária aos principios verdadeiros que embasam – ou que deveriam embasar num todo – a fé cristã-evangélica.

Nascida, nada mais nada menos que nos Estados Unidos ao fim do século XIX durante os movimentos de avivamento cura “healing revivals”, a Teologia da Prosperidade, hoje adotada por diversos pastores e lideranças evangélicas brasileiras (sobretudo das grandes denominações neopentecostais como Assembléia de Deus, Igreja Universal do Reino de Deus, entre outras), é um movimento evangélico que prega as “bençãos materiais” como um desejo de Deus para seus fieis e quanto mais contribuem com essas instituições, como supostas causas do Reino de Deus, mais eles irão obter retornos e prosperar financeiramente.

Numa leitura simples não parece novidade essa lógica. Com pouca reflexão, podemos perceber uma grande semelhança com a ilusão meritocrática que o capitalismo causa nas pessoas, com promessas de que trabalhando mais e mais um dia essas pessoas vão ascender e acumular uma determinada riqueza. O que esse movimento evangélico de prosperidade e também o capitalismo não contam às pessoas, é que riqueza acumulada num indivíduo gera falta de riqueza para outro e que, para a frustração de quem também quer ser um desses que acumulam, essas vagas já foram preenchidas por uma elite anteriormente estabelecida na sociedade, e que sustenta toda essa lógica para extrair do trabalho e contribuição dessa parcela pobre, ansiosa pela ascenção econômica, para se manterem em seu status detendo para si os meios que poderiam fazer essas outras pessoas também produzirem e partilharem dos frutos dessa produção.

O problema desse evangélio de prosperidade, é ele ser ilusor e enganador (vale lembrar aos meus irmãos na fé que mentira é pecado, e aos que não partilham dessa fé que mentir é feio). Essa teologia da prosperidade, procura se respaldar em textos e experiências históricas relatadas na Bíblia, mas nitidamente vai na contra-mão teológica do que de fato a essência dos ensinamentos de Cristo procuram nos discipular. Jesus fazia uma crítica imensa ao acumulo de riquezas, o que era, inclusive, comum de se ver em diversos personagens ao longo das historias do antigo testamento mas que também serviam como pedra de tropeço, coisa que o próprio apostolo Paulo reforçou posteriormente quando disse em sua primeira carta a Timóteo (6:10): “amor ao dinheiro é a raiz de todos os males”, crítica à essa lógica social de acumulo do financeiro causador de probreza e opressão.

Ao criticar o acúmulo de riquezas, Jesus sempre apontava como algo ruim e orientava aos ricos que o procuravam, para que eles se desfizessem de sua riqueza e pregava uma justa distribuição de renda, deixando essa lógica – hoje traduzida no capitalismo – de acumulo de capital, passando para uma distribuição que garantisse condições de igualdade com os outros. Com isso, fica contraditória essa ideia de prosperidade e ascendência financeira, mas obvio que de uma perspectiva individual – Jesus não era contra o bem estar das pessoas. Faz-se então, necessário que o crescimento econômico seja social e conjunto a ideia de sociedade igualitaria nas suas condições, contráriando essa lógica capitalista que hoje se apodera do movimento evangélico e absurdamente formula essa concepção evangelica de prosperidade puramente para manter o enriquecimento dessa classe dominante.

É normal o desespero que os crentes tem, e toda a parcela pobre da população, em meio não só as crises economicas que o país passa, mas em toda a vida dificultosa que vivemos. A solução não está em ações individuais, como tem sido enganosamente ensinado por parte dos líderes evangélicos atualmente. Isso se transforma a partir de uma construção coletiva e estrutural na sociedade, com medidas políticas que garantam uma boa distribuição de renda e das riquezes de nossa nação, o que já defendia os proprios ensinamentos cristãos primitivos. Não nos deixemos enganar pelos que usurpam de nossa fé ou de nossa consciência de classe e estejamos dispostos na construção de uma sociedade justa e igualitária.