De Olho no Mundo, por Ana Prestes

A América Latina é destaque na análise internacional da cientista política Ana Prestes. A eleição presidencial na Bolívia, a reeleição de Cuba para o Conselho de Direitos Humanos da ONU e o debate sobre a situação dos direitos humanos na Venezuela estão entre os principais assuntos abordados. Outros temas são: a composição da nova diretoria do BID, a construção do corredor viário bioceânico que ligará o Pacífico ao Atlântico, o crescimento da economia chinesa e o novo Plano Quinquinal do país, além próxima cúpula do BRICS.

Luis Arce Catacora, ex-ministro da Economia e candidato do Movimento Ao Socialismo (MAS) à presidência da Bolívia l Foto:Ernesto Andrade-HP

Faltam apenas 4 dias para as eleições na Bolívia. O clima está bastante tenso por lá e é crescente o interesse internacional na observação das condições em que se darão as eleições um ano após o golpe contra o presidente Evo Morales, reeleito nas eleições de 2019. Nos últimos dias, a presidente Añez fez questão de mostrar o caráter de seu governo racista, elitista e subserviente aos EUA. Além de mandar seu ministro forte, Arturo Murillo, para uma série de conchavos na Casa Branca e com o presidente da OEA, Luis Almagro, fez uma aparição em espécie de parada militar para homenagear os militares que assassinaram Che Guevara em outubro de 1967, fez outro evento de homenagem aos fardados dando um claro comando de “votem contra o MAS” e “cuidem dos votos”. Deu a entender ainda que entregará o poder a quem vencer as eleições, desde que não seja do MAS. Ao mesmo tempo em que o TSE, tribunal que cuida das regras eleitorais, alterou os critérios de publicidade das atas eleitorais por postos de votação, que eram atualizadas e publicadas ao longo do dia nas últimas eleições, dificultando assim a observação e apuração de possíveis fraudes. Aumentaram também as denúncias forjadas de que o MAS-IPSP estaria insuflando a população à violência, fazendo com que as pessoas possam deixar de ir votar por medo do caos, para além do já existente medo do coronavírus. (Nesta sexta-feira (15), a eleição na Bolívia será um dos temas abordados na live com a professora e ex-senadora Constanza Moreira, a partir das 10h nas redes sociais do Portal Vermelho. N.E.)

Cuba está eleita uma vez mais para ser um dos 8 representantes dos Estados da América Latina e Caribe com assento por três anos no Conselho de Direitos Humanos da ONU. Foram 170 votos favoráveis, em uma votação secreta realizada entre os representantes dos países membros da ONU, que hoje são 193. O organismo é composto por 47 membros e ontem (13) foram renovados 15 assentos, tendo sido eleitos além de Cuba, Bolívia, China, Costa do Marfim, França, Gabão, Malawi, México, Nepal, Paquistão, Rússia, Senegal, Ucrânia, Reino Unido e Uzbequistão. Ontem, após saber o resultado, o secretário de estado dos EUA, Mike Pompeo, disse que Trump fez certíssimo ao retirar o país do Conselho em 2018. Uma das grandes insatisfações de Trump é que o conselho tem reiteradamente condenado Israel por ataques aos direitos humanos dos palestinos.

Após uma votação que gerou polêmica no campo progressista sobre a Venezuela no Conselho de Direitos Humanos da ONU, a Argentina, não assinou a declaração do Grupo de Lima reunido ontem (13). O governo argentino disse que não pode concordar com uma declaração que reconhece Juan Guaidó como presidente da Venezuela, alguém que “nunca teve o exercício efetivo do governo da República Bolivariana da Venezuela”. Disse ainda que a declaração representa uma “intervenção extra regional que surge de modo quase aberto” e pode gerar “consequências imprevisíveis para a América Latina e o Caribe”. O governo argentino ainda reforçou o trabalho que vem sendo feito pela Alta Comissária de Direitos Humanos da ONU, Michele Bachelet, em relação à Venezuela. O Grupo de Lima quer usar os relatórios independentes produzidos pelo CDH-ONU para incriminar a Venezuela no TPI (Tribunal Penal Internacional) e a Argentina quer puxar o CDH-ONU como o interlocutor legítimo para mediar a situação venezuelana. Assim ficou mais claro o voto da Argentina no CDH, na tentativa de isolar os EUA e seus fantoches do Grupo de Lima. Tarefa dura.

O novo presidente do BID, o cubano-americano Mauricio Claver-Carone, anunciou três nomes para serem os vice-presidentes da instituição, provenientes do Paraguai (irmão do presidente Benítez e atual ministro da fazenda), Equador e Honduras, países minoritários em investimentos no banco e também como players regionais. Agora falta a indicação da vice-presidência executiva, que tradicionalmente ficava com um norte-americano. A imprensa deu essa semana que um brasileiro chegou a ser convidado, Alexandre Tombini, ex-presidente do Banco Central no governo Dilma, mas que o governo Bolsonaro não teria aprovado a indicação. No período anterior, desde os anos 60, o presidente sempre era de um país latino-americano, a vice-presidência executiva ficava com um estadunidense e as três vice-presidências ficavam com os principais acionistas depois dos EUA, ou seja, Brasil, Argentina e México. Desde 2014, um brasileiro, Alexandre Rosa, ocupava uma das vice-presidências, mas já foi deslocado pela nova direção. (Com infos da reportagem de Janaína Figueiredo em O Globo).

O corredor viário bioceânico que ligará o Pacífico ao Atlântico atravessando a América do Sul parece mais próximo da realidade neste momento. O projeto de integração conectará Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul, aos portos do norte do Chile. A primeira via, que atravessa o chaco paraguaio já está sendo pavimentada. Uma ponte entre Porto Murtinho (Brasil) e Carmelo Peralta (Paraguai) também já tem financiamento da Itaipu Binacional e deve estar pronta até 2023. O projeto foi um dos poucos sobreviventes dos mais de 500 que estavam sob os auspícios do Cosiplan – Conselho sul-americano de infraestrutura e planejamento da Unasul, cuja última reunião de ministros foi em dezembro de 2017. Alguns fatores importantes para a sobrevivência do projeto, segundo Pedro Barros, do Ipea, em artigo na Folha de São Paulo, são a pujança econômica do centro-oeste brasileiro, com elevadas exportações para a China e importações (fertilizantes) do Canadá, por exemplo, mobilização de governos estaduais/regionais dos países envolvidos e as declarações presidenciais anteriores ao colapso da Unasul e que respaldaram a continuidade do projeto.

O governo russo anunciou que a reunião anual do BRICS será realizada de forma virtual no próximo dia 17 de novembro. É a primeira vez desde a criação do bloco que seus presidentes não se encontrarão presencialmente para a reunião anual. O tema do encontro é “BRICS – Parceria para Estabilidade Global, Segurança Compartilhada e Crescimento com Inovação”. Segundo o secretário executivo do comitê organizador da presidência russa do BRICS 2020, Anton Kobyakov, mesmo com a pandemia, foram realizadas mais de 60 reuniões do bloco sobre os mais variados temas ao longo do ano por videoconferências.

Reportagem do El País mostra que a curva do PIB chinês é a única com formato em V em todo o mundo. Vários indicadores apontam para uma atividade econômica nos mesmos patamares, quando não superior, do período anterior à pandemia. A grande variável, no entanto, parece ser o controle da pandemia. Em outubro, o país inteiro chegou a dois meses sem infecções locais. A previsão é de crescimento de 6% do PIB no quarto semestre, segundo o PBOC – Banco Popular da China.

E ainda por falar em China, o Comitê Central do Partido Comunista do país realizará sua sessão plenária anual na capital, Beijing, este mês, entre os dias 26 e 29 de outubro. A reunião tratará do 14º. Plano Quinquenal para o país (2021-2025), além de avaliar os resultados do 13º. Plano, fortemente impactado pela absolutamente imprevisível pandemia provocada por um novo coronavírus cujo surto inicial se deu na cidade chinesa de Wuhan. Os planos quinquenais construídos pelo PCCh ocorrem no país desde 1953 e são feitos para planejar as metas de desenvolvimento econômico e social do país. O atual plano está disponível desde o dia 15 de agosto, quando foi lançado pelo Presidente Xi Jinping para sugestões da população.

Segue repercutindo a apresentação, por parte da Coreia do Norte, em desfile militar no último final de semana, de um míssil balístico intercontinental de enormes proporções. Está na imprensa a opinião de especialistas do ocidente de que seria o “maior míssil móvel de combustão líquida já visto até hoje”.

O Brasil foi eleito para exercer a Presidência do Conselho do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR). Será a primeira vez, desde a fundação da Acnur em 1950, que o Brasil assumirá a presidência.

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