Artistas questionam sumiço da secretária da Cultura durante pandemia

Atores, diretores e produtores culturais deflagraram uma campanha virtual questionando a ausência absoluta da secretária nacional de Cultura, Regina Duarte, durante a pandemia do coronavírus.

Em quarentena absoluta, Regina Duarte não participou de nenhuma das entrevistas coletivas da covid-19 no Palácio do Planalto

Ao contrário do ministro da Saúde que foi demitido por aparecer demais, Regina Duarte (73 anos) seguiu à risca a recomendação da OMS e encontra-se trancada dentro de casa sem home office, videoconferências ou um postizinho no Twitter. Em vários vídeos publicados nas redes sociais, todos fazem a mesma pergunta: “Cadê você, Regina?”. O objetivo é provocá-la a se manifestar sobre medidas públicas para ajudar artistas que estão sem trabalho e renda devido à quarentena imposta pelo coronavírus.

O questionamento se junta a outro: quando o Fundo Nacional de Cultura será liberado? Para os artistas, a ministra do governo de Jair Bolsonaro não tem tomado nenhuma providência para ajudar a classe artística, uma vez que produções audiovisuais estão suspensas e teatros fechados.

Marcos Caruso, famoso por ter interpretado o Leleco, de “Avenida Brasil”, vai além e critica a atriz por não ter emitido nota de pesar pelas mortes de Moraes Moreira, Luiz Alfredo Garcia-Roza e Rubem Fonseca nesta semana. “Seria o mínimo. Cultura também é cultivar bons hábitos”, afirma o ator.

Promovida pelo grupo ATAC (Articulação de Trabalhadores das Artes da Cena Democrática e Liberdade), a gravação lembra que no mundo todo a cultura é responsável por 6% da economia e gera cerca de 30 milhões de empregos por ano.

“Em função do isolamento, os artistas encontram dificuldades para sustentar suas famílias e precisam urgentemente de apoio do governo. Verba para isso existe. Queremos saber da secretária especial da Cultura, Regina Duarte, o que ela está esperando para agir”, cobram os seus colegas.

O movimento de atores pedindo providências à secretária de cultura e intérprete da Viúva Porcina inclui nomes como Marcelo Várzea, Lavínia Pannunzio, Iara Jamra, Paula Cohen, Rubens Caribé, Renata Carvalho e Fernando Eiras. Mas os vídeos não param de brotar nas redes sociais. Veja abaixo alguns dos vídeos.

Vazio institucional

Depois de muito namoro, a atriz global aceitou o convite de Bolsonaro, com quem se identifica politicamente pelo estilo militar, e substituiu o desastroso Roberto Alvim, após discurso de teor nazifascista. Com ares de diva de Hollywood, surpreendeu com um discurso sobre o pum de talco do palhaço.

Logo em seguida, soube-se que a “namoradinha do Brasil” exigiu carta-branca para trabalhar, e levou um esculacho de Bolsonaro que mostrou quem define cargos na pasta da cultura e seu ornamental e utilitário no governo. Até o momento, a pasta que foi tão ignorada pela classe artística continua sem apresentar qualquer projeto consistente para a área da Cultura.

Uma live reunindo Regina Duarte e o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, foi anunciada nas redes sociais da atriz e nas da pasta, com início previsto para as 17h30 de uma quarta-feira. Na descrição do post no perfil da atriz, a informação era que o tema seria o auxílio emergencial disponibilizado pelo governo aos trabalhadores informais. Esperava-se que os dois também falassem sobre medidas aguardadas para o setor, que ainda não saíram do papel desde a semana seguinte das restrições a aglomerações e eventos públicos.

No dia 18, a secretária informou que estava se preparando para pedir recursos ao ministro da Economia, mas a iniciativa dependeria de uma Instrução Normativa para regulamentar o funcionamento da Cultura, que desde novembro tem processos divididos entre as pastas da Cidadania e do Turismo.

Com atraso, a live, que teve pico de quase 4 mil acessos simultâneos, apresentou problemas de conexão, Regina se desconectou, e acabou sem apresentar nenhuma medida concreta voltada para a classe artística. A secretária citou a “máquina burocrática” com a qual se deparou, falou tudo que já se sabe sobre o benefício de R$ 600 para trabalhadores informais. Como Regina não voltava à conexão, o ministro tentou contornar dizendo que ela iria “descentralizar as verbas da Cultura” e permitir que “pequenos artistas pudessem ter acesso a leis como a Rouanet” cujos recursos, segundo ele, antes estariam “concentrados nas mãos de uma pequena elite”.

Num curto retorno, Regina citou “o fogo na Amazônia” e o “óleo nas praias” como exemplos de dificuldades enfrentadas recentemente pelo governo, como se nenhuma responsabilidade coubesse à União nos dois casos, antes de classificar a pandemia de “uma nova provação”. Ela fez a única citação direta à área da Cultura ao lembrar dos artistas de circo, mas apenas para pedir ajuda humanitária às comunidades, municípios e estados, solicitando a entrega de cestas básicas aos grupos que enfrentam dificuldades financeiras.

Fagundes pra ministro

Enquanto Regina Duarte se esconde atrás de máscaras de proteção, um outro artista, frequente par romântico de Regina na Globo, Antonio Fagundes, rasgou o verbo numa entrevista à Veja neste fim de semana, em que ele critica o “Estado mínimo” defendido pelo governo.

“O Estado tem, sim, funções e obrigação em participar de políticas econômicas, como projetos para a criação de emprego e uma melhor distribuição de renda. A principal dessas atribuições é a saúde, que não pode ser privatizada. Se o mundo não der atenção à ciência e à saúde nos próximos anos, a próxima pandemia vai ser muito mais letal”.

Fagundes também criticou o pouco caso de Bolsonaro com os idosos, lembrando o que aconteceu na Alemanha durante o nazismo. “É horrível quem não valoriza idosos. Todo esse cenário me faz lembrar da frase de Edmund Burke: ‘Quem não conhece sua história, está condenado a repeti-la’. Esse mesmo tipo de preconceito já foi visto na história, com a eugenia. Na Alemanha, o nazismo eliminava idosos, uma história que não pode se repetir. Eliminava-se também os que pensavam diferente, os deficientes. O mundo está passando por isso de novo. Milhões de pessoas morreram pela irracionalidade. E parece que não aprendemos nada com isso”.

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