Com Doria, número de mortos pela PM bate recorde em SP

Secretaria da Segurança Pública demitiu ou expulsou, neste ano, 80 policiais civis e militares por desvios de conduta

De janeiro a maio deste ano, o genocídio praticado por policiais militares dentro e fora de serviço em São Paulo foi o maior de toda a série histórica iniciada em 2001. A informação é da diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno. Segundo ela, mesmo com a quarentena imposta pela pandemia de Covid-19, houve 442 pessoas mortas por PMs em 2020 no estado – que é governado por João Doria (PSDB).

O total para esses cinco meses do ano ultrapassou o recorde anterior – de 409 mortes em decorrência de intervenção policial registradas em 2003. Nas cidades da Grande São Paulo (excluindo-se a capital paulista), o número de mortos por policiais de batalhões aumentou 70% de janeiro a maio de 2020 em comparação com o mesmo período de 2019. Os dados são da Corregedoria da Polícia Militar.

Já nos batalhões da cidade de São Paulo – cidade também administrada por um político do PSDB, Bruno Covas –, o aumento foi de 34%. O índice é superior ao aumento de 25% na letalidade policial do estado como um todo: de 350 mortos em 2019, para 442 neste ano.

A Secretaria da Segurança Pública demitiu ou expulsou, de janeiro a maio deste ano, 80 policiais civis e militares por desvios de conduta, além de ter iniciado um curso em 1º de julho para todos os níveis hierárquicos da PM. O objetivo: “aprimorar os processos da corporação”.

Nos últimos finais de semana, diversos casos de violência policial foram registrados em vídeos gravados por testemunhas. A edição de domingo (12) do Fantástico mostrou cenas da violência policial contra uma mulher em Parelheiros, no extremo da Zona Sul de São Paulo.

De janeiro a maio deste ano, 119 pessoas foram mortas por policiais subordinados ao Comando de Policiamento da Capital (CPC), contra 89, em 2019. Já nos batalhões do Comando de Policiamento Metropolitano (CPM), os policiais mataram 54 pessoas nos cinco primeiros meses de 2019 e 92, em 2020. O CPC tem 31 batalhões e o CPM, 21.

Para efeito de comparação, o número de mortos pelo Comando Policiamento de Choque (CPChoque), historicamente com altos índices de letalidade por ter a Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) como um de seus batalhões, foi o mesmo nos quatro primeiros meses dos dois anos: 57. Na comparação de 2019 para 2020 – levando-se em conta os primeiros meses do ano –, o número de policiais mortos saltou de oito para 19.

Crimes

Apesar da letalidade policial ter sido recorde, outros crimes violentos caíram durante a quarentena. Em maio, por exemplo, os estupros caíram 46%: de 285, em 2019, para 155 neste ano. Já os furtos em geral regrediram 49% (de 46.625 em maio de 2019 para 23.778 em maio de 2020). Os roubos caíram 28,5%, enquanto os roubos de veículos tiveram queda de 51%.

Para Samira Bueno, o aumento da letalidade policial frente à queda de outros crimes violentos durante a quarentena reforça a tese de que não se trata de “casos isolados” – mas, sim, de “descontrole da PM” paulista. “Quando episódios de abordagens violentas e intervenções com resultado morte acontecem em tantos lugares ao mesmo tempo, é de se desconfiar que haja conivência com estas ações por parte do comando”, diz ela.

Na avaliação do gerente de Sistemas de Justiça e Segurança Pública do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani, a criação de Batalhões de Ações Especiais de Polícia (Baeps), subordinados ao Comando de Policiamento de cada área, é um dos pontos que podem explicar o aumento da letalidade policial. Isso ocorre porque, “enquanto o policiamento comum de área tem como proposta principal a prevenção criminal, a atuação do Baep e da Força Tática se dá em crimes já em andamento”.

“Para nós, estava muito claro que isso implicaria em aumento da letalidade”, diz Langeani. “Tradicionalmente, policiamentos como o realizado pelo Baep e as próprias Forças Táticas, em razão do tipo de treinamento e por serem equipes empregadas em ocorrências de maior gravidade, acabam se envolvendo em mais ocorrências com mortes de suspeitos.”

Os Baeps eram promessa de campanha do então candidato João Doria nas eleições 2018 e começaram a ser criados em 2019. Segundo o governo, “as unidades especializadas foram criadas para combater o crime de maneira mais ostensiva em todo o estado, já que as equipes atuam de forma semelhante aos padrões do policiamento de Choque”. Ao menos dez Baeps foram criados no estado. “Comigo bandido não vai ter vez. Nem bandidinho, nem bandido e nem bandidão. Todos terão tratamento muito duro”, disse Doria durante a campanha em 2018.

Para Langeani, o aumento expressivo da letalidade policial no estado de São Paulo neste ano preocupa, uma vez que isso está ocorrendo no mesmo momento em que praticamente todos os principais indicadores criminais estão em queda. “Ainda mais a partir do início da pandemia, os roubos tiveram uma queda significativa. A explicação da própria polícia – de que os policiais estão chegando mais rápido aos locais dos crimes – não parece crível.”

Segundo Langeani, a polícia precisa ser mais transparente quanto aos dados de letalidade policial, a fim de que o controle das polícias – feito pelo Ministério Público Estadual, pela Corregedoria e até mesmo por parte da sociedade civil – seja mais eficaz. “Historicamente, a letalidade é um problema que se concentra em alguns batalhões – e, dentro desses batalhões, em alguns policiais. Se a polícia não vê problema no que está ocorrendo, não tem por que não desagregar esses dados e ser mais transparente”, diz.

Com informações do G1

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